A Convenção da Haia sobre os aspetos civis do rapto internacional de crianças

De acordo com o artigo 3.º da Convenção, a deslocação ou a retenção de uma criança é considerada ilícita quando tenha sido efetivada em violação de um direito de custódia atribuído a uma pessoa, estando esse direito a ser exercido de forma efetiva, individualmente ou em conjunto, no momento da transferência ou da retenção ou devesse estar se tais acontecimentos não se tivessem verificado.

Este direito de custódia pode resultar de uma atribuição de pleno direito, de uma decisão judicial ou administrativa ou de um acordo vigente segundo o Direito do Estado da residência habitual da criança.

O artigo 5.º da Convenção indica o conteúdo do direito de custódia, no sentido de que este inclui o direito relativo aos cuidados devidos à criança, como pessoa e, particularmente, o direito de decidir sobre o lugar de residência desta.

Uma questão que se pode colocar é a de saber se a Convenção é aplicável num caso em que os pais ainda não tenham regulado o exercício das responsabilidades parentais relativas a uma criança e a criança tenha sido deslocada e/ou retida ilicitamente por um dos progenitores em outro País, que não o da sua residência habitual.

A resposta a esta pergunta pode encontrar-se logo no relatório explicativo relativo à referida Convenção, onde é salientado, a propósito do artigo 3.º, que uma das características deste instrumento internacional é a sua aplicabilidade à proteção dos direitos de custódia que sejam exercidos antes de qualquer decisão sobre a matéria. Efetivamente, existem muitos casos em que as crianças são deslocadas ou retidas ilicitamente antes que exista uma decisão sobre a custódia, pelo que se a Convenção não abrangesse também estas situações, um conjunto significativo de crianças estariam desprotegidas numa situação em que um dos progenitores a deslocasse e/ou retivesse ilicitamente, fazendo-se valer do facto de ainda não existir uma regulação das responsabilidades parentais para evitar a aplicação da Convenção.

 

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O conceito de residência habitual no âmbito da Convenção da Haia de 1996

O conceito de residência habitual no âmbito da Convenção da Haia de 1996

Quando que existe uma separação de um casal com filhos importa, para efeitos de regulação do exercício das responsabilidades parentais determinar qual o tribunal competente para regular esse mesmo exercício – quer quando existe um litigio, quer quando é de comum acordo -, na medida em que a regulação das responsabilidades parentais tem que ser, sempre, homologada.

Quando o casal e os filhos têm nacionalidades diferente e/ou quando vivem em países dos quais não são nacionais, esta questão torna-se, ainda, mais relevante.

Se, no espaço da EU, releva quanto disposto no Regulamento (CE) n.° 2201/2003, do Conselho, de 27 de Novembro de 2003, relativo à competência, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria matrimonial e em matéria de responsabilidade parental, que no seu artigo 8º, dispõe que «Os tribunais de um Estado-Membro são competentes em matéria de responsabilidade parental relativa a uma criança que resida habitualmente nesse Estado-Membro à data em que o processo seja instaurado no tribunal», põe-se a questão de saber o que acontece quando estão envolvidas outras nacionalidades fora da União.

O que acontece, por exemplo, se estiver em causa uma família de nacionalidade australiana que, tendo fixado residência em Portugal, há pouco tempo, se separa? Mais, o que acontece se, por exemplo um dos membros da família pretender regressar à Austrália e levar os filhos consigo?

Numa situação como esta, porque não tem aplicação o supra referido regulamento, terão que ser aplicadas as regras do Código Civil, concretamente o artigo 59º do Código de Processo Civil, nos termos do qual: «Sem prejuízo do que se encontre estabelecido em regulamentos europeus e em outros instrumentos internacionais, os tribunais portugueses são internacionalmente competentes quando se verifique algum dos elementos de conexão referidos nos artigos 62º e 63º ou quando as partes lhe tenham atribuído competência nos termos do artigo 94.º.»

Portugal está internacionalmente vinculado pela Convenção Relativa à Competência, à Lei Aplicável, ao Reconhecimento, à Execução e à Cooperação em Matéria de Responsabilidade Parental e Medidas de Proteção das Crianças, adotada em Haia em 19 de Outubro de 1996, a qual produz efeitos na ordem jurídica interna e que prevalece sobre as normas processuais portuguesas.

O artigo 5º da Convenção, prevê que: «1 -As autoridades jurídicas ou administrativas do Estado Contratante no qual a criança tem a sua residência habitual possuem competência para tomar as medidas necessárias à proteção da pessoa ou bens da criança.»

Importa, pois, determinar o conceito de residência habitual.

A jurisprudência tem entendido que, a residência habitual, no caso, de um menor, será o local onde este vê organizada a sua vida com carácter de estabilidade e permanência. A residência habitual de um menor, é o local onde este desenvolve, habitualmente, a sua vida (ainda que há pouco tempo), onde frequenta a escola, onde tem amigos e atividades, em suma, o local onde se encontra integrado.

A residência habitual pode ser o local para onde o menor se mudou recentemente mas no qual se estabeleceu de forma permanente.

Assim, voltando ao exemplo supre referido da família de nacionalidade australiana que, tendo fixado residência em Portugal, há pouco tempo, se separa e em que um dos progenitores pretende regressar à Austrália, levando consigo, os filhos, a competência internacional para regular o exercício das responsabilidades parentais dos menores (e, consequentemente autorizar, ou não, a relocalização dos menores para a Austrália) pertence aos Tribunais portugueses.

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O conceito de residência habitual na determinação da competência internacional dos Tribunais

O conceito de residência habitual na determinação da competência internacional dos Tribunais

 

O Regulamento (CE) nº 2201/2003 do Conselho de 27/11/2003, relativo à competência, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria matrimonial e em matéria de responsabilidade parental, estabelece que serão competentes, para decidir sobre questões de responsabilidade parental, os tribunais do Estado-membro da residência habitual da criança.

O acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 11 de outubro de 2017 entendeu que, na determinação do conceito de residência habitual, deverão ser tidos em conta os objetivos que, o Regulamento (CE) n.º 2201/2003 do Conselho, pretendeu acautelar, nomeadamente, quando no ponto 12 do Regulamento se refere que «as regras de competência em matéria de responsabilidade parental do presente regulamento são definidas em função do superior interesse da criança e, em particular, do critério de proximidade … a competência deverá ser, em primeiro lugar, atribuída aos tribunais do Estado-Membro de residência habitual da criança, excepto em determinados casos de mudança da sua residência habitual ou na sequência de um acordo entre os titulares da responsabilidade parental

Considerou o Tribunal da Relação de Coimbra que, determinante na fixação da competência do tribunal, deverá ser o critério da proximidade, enquanto critério que melhor assegura a proteção do superior interesse da criança, sendo o conceito de residência habitual um critério aferidor da proximidade do Estado-Membro com a criança.

Em conformidade com o entendimento supra mencionado foi, por aquele tribunal, decidido que, para a alteração da regulação das responsabilidades parentais de um menor, residente na Alemanha, com a Mãe, filho de pais portugueses, nascido em 2004, em Portugal onde viveu até 2012, data em que se mudou para a Alemanha, será internacionalmente competente o tribunal português pois, «… sendo um dos fitos da atribuição da competência a um dado tribunal a melhor resolução da causa, por se entender que a proximidade dos contornos ou circunstâncias do caso favorecem a consecução de uma decisão mais justa e conscienciosa, o caso vertente aconselha que seja o tribunal português, o de Viseu, a apreciar e decidir, desde logo, pelo critério de aproximação e os superiores interesses do menor, que devem estar sempre na linha da frente, até porque o menor aqui nasceu, e conviveu com os seus familiares, aqui mantendo as suas origens e raízes, por um lado, e por outro o pouco tempo que se encontra na Alemanha

Necessariamente, o conceito de residência habitual tem que ser preenchido, caso a caso e o contributo da jurisprudência, que aplica o Direito aos factos, é de suma relevância.

Destacamos, aqui, este acórdão pelo contributo que dá ao preenchimento do conceito de residência habitual e, também, porque o seu sentido decisório nos leva a questionar o que é a proximidade na linha do tempo da vida de uma criança.

Outros tribunais já decidiram de forma oposta ao do acórdão aqui em destaque, o que equivale a dizer que o conceito de residência habitual no âmbito deste Regulamento continua em construção e o debate aberto.

 

 

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