O inventário por divórcio e o património comum

Conforme decorre do artigo 1688.º do Código Civil, as relações pessoais e patrimoniais entre os cônjuges cessam pela dissolução do casamento, sendo que não obstante os efeitos do divórcio se produzirem a partir do trânsito em julgado da sentença que o decreta, a verdade é que, conforme decorre do artigo 1789.º do Código Civil, os referidos efeitos patrimoniais retrotraem-se à data da proposição da ação de divórcio.

Para efeitos de partilha por divórcio, tal equivale a dizer que o património comum dos ex-cônjuges (anteriormente casados em regime de comunhão) corresponde àquele que existia na data em que foi proposta a ação de divórcio.

Assim sendo, apenas os bens que compõem o património comum do ex-casal à data da propositura da ação é que relevam para efeitos de partilha. Por exemplo, apenas relevará, para efeitos de partilha, o saldo da conta bancária à data da propositura da ação de divórcio, significando tal que, quer os movimentos anteriores, quer os movimentos posteriores a essa data não assumem relevância para efeitos da partilha a realizar.
Assim, se um dos ex-cônjuges tiver levantado dinheiro de uma conta bancária comum antes da data de propositura da ação de divórcio, tal montante não poderá ser levado à partilha do acervo comum, pois o levantamento de um montante nestes moldes integra um ato de administração ordinária relativamente aos bens comuns do casal conforme resulta do n.º 3 do artigo 1678.º do Código Civil.

Nos termos do disposto no artigo 1681.º n.º 1 do Código Civil, o cônjuge que administra bens comuns está isento de prestar contas da administração que faz sendo que terá que responder pelos «atos intencionalmente praticados em prejuízo do casal ou do outro cônjuge» conforme resulta do artigo 1681.º n.º 1 do Código Civil, mas tal matéria nada tem que ver com a partilha por divórcio, a qual, conforme supra referido, abrange apenas os bens que compõem o acervo comum à data da propositura da ação de divórcio.

 

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Insolvência de ex-cônjuge e existência de património comum

Insolvência de ex-cônjuge e existência de património comum

Por vezes acontece que, por razões várias, um casal, após o decretamento do seu divórcio, opta por manter o património em comum, não procedendo, no imediato, à partilha do mesmo.

Assim, muitas vezes, verificam-se situações em que, ex-cônjuges, continuam a ter um ativo (e, por vezes, um passivo) em comum.

Se é certo que, na maioria das vezes em que tal opção resulta de um acordo entre ambos a situação é pacífica, não levando a conflitos nem a problemas, a verdade é que, mesmo nestas situações, existem circunstâncias que não dependem da vontade das partes e que, por vezes, trazem situações de complexa resolução.

É, por exemplo o problema que se coloca quando, tendo os ex-cônjuges um património comum, um deles é declarado insolvente e, para a massa insolvente, são apreendidos bens que integram o património conjunto do ex-casal.

O que acontece nestas situações?

Foi, sobre uma questão como esta, que se debruçou o acórdão de 22 de Setembro de 2020, do Tribunal da Relação de Lisboa, no qual foi chamado a decidir sobre uma questão decorrente da inclusão, como receita, num processo de insolvência, da totalidade do produto do venda de bens imóveis que, por não terem sido objeto de partilha, integravam o património comum do insolvente e seu ex-cônjuge.

Com efeito, no processo em causa, aquando da apreensão de bens do insolvente, apenas havia sido apreendido o direito que este tinha, na meação dos bens em causa. Assim, consequentemente, apenas poderia ser considerado, como fazendo parte da massa insolvente, metade do produto da venda dos bens.

No caso dos autos, não se discutia se a apreensão da meação estava, ou não, correta pois, a verdade é que a mesma havia sido efetuada sem que a sua validade tivesse sido questionada.

O que se passou, na situação analisada pelo referido acórdão foi que a apreensão da meação foi efetuada, a existência da declaração de insolvência foi registada na Conservatória do Registo Predial competente, em relação à meação do insolvente e, na sequência do desenvolvimento do processo, o Administrador da Insolvência (enquanto representante do insolvente) procedeu à venda da totalidade do bem imóvel o que fez, em conjunto com o ex-cônjuge daquele.

Assim, o Tribunal da Relação de Lisboa, entendeu que, efetivamente, apenas metade do produto dão venda poderia ser considerado como receita no âmbito do processo de insolvência.

Contudo, a realidade da situação, levou a que o ex-cônjuge do insolvente, por não ter invocado a nulidade da apreensão da meação, requerendo a apreensão da totalidade do bem e a sua citação para requerer a separação de meações, saísse prejudicado.

Com efeito, o bem cuja meação havia sido apreendida e que foi vendido, era garantia de uma divida comum do ex-casal e, porque não foi pedida a separação de meações, aquando da escritura o adquirente do bem (no caso o credor hipotecário que, no âmbito do processo, requereu a sua adjudicação), efetuou, como pagamento, o depósito de 20% do preço de aquisição tendo ficado dispensado do pagamento do remanescente do preço em resultado da referida qualidade de credor hipotecário.

Ou seja, na prática, o ex-cônjuge do insolvente acabou por não receber 50% do valor de venda do imóvel.

A questão está diretamente relacionada com a questão de saber o que deve ser apreendido, numa situação em que o insolvente tem património por partilhar.

Em alternativa à apreensão da meação, poderia ter sido efetuada a apreensão da totalidade dos bens e, após, proceder-se à citação do ex-cônjuge para que este, no processo de insolvência, viesse requerer a separação da meação.

Esta segunda solução, permitiria a venda da totalidade dos bens e o cumprimento de todos os demais trâmites legais, nomeadamente, se fosse o caso, o cancelamento de ónus que, sobre o bem em causa, impendiam, obrigando ao pagamento do credor hipotecário (que assim não se poderia fazer valer dessa qualidade e depositar apenas 20% do valor) e permitindo ao ex-cônjuge do insolvente salvaguardar a sua posição, não saindo prejudicado.

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Dívidas da responsabilidade de apenas um dos cônjuges e património comum

Dívidas da responsabilidade de apenas um dos cônjuges e património comum

É frequente existirem situações em que, tendo havido incumprimento de alguma obrigação, a cargo de um dos cônjuges, o casal – que tenha bens comuns – se veja confrontado com a possibilidade de esses bens serem executados pelo credor e que, perante tal possibilidade, optem por, numa tentativa de salvaguardar o património, praticar atos com vista a evitar que o credor possa executar esses bens para se ressarcir do seu crédito.

Uma situação muito comum é a de ser feita, a um terceiro, uma doação.

Nestas situações, o casal acredita que, com a doação, resolveu o seu problema não podendo mais o credor vir propor uma ação que execute esse bem doado, por o mesmo já se encontrar na esfera jurídica de um terceiro que nada tem que ver com a situação de incumprimento existente.

Sucede que, nesta situação, o credor pode lançar mão de uma ação de impugnação pauliana que, a ser julgada procedente, permite ao credor executar, na esfera jurídica do terceiro, o bem doado como se este nunca tivesse saído do património do devedor, podendo executá-lo na medida necessária à satisfação do seu crédito.

Esta opção de tentar salvaguardar o património comum através da transmissão da titularidade dos bens para o património de um terceiro acaba por não ser a melhor solução, na medida em que, nesta situação, deixa de ser possível a invocação da norma do artigo 1696.º, nº 1, do Código Civil, a qual estabelece que pelas dívidas que sejam da exclusiva responsabilidade de um dos cônjuges respondem, em primeiro lugar, os bens próprios desse cônjuge e, subsidiariamente, responde a sua meação nos bens comuns do casal.

Com efeito, com a transmissão de bens comuns para o património de terceiros, deixa de ser poder falar em património comum do casal, pelo que fica afastada a possibilidade de se pedir a citação do cônjuge não devedor, para requerer a separação de meações (artigo 740.º do Código de Processo Civil).

Em suma: a transmissão de bens, nos termos supra referidos, terá como consequência a ampliação da garantia patrimonial do credor, na medida em que a ação de impugnação pauliana, intentada por este, permite atingir os bens comuns, na sua totalidade, na esfera jurídica dos terceiros transmissários. Diferentemente, se o bem integrasse o património comum do casal, este só subsidiariamente, responderia pela dívida do cônjuge devedor e apenas quanto à meação deste no bem em causa.

 

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