Quem representa, na assembleia geral, a quota que faz parte de uma herança indivisa?

Sempre que se abre a sucessão de uma pessoa, o conjunto dos bens, direitos, obrigações e relações jurídicas que não se extinguem com a morte, compõem a herança do de cujus, herança esta que tem que ser administrada até à partilha.

Existindo uma comunhão hereditária, os titulares da herança são os herdeiros do falecido.

Fazendo parte do acervo hereditário uma quota numa sociedade comercial, titulada pelo falecido, importa ter presente o regime de contitularidade de quotas, previsto nos artigos 222.º a 224.º do Código das Sociedades Comerciais.

Conforme resulta do artigo 222.º n.º 1:

«1. Os contitulares da quota devem exercer os direitos a ela inerentes através de representante comum”.

E, de acordo com o disposto no artigo 223.º:

«1. O representante comum, quando não for designado por lei ou por disposição testamentária, é nomeado e pode ser destituído pelos contitulares

Conforme resulta dos artigos 2079.º e seguintes do Código Civil, a lei consagra um regime próprio de administração no que respeita à herança ilíquida e indivisa, a qual incumbe ao cabeça-de-casal.

De acordo com o artigo 2080.º do Código Civil:

«1 – O cargo de cabeça-de-casal defere-se pela ordem seguinte:

  1. a) Ao cônjuge sobrevivo, não separado judicialmente de pessoas e bens, se for herdeiro ou tiver meação nos bens do casal;
  2. b) Ao testamenteiro, salvo declaração do testador em contrário;
  3. c) Aos parentes que sejam herdeiros legais;
  4. d) Aos herdeiros testamentário

2 – De entre os parentes que sejam herdeiros legais, preferem os mais próximos em grau,
3 – De entre os herdeiros legais do mesmo grau de parentesco, ou de entre os herdeiros
testamentários, preferem os que viviam com o falecido há pelo menos um ano à data da morte.
4 – Em igualdade de circunstâncias, prefere o herdeiro mais velho

Assim, a representação da quota numa sociedade que integra o acervo hereditário, é assegurada pelo represente comum dos herdeiros, conforme resulta do artigo 222.º n.º 1 do Código das Sociedades Comerciais, mais concretamente, pelo cabeça-de-casal.

Por vezes, ocorre que, em sociedades em que os sócios têm relações familiares entre si, por exemplo, Pais e filhos, falecendo um deles, um dos sócios assume a qualidade de cabeça-de-casal e, por isso, de representante comum da quota anteriormente titulada pelo falecido.

Nestas circunstâncias, importa ter em conta, que a qualidade de sócio e a qualidade de representante comum da quota não se confundem, pelo que, numa assembleia geral, o sócio que, simultaneamente for represente comum da quota, terá que participar e votar nessa dupla qualidade, sob pena de invalidade da deliberação social.

Com efeito, conforme resulta do artigo 56.º n.º 1 do Código das Sociedades Comerciais, são nulas as deliberações tomadas pelos sócios em assembleia geral não convocada, a menos que todos os sócios tenham estado presentes ou representados.

Para efeitos deste artigo, uma assembleia não convocada será aquela que não foi precedida de qualquer convocatória e, também, aquela que tenha sido realizada sem a presença de um ou mais sócios, que não foram convocados, pelo que, se na ata da assembleia geral, não constar a participação do sócio representante comum da quota (cabeça-de-casal), na sua dupla qualidade, de sócio e de representante comum da herança ilíquida e indivisa, tal conduzirá, nos termos do artigo 56.º, à nulidade das deliberações tomadas nessa assembleia.

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O regime da comunhão de adquiridos e a titularidade de participação social: bem comum ou bem próprio?

O regime da comunhão de adquiridos e a titularidade de participação social: bem comum ou bem próprio?

Nos termos artigo 1724.º alínea b) do Código Civil, no regime da comunhão de adquiridos, fazem parte dessa comunhão “os bens adquiridos pelos cônjuges na constância do matrimónio, que não sejam excetuados por lei”.

Com efeito, das disposições conjugadas dos artigos 1722.º a 1724.º do Código Civil, resulta que o regime da comunhão de adquiridos se caracteriza por:

- o património comum do casal ser integrado pelos bens resultantes do esforço e da colaboração dos cônjuges na sua obtenção, nomeadamente, os bens que estes, na constância do matrimónio venham a adquirir, a título oneroso, sendo ainda considerados comuns os rendimentos de bens próprios de cada um dos cônjuges;

- não se integrarem no património comum do casal, os bens que os cônjuges tenham trazido para o casamento ou que tenham sido por eles adquiridos, a título gratuito por doação ou sucessão, os quais são bens próprios do cônjuge que os trouxe ou recebeu, mantendo-se, desta forma, na propriedade exclusiva desse cônjuge.

Assim, no regime da comunhão de adquiridos existe uma presunção de comunhão relativamente aos bens adquiridos na constância do matrimónio, a título oneroso e, esta presunção, para ser afastada, implica que o cônjuge que pretenda provar que o bem em causa é bem próprio (seu) terá o ónus de ilidir essa presunção de comunhão.

Pensemos num casal, casado no regime da comunhão de adquiridos, em que apenas um deles adquire, a título oneroso, uma participação numa sociedade.

A participação social é bem comum ou é bem próprio do titular da participação?

O Código das Sociedades Comerciais refere, no seu artigo 8.º n.º 2, que:

Quando uma participação social for, por força do regime matrimonial de bens, comum aos dois cônjuges, será considerado como sócio, nas relações com a sociedade, aquele que tenha celebrado o contrato de sociedade ou, no caso de aquisição posterior ao contrato, aquele por quem a participação tenha advindo ao casal”.

Ou seja, do ponto de vista societário, ainda que a participação social seja bem comum, o sócio é o titular da referida participação mas tal disposição não permite determinar qual a natureza da participação social em causa, se a mesma é bem comum ou se, pelo contrário, é bem próprio do cônjuge titular da mesma.

Tal determinação tem que ser encontrada nas regras que compõem o regime da comunhão de adquiridos.

Conforme supra referido, no acionamento do regime da comunhão de adquiridos, por exemplo, em sede de partilha subsequente ao divórcio, a presunção será a de que esta participação reveste a natureza de bem comum, desde que adquirida a título oneroso, só assim não sendo, se o cônjuge a quem aproveitar a demonstração que o bem é próprio, ilidir essa presunção de comunicabilidade, caso não tenha, aquando da aquisição da titularidade da participação social, acautelado que a mesma foi adquirida com capitais próprios seus, nos termos do disposto no artigo 1723.º alínea c) do Código Civil.

Mais, o cônjuge titular da participação social em causa poderá demonstrar que a mesma foi adquirida com dinheiro que lhe foi entregue por um terceiro, por exemplo um familiar, pois conforme resulta do artigo 1722.º alínea b) do Código Civil, no regime da comunhão de adquiridos são considerados bens próprios dos cônjuges os que lhes advierem, após o casamento, por sucessão ou por doação, fazendo todo o sentido excluir esses bens do acervo comum tomando em conta que estes bens adquiridos após o casamento não resultaram do esforço conjunto dos cônjuges, esforço esse que releva para efeitos da comunhão de adquiridos.

Em conclusão, quem casa no regime da comunhão de adquiridos tem que reter que existe uma presunção de comunicabilidade dos bens adquiridos após o casamento, a titulo oneroso, pelo que, querendo salvaguardar que um bem, ainda que adquirido a título oneroso, não integre o acervo comum deve rodear-se das cautelas necessárias, para demonstrar que, efetivamente, a aquisição foi, por exemplo, feita com capitais próprios seus, devendo também, para efeitos de clarificação futura (se for o caso) consignar tal no ato de aquisição, cumprindo com os requisitos que a lei impõe.

De outro modo, haverá uma presunção de comunicabilidade que importa ilidir se o outro cônjuge se quiser prevalecer dessa presunção, o que, poderá acarretar um esforço acrescido para o cônjuge que quer provar que o bem em causa é bem próprio, esforço acrescido esse que pode até resultar do decurso do tempo, tornando-se mais difícil coligir as provas que demonstram tal.

No sentido de que mais vale prevenir do que remediar, melhor será que, em cada aquisição, se efetivamente, o bem deve ser considerado como bem próprio, não obstante o regime de bens, tal fique, desde logo, explicitado.

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