Recordei este lindíssimo poema de Augusto Gil quando pensei em escrever algumas palavras sobre um tema que me é muito querido: O COMPORTAMENTO ESCOLAR DAS CRIANÇAS FILHAS DE PAIS SEPARADOS.
Neste caso, a palavra escolar reporta-se ao ambiente da escola e não propriamente do aproveitamento escolar pois, irei falar de todas as idades incluindo das que ainda não frequentam a escola.
Falar de comportamento humano é sempre um perigo pois, como sabemos todos, varia de acordo com ambiente, com a maneira de ser de cada um, ….mas, vou só referir o comportamento das crianças dos quatro meses aos dez anos e cujos pais se separaram. Será que são felizes, mesmo assim? Será que refletem a separação? Ou pura e simplesmente a separação não afetou a sua vida?
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Pertenço a uma geração cujos princípios de vida se guiavam por conseguirmos ter uma Família para toda a vida. O conceito de Família era quase sagrado. Respeito pela Família, aprendia-se na escola (Salazar levou esse conceito ao limite quando " decretou" a trilogia " Deus, Pátria e Família" como guia da nossa vida coletiva). E essa maneira de pensar levava a que se " aguentasse " tudo em nome da Família. O contrato do casamento era fortalecido e sacralizado pelo complementar casamento religioso. Hoje, em contrapartida, esse contrato é posto em causa. As pessoas "juntam-se" e não querem contratos assinados (o que é um paradoxo pois, relativamente ao trabalho, todos desejam ardentemente um contrato efetivo…trabalho mais importante que a Família? Assim parece...) mas o verdadeiro pensamento era "estamos juntos pelos filhos ...". Hoje em dia isso é considerado pré histórico, apesar de a legislação contemplar que "tudo a bem da criança". E será que é isso que está a acontecer?
Há algum tempo aconteceu o seguinte diálogo à porta do Bambi, entre uma senhora que ia fazer trinta anos e o pai:
“Filha, o que queres que te ofereça nos teus anos?”
“Olha papá, o que eu queria tu não me podes dar.”
“Claro, se for uma casa ou carro…”
“Não, não...o que eu queria mesmo é que estivesses a viver com a minha mãe.”
Os pais da senhora separam-se quando ela tinha três anos de idade! Há vinte e sete anos!
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O que vejo no dia do colégio? Como se comportam as crianças cujos pais se separaram?
Aparentemente não se nota nada de diferente no seu comportamento, apesar de os pais, quando se separam terem sempre uma conversa connosco a chamar a atenção para o facto de se estarem a separar e por esse motivo pedirem um pouco mais de atenção com a criança pois, pode ter reações diferentes do que tem sido até esse momento. Isto é, os pais, por um lado afirmam que se separam por vários motivos e muitas vezes invocam que os filhos irão ficar melhor pois acabam-se as discussões. Mas, por outro, sabem que algo irá acontecer, que a vida das crianças se vai alterar. E ninguém é capaz de afirmar se será para melhor ou pior. O que sei é que as crianças quando choram, só chamam pelo pai ou pela mãe, por mais ninguém. E muito menos por coisas (isto porque há muitos pais que se desculpam por não terem mais tempo para os filhos porque têm de trabalhar muitas horas para darem uma vida melhor à família… mas, nenhuma criança chora porque quer ter um carro ou uma casa melhor… chora, porque quer ter a mãe e o pai mais tempo junto de si…). Então e como reagem as crianças à separação dos pais?
Quando são muito pequeninas não se dão conta em termos racionais do que se está a passar. Mas em termos afetivos já assim não acontece. Quando a separação acontece e um dos pais (normalmente o pai) começa a aparecer menos vezes, a criança, quando já fala, lá vai referenciando a figura paterna naqueles que aparecem. Ou em outros pais (quantas vezes levantam os bracinhos e dizem " pá, pá..." aos pais dos amigos…). Faz doer a alma…mas é a realidade… à medida que vão sendo mais velhinhos as reações, naturalmente são diferentes. Se o assunto é bem conduzido pelos pais, ou seja, se os pais reconhecem que é imperioso, que neste doloroso processo de separação dos filhos, o mais importante é que eles sofram o mínimo possível (o nada é falso) no ambiente do colégio isso reflete-se na sua conduta. No entanto, uma atitude é transversal a todas as crianças nesta situação: tornam-se mais introvertidas (parece que têm, eles, vergonha do que se está a passar em casa…) mais desatentas e até mais irritadiças. O comportamento com os colegas também se altera. Mais exigentes, dão a ideia que têm o mundo contra eles... no fundo, não percebem porque é que têm amigos cujos pais (mãe e pai) os vêm buscar à escola e eles só têm um deles que os vem buscar, levar para casa onde vão conviver com essa nova realidade que é, à mesa só contarem o que se passou na escola a um dos pais. Falta o outro. Essa é a palavra que pode definir a nova situação: FALTA!! E o que não está presente todos os dias, cada vez ficará mais ausente até que um dia, à pergunta "como correu a escola hoje?" a resposta começa a ser sempre a mesma " Bem". Aí a Falta já não tem remédio.
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Claro que o colégio deve ser informado do que se está a passar em casa, de modo a poder contribuir para amenizar essa nova situação. Enquanto educadores temos obrigação de apoiar as crianças (e os pais) a ultrapassar com os menores danos possíveis esta tormenta que se abateu sobre os seus corações e que eles nunca entenderão. Aos pais, só um apelo: quando pensaram gerar um filho, foi de certeza um ato de Amor. Não o transformem num ato de ódio. O sentimento entre os pais transmite-se à criança. Se amam os filhos, então não lhes falem de ódio ou com ódio seja de quem for. Digam-lhe palavras bonitas. Eles gostam e agradecem. E não se esqueçam que, para cada pai em particular, na sua relação com os filhos, a outra parte (mãe ou pai) é a melhor do mundo. Só assim podem e devem contribuir para que os vossos filhos sejam Felizes (dentro do possível).
Maio de 2017
Dorbalino Martins
Diretor do Externato O Bambi