Bens comuns e bens próprios no regime da comunhão de adquiridos

No regime da comunhão de adquiridos, os bens que advenham na constância do casamento a qualquer um dos cônjuges e que não sejam excetuados por lei, são bens comuns.

Por vezes, pode acontecer que os cônjuges adquiram bens parcialmente com dinheiro e/ou bens próprios de um deles e com dinheiro e/ou bens comuns de ambos. Nestas situações, o artigo 1726.º do Código Civil determina que os bens assim adquiridos, serão próprios ou comuns consoante a natureza comum ou própria da mais valiosa das duas prestações.

Clarificando, se ambos os cônjuges construírem, durante o casamento, uma moradia num terreno que é bem próprio de um deles, o prédio urbano resultante da construção adquire a natureza de bem comum se a edificação for mais valiosa do que o terreno onde está implantada.

Esta distinção assume relevância em situações de dissolução do casamento, seja por divórcio, seja por óbito, em que tenha que se fazer a partilha de bens comuns, pois, a verdade é que, de acordo com o artigo 1726.º n.º 2 do Código Civil, no momento da dissolução e subsequente partilha do acervo comum, terá que ser efetuada a compensação pelo património comum do ex-casal ao património próprio de um dos cônjuges ou, ao contrário, consoante a concreta situação, ou seja, no exemplo supra, o património comum terá que compensar o cônjuge proprietário único do terreno onde foi construída a moradia do valor do terreno, pelo que, existindo inventário, o imóvel será relacionado como bem comum e será relacionado como passivo comum do casal ao cônjuge proprietário do terreno o valor deste terreno.

 

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Vamos casar: detalhes práticos do processo

Vamos casar: detalhes práticos do processo

Quando duas pessoas decidem casar, existem vários detalhes práticos que têm que ser tratados, para que o casamento possa ocorrer.

Em primeiro lugar, há que ter em conta que, para casar, os noivos, se não forem ainda maiores de 18 anos, terão que, pelo menos, ter mais de 16 anos e estar devidamente autorizados para o efeito.

Também não poderá casar quem apresente demência notória, nem os maiores acompanhados (neste caso, deste que tal impedimento tenha sido devidamente declarado na decisão de acompanhamento).

Para além de outros impedimentos, nomeadamente, os resultantes da existência de relações de parentesco entre os noivos, também não poderá casar quem ainda se mantenha no estado de casado com outra pessoa.

Para que o processo de casamento se inicie, os noivos deverão, pessoalmente ou através de procurador, com poderes especiais para tal, iniciar o processo, junto de uma Conservatória do Registo Civil, onde, após declararem que pretendem casar um com o outro, indicarão se o casamento será civil, católico ou civil sob forma religiosa (no caso de a religião não ser a católica), o local onde pretendem casar, o dia e hora.

É também nesta altura que, os noivos, escolhem qual o regime de bens sob o qual pretendem casar, podendo também, em determinadas circunstâncias, escolher a lei que querem que seja aplicada na determinação do regime de bens.

Em alternativa, os noivos podem celebrar, num Cartório Notarial, uma escritura de convenção antenupcial que deverão apresentar na Conservatória do Registo Civil, para efeitos de determinação do regime de bens escolhido.

A escolha do regime de bens deverá ser precedida de aconselhamento legal pois, não é de somenos a compreensão dos vários regimes possíveis (comunhão geral de bens, comunhão de adquiridos e separação de bens) ou ainda a opção, por um regime que seja particular para o caso concreto do casal.

Para iniciar o processo, terão que ser apresentados os documentos de identificação de cada um dos noivos e, caso estes sejam estrangeiros, a respetiva autorização de residência, o passaporte ou documento equivalente.

A partir do momento da formalização do início do processo de casamento, poderão ser apresentados, por qualquer pessoa, motivos que impeçam o casamento. Se, tal acontecer e, por isso, o pedido for recusado, os noivos são notificados de tal decisão (pessoalmente ou por carta registada), podendo recorrer da mesma.

Não existindo qualquer à impedimento a celebração do casamento, os noivos dispõem do prazo seis meses para efetivar o casamento.

Finalmente, porque, por vezes, acontece, refira-se que se um dos noivos estiver representado, por procurador, a procuração terá que ter poderes especiais para casar e deverá ser outorgada através de documento assinado pelo representado e com reconhecimento presencial da assinatura. Da procuração deverá, ainda, constar a identificação completa do futuro cônjuge do mandante, bem como o regime de bens e se o casamento será civil, católico ou civil sob forma religiosa.

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O regime da comunhão de adquiridos e a titularidade de participação social: bem comum ou bem próprio?

O regime da comunhão de adquiridos e a titularidade de participação social: bem comum ou bem próprio?

Nos termos artigo 1724.º alínea b) do Código Civil, no regime da comunhão de adquiridos, fazem parte dessa comunhão “os bens adquiridos pelos cônjuges na constância do matrimónio, que não sejam excetuados por lei”.

Com efeito, das disposições conjugadas dos artigos 1722.º a 1724.º do Código Civil, resulta que o regime da comunhão de adquiridos se caracteriza por:

- o património comum do casal ser integrado pelos bens resultantes do esforço e da colaboração dos cônjuges na sua obtenção, nomeadamente, os bens que estes, na constância do matrimónio venham a adquirir, a título oneroso, sendo ainda considerados comuns os rendimentos de bens próprios de cada um dos cônjuges;

- não se integrarem no património comum do casal, os bens que os cônjuges tenham trazido para o casamento ou que tenham sido por eles adquiridos, a título gratuito por doação ou sucessão, os quais são bens próprios do cônjuge que os trouxe ou recebeu, mantendo-se, desta forma, na propriedade exclusiva desse cônjuge.

Assim, no regime da comunhão de adquiridos existe uma presunção de comunhão relativamente aos bens adquiridos na constância do matrimónio, a título oneroso e, esta presunção, para ser afastada, implica que o cônjuge que pretenda provar que o bem em causa é bem próprio (seu) terá o ónus de ilidir essa presunção de comunhão.

Pensemos num casal, casado no regime da comunhão de adquiridos, em que apenas um deles adquire, a título oneroso, uma participação numa sociedade.

A participação social é bem comum ou é bem próprio do titular da participação?

O Código das Sociedades Comerciais refere, no seu artigo 8.º n.º 2, que:

Quando uma participação social for, por força do regime matrimonial de bens, comum aos dois cônjuges, será considerado como sócio, nas relações com a sociedade, aquele que tenha celebrado o contrato de sociedade ou, no caso de aquisição posterior ao contrato, aquele por quem a participação tenha advindo ao casal”.

Ou seja, do ponto de vista societário, ainda que a participação social seja bem comum, o sócio é o titular da referida participação mas tal disposição não permite determinar qual a natureza da participação social em causa, se a mesma é bem comum ou se, pelo contrário, é bem próprio do cônjuge titular da mesma.

Tal determinação tem que ser encontrada nas regras que compõem o regime da comunhão de adquiridos.

Conforme supra referido, no acionamento do regime da comunhão de adquiridos, por exemplo, em sede de partilha subsequente ao divórcio, a presunção será a de que esta participação reveste a natureza de bem comum, desde que adquirida a título oneroso, só assim não sendo, se o cônjuge a quem aproveitar a demonstração que o bem é próprio, ilidir essa presunção de comunicabilidade, caso não tenha, aquando da aquisição da titularidade da participação social, acautelado que a mesma foi adquirida com capitais próprios seus, nos termos do disposto no artigo 1723.º alínea c) do Código Civil.

Mais, o cônjuge titular da participação social em causa poderá demonstrar que a mesma foi adquirida com dinheiro que lhe foi entregue por um terceiro, por exemplo um familiar, pois conforme resulta do artigo 1722.º alínea b) do Código Civil, no regime da comunhão de adquiridos são considerados bens próprios dos cônjuges os que lhes advierem, após o casamento, por sucessão ou por doação, fazendo todo o sentido excluir esses bens do acervo comum tomando em conta que estes bens adquiridos após o casamento não resultaram do esforço conjunto dos cônjuges, esforço esse que releva para efeitos da comunhão de adquiridos.

Em conclusão, quem casa no regime da comunhão de adquiridos tem que reter que existe uma presunção de comunicabilidade dos bens adquiridos após o casamento, a titulo oneroso, pelo que, querendo salvaguardar que um bem, ainda que adquirido a título oneroso, não integre o acervo comum deve rodear-se das cautelas necessárias, para demonstrar que, efetivamente, a aquisição foi, por exemplo, feita com capitais próprios seus, devendo também, para efeitos de clarificação futura (se for o caso) consignar tal no ato de aquisição, cumprindo com os requisitos que a lei impõe.

De outro modo, haverá uma presunção de comunicabilidade que importa ilidir se o outro cônjuge se quiser prevalecer dessa presunção, o que, poderá acarretar um esforço acrescido para o cônjuge que quer provar que o bem em causa é bem próprio, esforço acrescido esse que pode até resultar do decurso do tempo, tornando-se mais difícil coligir as provas que demonstram tal.

No sentido de que mais vale prevenir do que remediar, melhor será que, em cada aquisição, se efetivamente, o bem deve ser considerado como bem próprio, não obstante o regime de bens, tal fique, desde logo, explicitado.

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As relações patrimoniais dos unidos de facto

As relações patrimoniais dos unidos de facto

Nos termos da lei, a união de facto corresponde à situação jurídica de duas pessoas que, independentemente do sexo, vivem em condições análogas às dos cônjuges, prolongando-se tal situação por mais de dois anos.

Do regime da união de facto resulta que o legislador optou por não regulamentar muito esta realidade, deixando uma margem de liberdade aos unidos de facto e, em situações de lacuna, não existe fundamento legal para preencher uma omissão por recurso ao regime legal que vigora para o casamento, tomando em conta que casamento e união de facto são situações legais distintas.

Um dos pontos que não se encontra contemplado na regulamentação legal da união de facto é o das relações patrimoniais entre os seus membros, na medida em que, ao contrário dos casados, não vigora, entre os unidos de facto, num regime de bens que regule as relações patrimoniais entre eles.

Do mesmo modo, nas uniões de facto não se contemplam questões como as relativas, por exemplo, à administração de bens ou às dívidas, situações estas que, pelo contrário, encontram esteio legal no casamento.

Ora, não existindo previsões legais relativas às relações patrimoniais entre os unidos de facto, as mesmas terão que ficar sujeitas ao regime geral das relações obrigacionais e reais, salvo se os unidos de facto, no âmbito da autonomia da vontade, tiverem acordado, por exemplo, nos termos da divisão dos bens que constituem o acervo patrimonial que foi constituído durante a união de facto, no caso de esta se extinguir.

E, caso os unidos de facto tenham optado por regular, entre si, os termos da sua partilha de bens e clausular a assunção de responsabilidades por dívidas contraídas na pendência da mesma união, deverá esse acordo ser cumprido entre ambos, no momento em que a união de facto se dissolve.

Com efeito, nada obsta a que, numa união de facto, sabendo os seus membros que a sua situação jurídica carece de previsões legais abrangentes, optem por, até de forma detalhada, regularem as suas relações patrimoniais, com identificação dos passivos existentes e de quem é responsável pelas mesmos, bem como concretizar o ativo existente e a identificação de quem fica com o quê.

A elaboração de um acordo deste tipo facilita a resolução das questões patrimoniais decorrentes da cessação da união de facto sendo que, em última instância e nada estado contratado entre os unidos de facto, sempre se pode recorrer ao regime jurídico do enriquecimento sem causa, para se poder solucionar os problemas que possam surgir em sede de efeitos patrimoniais decorrentes da cessação da união de facto.

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Alguns efeitos patrimoniais da comunhão de adquiridos

Alguns efeitos patrimoniais do regime da comunhão de adquiridos

Conforme decorre do disposto no artigo 1724.º do Código Civil, consideram-se integrados no acervo patrimonial comum do casal, os bens que tenham sido adquiridos pelos cônjuges na constância do casamento, ressalvados os bens excetuados por lei que mantém a qualidade de bens próprios.

Assim sendo, se um casal, casado no regime da comunhão de adquiridos, edificar uma casa num terreno que seja bem próprio de um deles (porque lhe adveio por doação após o casamento) recorrendo, para o efeito, a um mútuo bancário contraído por ambos, este bem (terreno com casa construída) deverá ser considerado como bem próprio do cônjuge a quem foi doado o terreno para construção ou, pelo contrário, deverá ser entendido como um bem comum tomando em conta a edificação da casa, paga a expensas de ambos, com recurso a crédito bancário?

De acordo com o disposto no artigo 1726.º do Código Civil, os bens adquiridos, em parte, com dinheiro ou bens próprios de um dos cônjuges e, noutra parte, com dinheiro ou bens comuns revestem a natureza da mais valiosa das prestações.

Assim, por aplicação desta norma, decorrerá que o bem se modifica, passando a revestir a natureza de bem comum sendo que esta solução será, também, aquela que melhor se adequa ao regime da comunhão de adquiridos, na medida em que, neste regime ingressam, no património comum, todos os ganhos e bens recebidos pelos cônjuges durante a vigência do casamento (que não sejam excetuados por lei).

Deste modo, a edificação de uma casa, nos termos referidos, deverá considerar-se como abrangida pelo conceito de “bem adquirido” na constância do casamento, perdendo significado os termos de aquisição do terreno, doado apenas a um dos cônjuges.

Em conclusão, numa situação como a supra relatada, deverá passar-se a falar de um bem comum a ambos os cônjuges.

 

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A modificação do regime de bens do casamento e a determinação do tribunal competente para apreciar da ação de simples separação de bens

A modificação do regime de bens do casamento e a determinação do tribunal competente para apreciar da ação de simples separação judicial de bens

O artigo 1714.º n.º 1 do Código Civil consagra a regra da imutabilidade das convenções antenupciais e dos regimes de bens legalmente fixados.

Dispõe esta norma nos seguintes termos:

«1. Fora dos casos previstos na lei, não é permitido alterar, depois da celebração do casamento, nem as convenções antenupciais nem os regimes de bens legalmente fixados

Ora, uma das exceções a esta regra encontra-se prevista na alínea b) do n.º 1 do artigo 1715.º do Código Civil, ao admitir que seja operada uma alteração ao regime de bens através da simples separação judicial de bens.

Com efeito, de acordo com quanto previsto no artigo 1767.º do Código Civil:

«Qualquer dos cônjuges pode requerer a simples separação judicial de bens quando estiver em perigo de perder o que é seu pela má administração do outro cônjuge

Esta separação tem que ser judicialmente decretada, através de ação movida, pelo cônjuge lesado contra o outro, conforme decorre do preceituado nos artigos 1768.º 1769.º, ambos do Código Civil.

Sendo intentada esta ação, após o trânsito em julgado da sentença que decretar a separação judicial de bens, é modificado o regime de bens, o qual passa a ser o da separação de bens, quando antes vigorava ou o regime da comunhão geral de bens ou o regime da comunhão de adquiridos.

Com a modificação do regime de bens, para o da separação de bens, importará proceder à partilha do acervo comum do casal, tal como ocorreria se o casamento tivesse sido dissolvido (artigo 1770. N.º 1 do Código Civil).

Desde já, importa destrinçar a separação judicial de bens da separação judicial de pessoas e bens, na medida em que aquela, uma vez decretada, modifica apenas a relação matrimonial quanto aos bens, mantendo inalterada a relação matrimonial quanto às pessoas, pelo que os cônjuges continuam a ter os mesmos direitos e deveres decorrentes do casamento.

Já na separação judicial de pessoas e bens, a separação produz efeitos, quer em relação aos bens, quer em relação às pessoas dos cônjuges.

Por esta razão, a ação de simples separação judicial de bens não se confunde com a ação de separação de pessoas e bens, com diferenças assinaláveis a nível processual, nomeadamente, o facto de aquela ter sempre carácter judicial e litigioso, seguindo o processo comum, contrariamente a esta que pode tramitar no quadro do mútuo consentimento, seja em tribunal, seguindo o processo especial de jurisdição voluntária previsto e regulado nos artigos 994.º e seguintes do Código de Processo Civil, seja junto da conservatória do registo civil, seguindo o processo previsto no artigo 931.º do Código de Processo Civil.

Assim sendo, é materialmente competente para conhecer da ação de simples separação judicial de bens a seção cível da instância local e não a secção de competência especializada de família, na medida em que a ação de simples separação judicial de bens não se enquadra em nenhuma das previsões constantes do artigo 122.º da Lei Organização do Sistema Judiciário.

Já quanto à ação de separação de pessoas e bens é materialmente competente para conhecer da mesma a secção de competência especializada de família, em decorrência de quanto previsto neste artigo 122.º n.º 1, alínea c).

 

 

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Doações entre marido e mulher

Doações entre marido e mulher

Um tema que não é muito falado, mas que, nem por isso, deixa de ter relevância, é o das doações efetuadas entre cônjuges.

Em que termos podem ser feitas, quais as suas restrições, qual a validade destas doações, são algumas das perguntas que se colocam e que importa esclarecer.

Desde logo, o primeiro aspeto a considerar, prende-se com o regime de bens do casamento pois, sempre que o regime da separação de bens resulte, não de uma escolha de ambos, mas de uma imposição legal - nos casos em que não foi precedido do processo preliminar de casamento ou nos casos em que, um dos nubentes tenha, à data do casamento, 60 anos - as doações, que sejam feitas entre marido e mulher, são nulas nos termos do artigo 1762º do Código Civil.

Importa, também, salientar que são proibidas as doações de bens comuns, resultando esta proibição do princípio da imutabilidade do regime de bens, com o qual se pretende proteger o património comum do casal, proteção esta que pode assumir relevância em matéria de salvaguarda dos direitos de credores de ambos os cônjuges.

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Sendo possível a doação entre cônjuges, uma das especificidades a ter em conta é a de que o doador pode, a todo o tempo, revogar a doação, sendo este direito irrenunciável, o que se explica pelo facto de se pretender evitar que, através de ascendente físico, intelectual ou moral, de um dos cônjuges sobre o outro, o cônjuge beneficiário da doação, possa extorquir - ao outro - bens conseguindo, por esta via, modificar o regime de bens em que casou.

Para acautelar este perigo de extorsão nas doações entre casados, a lei consagrou a livre revogação destas, sem necessidade de o cônjuge revogante ter que invocar qualquer justificação para tal, permitindo assim que, caso a doação tenha sido fruto da pressão do outro cônjuge, o doador possa destruir a doação feita, sem que o outro tenha que ter conhecimento de tal revogação e sem que se possa opor à mesma.

Este direito de livre revogação, encontra-se previsto apenas para as doações efetuadas entre casados, não separados judicialmente de pessoas e bens.

Com efeito, a separação judicial de pessoas e bens, apesar de não dissolver o vínculo conjugal, extingue o dever de coabitação entre os cônjuges e, quanto aos bens, a separação produz os mesmos efeitos que se produziriam com a dissolução do casamento.

Assim, numa situação de separação judicial de pessoas e bens, já não se verificam os riscos de extorsão que levaram à consagração legal da livre revogabilidade das doações entre casados, razão porque o direito de livre revogação se encontra previsto apenas para as doações entre casados, não separados de pessoas e bens.

Por completude quanto ao regime da livre revogabilidade previsto na lei, refira-se que, os herdeiros do cônjuge doador não podem revogar a doação que este haja feito.

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Outro aspeto a considerar é o de que as doações de um cônjuge ao outro, não se comunicam, seja qual for o regime de bens, o que equivale a dizer que, ainda que o regime seja o da comunhão geral de bens, o bem doado, por exemplo, pela mulher ao marido, será sempre considerado bem próprio deste.

Já quanto ao regime da caducidade das doações entre casados, a lei prevê, no artigo 1766º do Código Civil, três situações em que esta caducidade opera automaticamente:

- quando o cônjuge beneficiário da doação morra antes do doador, exceto se este confirmar a doação nos três meses seguintes à morte daquele;

- quando o casamento seja declarado nulo ou anulado;

- quando seja decretado o divórcio ou a separação judicial de pessoas e bens.

Tomando em conta a redação da alínea c) do nº 1, do artigo 1766º do Código Civil, que refere que a doação entre casados caduca em caso de divórcio ou separação judicial de pessoas e bens «por culpa do donatário, se este for considerado único ou principal culpado» e, tomando em conta que, com a Lei nº 61/2008, de 31 de outubro de 2008 deixou de existir o divórcio litigioso fundado na culpa de um dos cônjuges, colocou-se a questão de saber se, não podendo o divórcio ocorrer por culpa do cônjuge beneficiário da doação - não podendo este vir a ser considerado cônjuge único ou principal culpado pelo divórcio -, a causa de caducidade prevista na alínea c) do nº 1, do artigo 1766º do Código Civil devia, ou não, operar em caso de divórcio.

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A resposta a esta questão encontra-se na previsão do artigo 1791º, nº1 do Código Civil, na redação que lhe foi dada pela referida Lei nº 61/2008 que, a seguir se transcreve:

«1 – Cada cônjuge perde todos os benefícios recebidos ou que haja de receber do outro cônjuge ou de terceiro, em vista do casamento ou em consideração do estado de casado, quer a estipulação seja anterior quer posterior à celebração do casamento.».

Ou seja, por efeito do divórcio, os cônjuges perdem todos os benefícios, não carecendo o cônjuge de ser declarado, como era antes da entrada em vigor da Lei nº 61/2008, único e principal culpado. Um dos benefícios é o da doação que tenha sido feita entre casados.

Tomando em conta que, crê-se, por lapso, não foi alterada a redação da parte final da alínea c) do nº 1 do artigo 1766º do Código Civil, - que deveria ter sido adequada à nova redação do artigo 1791º do mesmo Código, que eliminou a referência ao cônjuge declarado único ou principal culpado -, deve ser considerado que esta se encontra tacitamente revogada na parte em que faz depender a caducidade da doação da exigência de o divórcio ter ocorrido por culpa do beneficiário da mesma sendo este considerado cônjuge único ou principal culpado.

Deste modo, a interpretação que deve ser feita da alínea c) do nº 1 do artigo 1766º do Código Civil é a de que, a doação entre casados, caduca sempre por efeito do divórcio. Neste sentido, encontramos o parecer nº 44/CC/2014, do Instituto dos Registos e do Notariado, datado de 18 de agosto de 2014. Também no sentido de que se deve fazer uma interpretação revogatória ou ab-rogante da alínea c) do nº 1, do artigo 1766º do Código Civil refere-se, a título de exemplo, o acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Coimbra, datado de 21 de fevereiro de 2017.

Conforme resulta do referido parecer, operando a caducidade por efeito do divórcio, terá que ser feito um novo registo de aquisição, pelo doador, invocando como causa a caducidade da doação, por forma a extinguir o direito na esfera jurídica do beneficiário da doação.

Caducando a doação, o doador pode determinar que esta reverta para os filhos do casamento, conforme previsão do artigo 1791º, nº 2 do Código Civil, com o que se pretende proteger os interesses dos filhos do casamento, fazendo-se reverter a doação a favor destes.

Seguindo de perto o aludido parecer nº 44/CC/2014 neste segmento, resulta que: «o registo a fazer, na sequência da caducidade da doação, deverá ser de aquisição a favor dos filhos do casamento, tendo por base a declaração de vontade do doador destinada a operar em face do divórcio, do efeito patrimonial extintivo em tabela e da existência de filhos comuns do dissolvido casal

As questões que acabámos de referir, apesar de não esgotarem o tema das doações entre casados, são as que, em termos gerais, se apresentam como mais relevantes e que, por isso, cumpre assinalar.