Dispõe o artigo 18.º n.º 2 do Regime Geral do Processo Tutelar Cível que:
«É obrigatória a nomeação de advogado à criança quando os seus interesses e os dos seus pais, representante legal ou de quem tenha a guarda de facto, sejam conflituantes, e ainda quando a criança com maturidade adequada o solicitar ao tribunal.»
Sobre este direito pronunciou-se o Tribunal da Relação de Lisboa, no acórdão datado de 13 de julho de 2017, o qual analisamos.
Em causa estava um regime de regulação das responsabilidades parentais, o qual acabou por ser obtido por acordo entre os progenitores e que foi homologado pelo Tribunal no decurso do presente ano de 2017, por se ter considerado que o mesmo acautelava devidamente os interesses da criança (nascida em 2003).
Sucede que a criança, por discordar do acordo alcançado, apresentou um requerimento nos autos, no qual expressou que os seus interesses eram conflituantes com os dos seus pais, solicitando que lhe fosse nomeado advogado, na medida em que pretendia interpor recurso da sentença que homologou a regulação das responsabilidades parentais em causa.
O Tribunal de primeira instância entendeu que o pedido de nomeação de advogado, constituiria um ato inútil na medida em que a criança o havia apresentado após a homologação do acordo de regulação das responsabilidades parentais estando, por isso, a decisão transitada em julgado. Mais, considerou o Tribunal que a criança não tinha, também, legitimidade para interpor recurso, pelo que indeferiu o requerimento.
O Ministério Público recorreu, pugnado pelo direito da criança a pedir a nomeação de advogado para efeitos de interposição de recurso.
No acórdão em análise, o Tribunal da Relação de Lisboa considerou que esta criança (que tinha idade superior a 12 anos, à data dos factos), tinha direito à nomeação de advogado.
Com efeito, entendeu o Tribunal da Relação que, nos termos do disposto no artigo 18.º n.º 2 do Regime Geral do Processo Tutelar Cível, o Tribunal de primeira instância estava obrigado a nomear advogado à criança, não lhe sendo «lícito sujeitar o deferimento da nomeação em causa da pertinência da ratio invocada – pelo menor – para a solicitada nomeação», sendo ao advogado nomeado que compete aconselhar e aferir qual o meio adequado para a defesa dos interesses do seu constituinte, no caso, a criança.
Ou seja, se no seu requerimento, o menor havia assente o pedido de nomeação de advogado no facto de existir uma situação de interesses conflituantes – os interesses dos pais e os interesses do menor – o Tribunal teria que ter procedido, sem mais, à nomeação de advogado à criança, independentemente de, à data, a sentença ainda admitir, ou não, recurso, na medida em que a nomeação de advogado à criança deve «ser perspetivado para todo o processo» e não apenas «dirigido tão só para a prática de um único e isolado acto processual.»
Este entendimento sufragado pelo Tribunal da Relação de Lisboa, no referido acórdão assentou, do ponto de vista legal, na norma do artigo 18.º n.º 2 do Regime Geral do Processo Tutelar Cível, bem como na previsão do artigo 103.º n.ºs 2 e 3 da Lei n.º 147/99, de 1 de setembro (Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo) e na própria Lei n.º 103/2009, de 11 de setembro (Lei do Apadrinhamento Civil), normas estas que contemplam a obrigatoriedade de nomeação de patrono à criança ou jovem quando exista uma situação em que os seus interesses e os dos pais, representante legal ou quem tenha a sua guarda de facto sejam conflituantes e, ainda, quando aquele o solicitar, desde que tenha maturidade para tal.
Por fim, não queremos deixar de salientar que este direito das crianças à nomeação de advogado é um corolário do seu direito de audição, sendo importante que os tribunais e todos os intervenientes judiciais saibam atuar, efetivamente, na salvaguarda dos interesses das crianças, para que os seus direitos sejam ferramentas legais consequentes e consentâneas com os seus interesses que é o que se visa, sempre e a todo o tempo, salvaguardar.
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