Os deveres dos filhos em relação aos Pais

Os deveres dos filhos em relação aos Pais 

Em termos gerais, ninguém nega que a família e, especialmente os filhos, têm a obrigação de assegurar aos pais idosos uma vida digna, com cuidados de saúde atempados e adequados, alimentação equilibrada e saudável, afeto, proteção, tempos de convívio e de lazer com a família e, acima de tudo, garantir que os idosos são tratados até ao final das suas vidas, de forma digna e com respeito integral pela sua vontade.

Esta consicência social é bem mais do que isso, pois se percorrermos o Código Civil, encontramos várias normas que nos indicam um conjunto de deveres dos filhos em relação aos pais.

No Código Civil encontramos a norma do artigo 1874.º que prevê que, pais e filhos devem-se mutuamente auxílio, daqui emergindo o dever de cooperação que impende sobre os filhos em relação aos pais.

Mais, os deveres dos filhos para com os pais não se esgotam no cumprimento do dever de cooperação, nos termos referidos.

Com efeito, os filhos têm para com os pais um dever de auxílio estando, por isso, obrigados a ajudá-los (material e moralmente), a socorrê-los e a protegê-los, seja quanto à sua pessoa, seja quanto ao seu património.

A cargo dos filhos encontra-se também o dever de assistência para com os pais, dever este que encontramos também ínsito no mencionado artigo 1874.º do Código Civil, que prevê que, pais e filhos devem-se mutuamente assistência.

O n.º 2 deste artigo expressa que o dever de assistência abrange a obrigação de prestar alimentos e de contribuir, de acordo com os próprios recursos, para os encargos da vida familiar.

E, neste dever de assistência, não pode deixar de estar incluída a obrigação dos filhos de, se for o caso, levar os pais para sua casa e com eles coabitarem, dando-lhes assim o conforto e apoio que qualquer pai idoso doente ou mais fragilizado necessita, merece e tem direito.

No que ao dever de prestar alimentos respeita, evidentemente que se trata de um dever accionável nas situações de necessidade e tem que haver, da parte dos descendentes, a possibilidade de prestar esses alimentos aos pais carenciados dos mesmos.

Enfatiza-se, aqui que o artigo 2010.º do Código Civil prevê que, na hipótese de pluralidade de vinculados integrados no mesmo grau da escala de prioridades fixada no artigo 2009.º, n.º 1 do mesmo Código, cada um deles responderá por uma quota da prestação total.

Mais, a recusa de prestação de alimentos dos filhos em relação aos pais permite que estes possam deserdar o herdeiro legitimário, conforme resulta da alínea c) do nº 1 do art. 2166.º do Código Civil.

Explicar que estes deveres existem e que devem ser cumpridos é um dever social, pois os pais, na sua velhice, têm direito a serem cuidados, amparados, acarinhados e auxiliados pelos filhos.

As soluções fáceis, como seja as de colocar pais em lares (contra a sua vontade) deve ser sempre a última das opções, devendo os recursos económicos que são canalizados para o pagamento dessas instituições serem afetos à criação de condições, em casa dos idosos ou em casa dos filhos, para que os pais continuem a viver num ambiente familiar, junto das pessoas que amam e com quem se sentem felizes.

Mais, nada obsta a que seja acionado o instituto da responsabilidade civil, com a correspondente obrigação de indemnização, a quem viole os deveres a que se encontra adstrito, desde que cumpridos os critérios de acionamento da responsabilidade civil.

Não cuidar dos pais, não lhes prestando assistência, não cumprindo com o dever de cooperação que impende sobre os filhos, recusando o cumprimento da obrigação de alimentos, corresponde a um ilícito civil, por omissão, que viola direitos juridicamente tutelados, tendo os pais o direito de exigir uma indemnização aos filhos pelos danos causados, acrescendo sempre que a falta de cuidado dos filhos em relação aos pais corresponde a um abandono afetivo, pelo que este ato ilícito corresponde a um dano não patrimonial indemnizável.

Cuidar dos pais, cumprindo os filhos os deveres que estão a seu cargo é um assunto muito sério, cujo incumprimento tem consequências legais, pelo que não podem os filhos, por facilidade, por comodidade, por ausência de espírito de sacrifício descartarem-se dos pais, colocando-os em instituições, onde estes não querem estar e visitando-os de vez em quando.

Para além do plano jurídico, existe o plano moral: Pais são Pais, e a eles devem os filhos amor, respeito, carinho, espírito de sacrifício e devem, ainda, os filhos ter capacidade para os entender, para deles cuidar e para os ajudar, tal como eles próprios fizeram com os filhos.

Os filhos devem tudo aos Pais pelo que, quando os Pais precisam, os filhos tudo devem aos filhos.

E, ninguém venha dizer que já tem a sua casa, os seus filhos, o seu trabalho e que não têm tempo nem condições para cuidar dos Pais. As pessoas fazem o que querem e, quando querem, conseguem. Este é o plano moral e afetivo do cuidado dos filhos para com os Pais.

Por isso, o legislador deu relevância legal aos deveres dos filhos para com os Pais.

Não há nenhuma razão que justifique um abandono afetivo dos filhos em relação aos Pais, nada justifica a falta de afeto, a falta de cuidado amoroso, a falta de amparo, especialmente em situações em que os Pais, pela idade avançada e /ou pela doença, mais precisam de amparo e de amor.

Os Pais serão sempre Pais e os filhos serão sempre filhos, com tudo o que isso acarreta. Somos todos mais felizes, se não formos egoistas e individualistas e se soubermos honrar os nossos Pais.

 

 

 

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O estatuto do maior acompanhado: as inovações legislativas

O estatuto do maior acompanhado: as inovações legislativas 

O estatuto do maior acompanhado: as inovações legislativas

Em 10 de fevereiro de 2019, entrou em vigor o regime jurídico do maior acompanhado, o qual veio substituir os antigos regimes da interdição e da inabilitação, os quais se mostravam desadequados à realidade atual, seja em face da considerável elevação da esperança de vida das pessoas, seja em face, por exemplo, do acréscimo da existência de patologias limitativas e de diagnósticos e prognósticos médicos mais avançados. Claro que não se poderá também esquecer que existe uma quebra da natalidade e, consequentemente, um envelhecimento da população. Mais, os tempos atuais apontam para uma menor agregação do núcleo familiar, com a consequente exposição das situações de maior fragilidade das pessoas.

Tudo isto levou a que o legislador, seguindo as preocupações internacionais, nomeadamente as vertidas na Convenção de Nova Iorque sobre os direitos das pessoas com deficiência, adotada pelas Nações Unidas em 30 de março de 2007 e aprovada pela Assembleia da República em 7 de maio de 2009 que, no seu artigo 1.º estabelece como objetivo da mesma, a promoção, proteção e garantia do «pleno e igual gozo de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais, de todas as pessoas com deficiência», bem como a promoção do respeito pela sua dignidade inerente, tenha tido necessidade de alterar e atualizar a forma de tratamento legal das situações de incapacidade que carecem de proteção.

Os anteriores regimes, agora revogados, da interdição e da inabilitação, por serem muito rígidos, eram desadequados à prossecução do objetivo de inclusão e adequação das medidas de proteção às necessidades específicas, por exemplo, dos idosos e das pessoas portadoras de deficiência.

Agora, com o novo regime, o legislador deu primazia à autonomia da pessoa, optando por um modelo de acompanhamento, em vez do anterior modelo de substituição da pessoa carecida de proteção, ou seja, o regime do maior acompanhado limita-se à determinação das medidas estritamente necessárias para assegurar o bem-estar, a recuperação e o pleno exercício das capacidades do acompanhado respeitando, sempre que possível, a sua vontade e a sua capacidade de autodeterminação.

Uma inovação relevante prende-se com a possibilidade de se desdobrar as várias necessidades do acompanhado, podendo haver mais do que um acompanhante, permitindo-se assim, por exemplo, que haja um acompanhante para questões pessoais e um acompanhante para questões patrimoniais, o que resulta num benefício global para o maior acompanhado na medida em que, por exemplo, em questões patrimoniais, poderá ter um acompanhante que, embora pessoalmente mais distanciado de si, possui as necessárias competências técnicas para um acompanhamento mais eficaz neste campo.

Importa, também, salientar que a nova lei não exige a habitualidade, a permanência e a durabilidade da situação que determina o acompanhamento, pelo que, com o novo regime, ficam acauteladas situações (que não podem ser resolvidas através do recurso aos deveres gerais de cooperação e assistência previstos na lei) em que uma pessoa se encontra temporariamente incapacitada para, na prática, exercer os seus direitos e cumprir os seus deveres, mas que está perfeitamente capaz de orientar a forma como quer que os mesmos sejam exercidos e/ou cumpridos.

Abona, ainda, a nova lei o alargamento, em face dos anteriores regimes da interdição e inabilitação, das razões de saúde que podem determinar a necessidade de acompanhamento, ou seja, podem existir patologias de ordem física que determinem a necessidade de acompanhamento, eliminando-se a ideia de que apenas a anomalia psíquica determinava esta necessidade.

Tomando em conta que, nos dias de hoje, é residual a necessidade de acompanhamento de pessoas portadoras de cegueira ou de surdez-mudez, pois sendo indiscutível que tal se traduz numa patologia de ordem física, é também indiscutível que tal não se traduz, necessariamente, numa situação que limite ou que interfira na capacidade de exercício de direitos ou de cumprimento de deveres, regista-se aqui uma inovação na medida em que é fundamental, de acordo com o novo quadro legal, que a deficiência em causa limite, de facto, as capacidades cognitivas e, consequentemente, as capacidades volitivas da pessoa.

As inovações legislativas consagradas levam a concluir que o novo modelo de proteção às pessoas necessitadas de acompanhamento tentam ir ao encontro das especificas e concretas necessidades de cada pessoa, deixando de existir um quadro fixo do que pode ser decretado, passando a existir a possibilidade de “misturar” vários regimes protetivos que, em conjunto, sejam aqueles que melhor se adequam à proteção do bem-estar e recuperação do acompanhado.

Por fim, importa sumarizar o quadro legislativo, em termos práticos: poderão beneficiar da aplicação da figura do maior acompanhado, as pessoas com mais de 18 anos que, seja por motivos de saúde, de deficiência ou em resultado do seu comportamento, estejam impossibilitadas de exercer, de forma plena, pessoal e consciente, os seus direitos ou que, de igual modo, não se mostrem capazes de cumprir os seus deveres

Conforme referido, o acompanhamento deverá limitar-se ao necessário para cada caso concreto sendo que, independentemente do que haja sido pedido, o Tribunal pode, nos termos do artigo 145º do Código Civil e, sempre em função do caso concreto, cometer ao acompanhante algum ou alguns dos regimes seguintes:

«a) Exercício das responsabilidades parentais ou dos meios de as suprir, conforme as circunstâncias;

  1. b) Representação geral ou representação especial com indicação expressa, neste caso, das categorias de atos para que seja necessária;
  2. c) Administração total ou parcial de bens;
  3. d) Autorização prévia para a prática de determinados atos ou categorias de atos;
  4. e) Intervenções de outro tipo, devidamente explicitadas

Assim, na sentença a ser proferida, a mesma deverá fixar o regime relativo ao exercício de direitos pessoais e celebração de negócios da vida corrente, pois, no silêncio da sentença, o acompanhado poderá livremente, por exemplo, casar, procriar, perfilhar, adotar, testar, viajar, etc.

A sentença que determinar o acompanhamento deverá ser revista, pelo menos, de 5 em 5 anos, se outro prazo não constar da mesma. Tal não impede que a sentença possa ser revista a todo o tempo, caso se modifiquem as circunstâncias que justificaram a aplicação da medida de acompanhamento.

Concluímos dizendo que o atual regime do acompanhamento permite adequar as restrições do maior a acompanhar às suas efetivas necessidades mantendo intocados seus direitos e deveres que não carecem de acompanhamento, o que é uma inegável vantagem em face do anterior regime do qual resultava que, independentemente das nuances da situação concreta, o incapaz não poderia, por si, livremente, exercer os seus direitos ou cumprir os seus deveres enquanto a situação que determinava a necessidade se mantivesse sendo obrigatoriamente substituído por um terceiro que, em seu nome e no seu interesse, agia.

 

 

 

 

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