O novo regime de acolhimento familiar

O novo regime de acolhimento familiar

No âmbito dos processos de promoção e proteção de crianças e jovens em perigo, existem diversas medidas de defesa, destas crianças e jovens, que são aplicadas consoante os casos.

Estas medidas estão elencadas no artigo 35º, nº 1, da Lei de Promoção e Proteção de Crianças e Jovens em Perigo.

Uma dessas medidas é a medida de acolhimento familiar, cujo conceito que se encontra definido no artigo 46º, da mesma Lei e que, até dezembro de 2019, se encontrava regulada no Decreto-lei 142/2015, de 8 de setembro.

Este Decreto-lei, porque se encontrava desatualizado em face das necessidades, seja das crianças acolhidas, seja das famílias que as acolhiam seja, ainda, das famílias de origem, foi revogado pelo Decreto-lei 139/2019, de 16 de setembro que estabelece o regime de execução da medida de acolhimento familiar e que entrou em vigor no dia 1 de dezembro de 2019.

O acolhimento familiar traduz-se na atribuição da confiança da criança ou do jovem a uma pessoa singular ou a uma família, que terão que estar devidamente habilitadas para tal, com vista a proporcionar a estas crianças (ou jovens) a sua integração em meio familiar, sendo-lhes prestados os cuidados adequados às suas concretas necessidades, ao seu bem-estar e à sua educação com vista ao seu desenvolvimento integral.

O acolhimento familiar não se equipara à adoção. O acolhimento familiar tem como pressuposto a previsibilidade da reintegração da criança ou do jovem na sua família de origem ou no seu meio natural de vida, a sua confiança a pessoa idónea ou a familiar que a acolha.

Não sendo viável, no caso concreto, nenhuma das situações referidas, o acolhimento familiar servirá, também, para a preparação da criança ou do jovem para a confiança com vista à sua adoção ou, não sendo possível a adoção, para a sua autonomia de vida.

Sendo o acolhimento familiar uma medida que, a vários níveis, assume um impacto relevante na vida de todos os envolvidos, tornou-se necessária a revisão das normas que a regulamentavam com a introdução de alterações que, há muito, se impunham.

O Decreto-lei 139/2019, de 16 de setembro, incorporou as normas já existentes para o acolhimento familiar (com exceção daquelas que previam a possibilidade de o acolhimento familiar ter natureza não onerosa), nomeadamente, as que consideravam a criança ou jovem membro do agregado familiar ou dependente da pessoa singular ou da família, para efeitos fiscais.

Com a nova regulamentação, a pessoa singular ou um elemento da família de acolhimento, durante a vigência do acolhimento, tem direito a faltas para assistência à criança ou jovem, bem como, a mãe e o pai trabalhadores envolvidos em processo de acolhimento familiar de crianças até 1 ano de idade, passam a ter direito a licença parental, aplicando-se, com as devidas adaptações, o regime previsto no Código do Trabalho.

O novo regime do acolhimento familiar estabelece regras de seleção e formação, prévias à concessão da qualidade de família de acolhimento, determinando o acompanhamento, das pessoas selecionadas para serem famílias de acolhimento, por uma instituição (denominada Instituição de Enquadramento), que as apoiará.

As famílias de acolhimento têm, no âmbito dessa sua função, apoio pecuniário específico, o qual é atribuído por criança ou jovem acolhido, tendo em consideração as características de cada criança ou jovem. Com o novo regime do acolhimento familiar, as famílias de acolhimento passam a ter acesso a prestações sociais de parentalidade e a poder requerer apoios de saúde, de educação e sociais a que a criança ou o jovem acolhido tenha direito.

O Decreto-lei 139/2019, agora em vigor, para além de elencar os direitos e deveres das famílias de acolhimento, também elenca os direitos e deveres das crianças e jovens acolhidos.

Em relação aos direitos da criança ou jovem acolhido, salienta-se que o novo regime, expressamente, menciona o acesso a serviços de saúde, a igualdade de oportunidades e o acesso a experiências familiares e educativas para o exercício da cidadania e qualificação para a vida autónoma, dando-se particular relevância à estabilidade, ao fixar o direito de permanência na mesma família de acolhimento durante o período de execução da medida, mantendo contudo a possibilidade de vinculo à família de origem, determinado que, na colocação em família de acolhimento deverá, sempre que possível, fazer-se a escolha de uma família próxima do contexto familiar e social de origem da criança ou jovem.

Todas estas alterações visam proteger as crianças e jovens que, por estarem em situação de risco, estão mais vulneráveis e que, por isso, têm os seus direitos comprometidos os quais se procuram acautelar apresentando-se, o acolhimento familiar, como uma alternativa de proteção de excelência que permite a desinstitucionalização de muitas crianças, em situação de perigo, o que as protege, também, afetivamente.

A possibilidade de ser família de acolhimento é uma possibilidade real que deve, sempre que possível, ser abraçada com consciência sendo importante a divulgação de tal possibilidade, permitindo que cada vez mais famílias se tornem famílias de acolhimento, dando a possibilidade a mais crianças de, em situações de perigo, terem uma vivência familiar segura e estável.

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Podem os avós, guardiões de facto, pedir a regulação das responsabilidades parentais dos netos?

Podem os avós, guardiões de facto, pedir a regulação das responsabilidades parentais dos netos?

 

De acordo com o acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, em 6 de dezembro de 2016, assiste legitimidade aos avós, para requererem a regulação das responsabilidades parentais relativamente aos netos quando, em termos práticos, estes estão a seu cargo.

De acordo com o n.º 1, do artigo 17º, do Regime Geral do Processo Tutelar Cível (adiante designado RGPTC), a iniciativa processual no âmbito das providências tutelares cíveis (nas quais se inclui a regulação das responsabilidades parentais), cabe ao «Ministério Público, à criança com idade superior a 12 anos, aos ascendentes, aos irmãos e ao representante legal da criança.»

Na interpretação feita no acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de que, aos avós, deve ser reconhecida legitimidade para a iniciativa processual, nos termos do artigo 17º, nº 1, do RGPTC relevou, entre outros, o facto de os processos tutelares cíveis se regerem pelos princípios orientadores de intervenção que constam na Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo, na qual se reconhece a importância dos guardiões de facto.

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Com efeito, as pessoas que se apresentam como uma referência afetiva dos menores, como sejam os seus avós, têm intervenção considerável nos processos de promoção e proteção razão porque quando, na vida real, exercem as responsabilidades parentais desses menores, enquanto seus guardiões de facto, não poderá deixar de se lhes garantir a possibilidade de requererem a regulação das responsabilidades parentais.

A importância reconhecida aos avós tem, também, expressão na possibilidade de participação destes na conferência de pais que, por exemplo, tem lugar no processo de regulação das responsabilidades parentais, conforme resulta do n.º 2, do artigo 35º do RGPTC que se transcreve: «2 – O juiz pode também determinar que estejam presentes os avós ou outros familiares e pessoas de especial referência afetiva para a criança

É também relevante a previsão do nº 1, do artigo 58º, do RGPTC, quando expressa que: «… qualquer familiar da criança ou pessoa a cuja guarda esteja confiada, ainda que de facto, podem requerer as providencias previstas no nº 2 do artigo 1920º do Código Civil, ou outras que se mostrem necessárias, quando a má administração de qualquer dos pais ponha em risco o património do filho e não seja caso de inibição do exercício das responsabilidades parentais

Ou seja, nos termos deste artigo 58º, nº 1, os guardiões de facto dos menores, têm legitimidade para intervirem processualmente quanto a questões patrimoniais destes, razão porque, no acórdão supra referido, se enfatiza que: «por maioria de razão, aos mesmos há-de assistir o direito de iniciativa processual para requererem a regulação das suas responsabilidades parentais

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Na interpretação do artigo 17º, nº 1, do RGPTC haverá, também, que tomar em conta a previsão do artigo 43º, nº 3, do mesmo diploma que, no que respeita à regulação do exercício das responsabilidades parentais de filhos de cônjuges separados de facto, de progenitores não unidos pelo matrimónio e de crianças apadrinhadas civilmente, quando os padrinhos cessem a vida em comum, contempla os referidos guardiões de facto.

De tudo, resulta que, na interpretação do artigo 17º do RGPTC, deverá ter-se presente a relevância legal conferida aos avós, nomeadamente, na previsão do referido artigo 43º, nº 3, do mesmo diploma que contempla os guardiões de facto, nomeadamente, os avós, razão porque, no acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, se entendeu que uma avó é parte legitima para requerer a regulação das responsabilidades parentais das suas netas, que estavam ao seu cuidado e cujos pais nunca foram casados, nem nunca fizeram vida em comum.

Em síntese, poderão requerer a regulação das responsabilidades parentais de menores, os seus guardiões de facto, quer sejam os avós - como no caso do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 6 de dezembro de 2016 – quer sejam outras pessoas como, por exemplo, madrastas e padrastos sendo que, o que é relevante é a existência de uma guarda de facto por parte de quem requer a regulação das responsabilidades parentais em relação aos menores existindo, por isso, uma relação afetiva relevante.