«Obrigado, Mãe» ... «Obrigada, filhos»

«Obrigado, Mãe» - abraçou-me o meu filho mais novo, o único ainda em casa, com a notícia da reviravolta profissional, muito além das suas melhores expetativas. E continuou o abraço, reconhecido por eu «nunca ter desistido dele, durante os seus difíceis anos de questões e indecisões. Pela firmeza da minha presença. Por acreditar nele. Pela minha paciência», insistiu.

Senti que podia morrer feliz! Como se estas suas palavras selassem uma missão de vida cumprida. Nunca contaria escutá-las. Nenhuma mãe conta. Apenas faz por ser mãe. E disse-lho. Ao que ele acrescentou que também o mano, apesar de «de poucas falas e mais distante», agradecia com a primeira neta a caminho. E que com o tempo, também as manas sentiriam «gratidão, pela dureza que eu enfrentei». Ou eu «já esquecera o toque à campainha de casa em código?» - que durante anos nos defendeu de abrir a solicitadores de execução, por conta das peripécias financeiras, a que o pai se tinha evadido para bem longe.

Sinceramente, já não lembrava. Como se tivesse sido noutra vida… uma outra vida em que até o salário me era penhorado. Lembrei a épica viagem que precedeu essa dureza de que ele falava. O meu regresso com eles pequenos, de volta a Portugal, e em que somos retirados da fila de embarque para procurarem possíveis “pedras” (vulgo diamantes) traficados na minha bagagem. Quiçá, denunciados por quem antes me danificara o telemóvel, impedindo-me de contactar ou ser contactada. Libertaram-nos a tempo de corrermos (a pé - já sem autocarro) pela própria pista do aeroporto, a longa distância até ao avião. Lembro bem os seus passinhos apressados a ecoarem no asfalto negro daquela noite. A aflição ao subirmos ofegantes, os degraus altos para a entrada do avião, que fechou a porta em seguida. Já a salvo, dentro do avião, deparamo-nos com todos os nossos lugares separados e distantes. Contrariada, a hospedeira lá conseguiu trocas que juntaram os meus filhos dois a dois, permitindo que ao menos, se acompanhassem mutuamente, por entre as minhas visitas aos seus lugares. Só de manhã, quando escuto a ordem de apertar os cintos para a aterragem, é que me apercebo do perigo de eles seguirem as ordens, saindo cada dois pelo seu corredor distinto, em momentos e autocarros diferentes, para a escala em Heathrow!! Nunca mais os veria!! Desobedeci à ordem do cinto, enfrentando uma vez mais a arrogância daquelas hospedeiras, enquanto percorria as enormes distâncias dos corredores daquele jumbo, a avisar os meus filhos para que permanecessem quietos nos lugares e nada fizessem, até que eu os fosse finalmente buscar, após todos os passageiros saírem.

Já em terra, os gravíssimos atentados na antevéspera em Londres, naquele julho de 2005, ditavam medidas de segurança excecionais que atrasaram em muitas horas o embarque para Lisboa. E eu, sem telemóvel com que pudesse avisar as minhas irmãs à minha espera.

As tribulações desta viagem apenas preconizavam a montanha-russa de acontecimentos que se sucederiam - próprios de muitos divórcios – e de que o código da campainha seria apenas um sinal. A tal dureza de que falava o meu filho. E que naquela época, eu acreditava que combateria pela espada da razão e da justiça. Como se às crianças aproveitasse razão ou justiça alguma? Pelo fio dessa mesma espada acabei por ferir os meus filhos.

Tanto que eu quisera demarcar-me do ressentimento e mágoa que guardava da minha mãe, e acabei gerando ressentimentos e mágoas outras nos meus filhos. Apesar de cheia de razão. Apesar de me desdobrar em consultas de rotina no pediatra, vacinas, dentista, fardas e lancheiras, sacos de ginástica e de natação. Apesar do meu horário de trabalho de feição com levá-los às atividades, festas de anos, espetáculos e museus…

Retomando a viagem de regresso a Portugal com eles, e sem conseguir prevenir as minhas irmãs do enorme atraso do voo: só quando elas me abraçaram em lágrimas, à chegada, é que eu percebi a dimensão da gravidade do que eu tinha deixado para trás - mais fácil de perceber por quem está de fora. A agonia em que a demora do voo as tinha deixado. Não era vão o seu receio de que eu não tivesse conseguido, afinal, regressar. Os episódios do telemóvel danificado e da denúncia dos diamantes (entre outros…) confirmavam-nas. No final daquele verão - distribuído por casas de férias de avós e tias - instalámo-nos numa casa, antigo projeto de família, cujas obras há muito tinham sido deixadas a meio.

Preparámo-nos para enfrentar o ano letivo e o inverno, nesta casa inacabada e com despojos de móveis de outras vidas. Era preciso arranjar roupas para todos. Na bagagem, apenas tínhamos trazido T-shirts, toalhas de praia e fatos de banho, para despistar a suspeita do regresso definitivo. Para trás tinham ficado, para nunca mais, lençóis e bordados, louças e cristais, espelhos e móveis, legados desde as bisavós. Eletrodomésticos. O piano. Molduras com as fotografias de uma vida. Um lar construído com tanto gosto, ao longo dos anos.

Bem aplicada pelo meu filho, a expressão dureza, a este recomeço, partindo de tábua rasa.

Mas voltando ao seu abraço e às suas palavras reconhecidas, devolvi-lhe que estas falavam mais de si e do seu coração do que das minhas qualidades de mãe. Assim como o ressentimento das irmãs falava mais do seu modo de olhar do que das minhas falhas. Qualidades e falhas são condição de todos. E cada um de nós, depois, vê aquilo que consegue ver. Tal como eu vejo as falhas que foram as da minha mãe.

E o que é que isso diz de mim? – que devo aprender com o coração e o olhar reconhecido deste meu filho. Olhar e acolher a imensa generosidade da vida. A maravilha de ser mãe de filhos criados. A sua valentia, por entre a tal dureza, que já nem o toque da campainha lembra. Esse toque – que mantemos – significa agora, que toca à porta um de nós. Daqui por um tempo, com a neta ao colo de uma nora tão querida. Como tão querida eu fui, aos olhos da minha sogra – mãe de tantos e avó de tantos mais. Assim, me aguarda a vida.

 Missão longe de estar cumprida. «Obrigada, filhos».

Carmo da Cruz, Mãe

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A Mãe é a minha melhor amiga!

Na sociedade dos dias de hoje importa refletir sobre o papel de mãe, um papel que não se
prende com a biologia, mas mais com a relação estabelecida ao longo dos anos na díade
mãe-filho(a).
Ser Mãe é amar, cuidar e educar, colocar limites, dar estrutura, dizer não, ser “chata”. Ser
Mãe pode passar por ser a melhor amiga dos filho(a)s, é estar ao lado dele(a)s e
acompanhar nas loucuras, é ser a confidente e a pessoa das aventuras.
Mas se ser mãe é tudo isto, porque é que tantas vezes não chega? não funciona?
Os filho(a)s precisam de uma Mãe para estabelecer uma relação segura, com um vínculo
afetivo forte, numa dinâmica equilibrada, com regras, limites, previsibilidade, diálogo,
partilha e muito amor.
Mas se tudo isto parece óbvio, na prática, os limites da relação e a confusão dos papeis nas
relações leva a que muitas vezes os filhos vão deixando de conseguir ver a Mãe como
pessoa de referência e de autoridade, acabando por lidar com ela como se fossem iguais,
como se de um par se tratasse. É neste cinzento relacional, que por vezes as mães falam
com os filhos como se fossem amigos, partilhando mais do que devem, envolvendo de
formas que não são aconselháveis, que levam a que os miúdos acabem por viver as vidas
das mães como se de amigos se tratassem.
Se há primeira vista nada disto importa, pois mãe e filho(a) se tornam suporte mútuo, nas
etapas críticas de desenvolvimento relacional, como a adolescência, isto pode-se traduzir
em comportamentos de risco precoce, em sofrimentos emocionais intensos, em falta de
raízes e segurança para um crescer em autonomia equilibrado e estruturado.
Ser Mãe e Ser Filho(a) é algo único, que se cria numa relação especial, diferente de todas
as outras, diferente consoante as características de cada um do(a)s filho(a)s, que tem de
ser visto como algo em mudança, flexível mas sólido, afetuoso mas estruturado, de
confiança mas com limites.
Perceber que se pode falar sobre tudo com a mãe, mas que a forma como se fala é
importante, e a resposta que é tida não é igual à de um(a) amigo(a), é a segurança que a
criança / adolescente precisa para sentir que está no caminho certo, para perceber que
pode tomar decisões e que terá sempre alguém ao seu lado que a irá apoiar, que pode cair
que conseguirá sempre se levantar!
O(a)s filho(a)s crescem e rapidamente parecem chegar à fase em que “sabem” tudo,
“decidem” tudo, e “querem” tudo à sua maneira. Mas ser mãe é aprender todos os dias,
como lidar com cada etapa, como parar e pensar diferente em cada desafio, como escutar e
acolher em cada vulnerabilidade, como reforçar e congratular em cada conquista. Aos filhos
cabe o papel de desafiar, à mãe cabe o papel de orientar e estar sempre lá!
Feliz Dia das Mães!


Carla Dias da Costa
Psicóloga Especialista em Psicologia Clínica e da Saúde
Psicóloga Especialista em Psicologia da Educação
Psicóloga com Especialidade Avançada em Psicoterapia e Neuropsicologia

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Consequências da violação grave dos deveres dos pais em relação aos filhos

De acordo com o disposto no artigo 1878.º, nº 1, do Código Civil: «compete aos pais, no interesse dos filhos, velar pela segurança e saúde destes, prover ao seu sustento, dirigir a sua educação, representá-los, ainda que nascituros, e administrar os seus bens».

No quadro deste papel protetivo dos pais, cumpre-lhes zelar pelo desenvolvimento dos filhos, proporcionando-lhes educação, instrução, segurança, saúde, afeto, etc, conforme resulta dos normativos dos artigos 1878º e 1885º, nº 1 do Código Civil.

Quando existe uma violação culposa e grave dos deveres dos pais, em relação aos filhos, estes podem vir a ser separados daqueles, conforme resulta do artigo 36º, nº 6 da Constituição da República Portuguesa, o que opera por meio de restrições ao exercício das responsabilidades parentais, decretadas por decisão judicial (artigos 1915º e 1918º do Código Civil).

Estas restrições podem traduzir-se numa limitação do exercício das responsabilidades parentais ou, em situações extremas, na inibição desse exercício.

Sendo a inibição do exercício das responsabilidades parentais uma medida extrema, que leva à privação desse mesmo exercício, esta só pode ser decretada após ficar provada a violação culposa dos deveres dos pais para com os filhos e que, dessa violação, resultem graves prejuízos para estes.

Com efeito, mesmo estando demonstrada a existência de uma violação culposa, da qual tenha resultado um grave prejuízo para os filhos poderá, a situação concreta, não aconselhar a determinação da inibição do exercício das responsabilidades parentais, na medida em que existem outras formas, menos gravosas de proteger os menores, não impedindo totalmente o exercício das responsabilidades parentais, pelos progenitores.

Poderá, por exemplo, esse exercício, em vez de ser inibido, ser limitado, ou seja, os progenitores, quanto a determinadas questões – em relação às quais esteja demonstrado que as condutas que adotam são causadoras de graves prejuízos para os filhos e que, na adoção de tais condutas, agiram com culpa -, verão o exercício das mesmas impedido mas, quanto a outras questões relativas ao exercício das responsabilidades parentais, em relação às quais adotam conduta diferente, manterão o exercício das mesmas.

Na valoração a ser feita pelo tribunal, importa ter em conta que o decretamento de uma inibição do exercício das responsabilidades parentais pode pôr em causa a manutenção do vínculo afetivo entre o progenitor e o filho e, como consequência, causar um prejuízo maior a quem se quer proteger, até porque uma criança é gravemente afetada, do ponto de vista emocional, ao confrontar-se com uma figura parental que está inibida de o ser.

Assim, apenas em casos muito graves de abandono, crueldade, maus tratos que consubstanciem um grave prejuízo para a criança, em situações em que não se perspetive uma possibilidade de reversão do comportamento do progenitor, é que fará sentido decretar a inibição das responsabilidades parentais.

Por exemplo, poderão existir situações em que, aparentemente, se poderia decretar uma inibição do exercício das responsabilidades parentais mas que, considerando o concreto interesse da criança e a possibilidade de proteger a mesma, através do recurso a outras medidas, se mantenha o exercício das responsabilidades parentais, pelo progenitor em causa, limitando-se contudo o exercício das mesmas, por forma a, salvaguardando a segurança da criança, manter o mais intocado possível o laço afetivo.

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Quem é herdeiro de quem?

De acordo com a lei portuguesa existem pessoas que, pela relação família que têm com o falecido, não podem ser afastados da sucessão, sendo, obrigatoriamente, herdeiros.

Estas pessoas são, na terminologia da lei, herdeiros legitimários e são o cônjuge, os descendentes e os ascendentes.

Aos herdeiros legitimários está destinada uma parte da herança (chamada legítima) que não pode ser reduzida, nem sequer por vontade do autor da herança.

Atualmente a lei permite que os cônjuges não sejam herdeiros, entre si, desde que desde que, ao casar, o façam no regime da separação de bens e que, simultaneamente, renunciem à qualidade de herdeiros.

Fora desta situação, os herdeiros legitimários, apenas não terão direito à herança em situações muito especificas de deserdação ou indignidade que terão que ser declaradas pelo tribunal em processos específicos para o efeito.

A legitima é calculada tendo em consideração diversos fatores como seja o valor dos bens que compõem o património do falecido (à data da morte), o valor dos bens que este - em vida - doou, as despesas que estejam sujeitas a colação (restituição à herança, para efeitos de igualação na partilha) e, claro, as dívidas da herança.

O valor concreto da legitima vai, também, depender dos herdeiros a quem se destine.

Assim, se não tiver havido renúncia à qualidade de herdeiro por parte do cônjuge e o falecido não tiver filhos, nem pais, a legitima do cônjuge é de metade da herança.

Se o falecido tiver filhos (e cônjuge) a legitima do cônjuge e dos filhos é de dois terços da herança.

Se não houver cônjuge sobrevivo (ou se este tiver renunciado à qualidade de herdeiro) a legitima dos filhos varia consoante o número de filhos: metade de for um único filho, dois terços se forem dois ou mais filhos.

Numa situação em que não existam filhos, mas exista cônjuge e pais ainda vivos, a legitima destes é de dois terços do total da herança.

Já se apenas existirem pais vivos, a legitima destes é de metade da herança ou, caso existam avós ainda vivos, de dois terços.

Os bens da herança que não estão, obrigatoriamente, destinados aos herdeiros legitimários, (consoante os casos, metade ou um terço), podem ser livremente distribuídos por quem o autor da herança entender, podendo fazê-lo por testamento.

Se não existir testamento e existirem herdeiros legitimários a metade ou o um terço dos bens disponíveis será distribuído pelos chamados herdeiros legítimos que, nos termos da lei e pela ordem preferencial que esta estabelece, são:

O cônjuge (não renunciante) e os descendentes;

O cônjuge (não renunciante) e os ascendentes;

Os irmãos e os descendentes destes

Outros colaterais (até ao 4º grau)

Não existindo parentes colaterais de 4º grau e não existindo como supra referido, testamento, os bens em causa serão entregues ao Estado

Conclui-se, assim, que os cônjuges, os descendentes (filhos, netos, etc) e os ascendentes (pais, avós, bisavós) não podem ser, por regra, afastados da sucessão.

Os irmãos, tios e primos, quando não existam cônjuge, descendentes e ascendentes, são herdeiros sendo que, por vontade do autor da herança, expressa através de testamento, podem ser afastados da sucessão ou podem herdar nos termos que o autor da herança entender.

Através de testamento, o autor da herança, ainda que tenha herdeiros legitimários que não pode afastar da sucessão, pode dispor de metade ou um terço dos seus bens, nos termos que entender, podendo dispor da totalidade dos mesmos, como quiser, se não tiver cônjuge, descendentes ou ascendentes

 

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O acompanhamento de maior: a escolha do acompanhante

O Regime Jurídico do Maior Acompanhado, que data de 2018, concretizou internamente instrumentos internacionais, nomeadamente, a Convenção das Nações Unidas de 30 de março de 2007 relativa os Direitos das Pessoas com Deficiência, adotada em Nova Iorque.

De acordo com o artigo 1º desta Convenção, o seu objeto é o de  “promover, proteger e garantir o pleno e igual gozo de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais por todas as pessoas com deficiência e promover o respeito pela sua dignidade inerente”, estabelecendo-se no seu artigo 46.º que os Estados Contratantes se comprometem  “a assegurar e promover o pleno exercício de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais para todas as pessoas com deficiência sem qualquer discriminação com base na deficiência”.

Assim, o Regime Jurídico do Maior Acompanhado abandonou a solução da substituição da vontade da pessoa incapaz, tendo privilegiado um modelo de apoio à mesma, no qual as medidas aplicadas serão escolhidas de acordo com as concretas necessidades da pessoa em causa, sendo revistas periodicamente com o objetivo, seja de aferir da manutenção da necessidade de apoio, seja de que o apoio aplicado é o adequado em cada momento, respeitando os princípios da adequação, da proporcionalidade e da dignidade da pessoa, garantindo-se que esta continua a ter vontade e a ser sujeito de direitos, apesar das suas necessidades especiais.

Assim sendo e, conforme resulta do artigo 140.º n.º 1 do Código Civil, o acompanhamento tem como objetivo assegurar o bem-estar, a recuperação, o pleno exercício de todos os direitos e o cumprimento dos deveres do acompanhado, competindo ao acompanhado escolher o seu acompanhante. Não sendo feita essa escolha, a lei identifica, de forma exemplificativa, um conjunto de pessoas a quem deverá ser deferido o exercício do cargo de acompanhante, conforme n.º 2 do artigo 143.º do Código Civil.

Este acompanhante deverá garantir o bem-estar e a recuperação do acompanhado, atuando de forma diligente e mantendo um contacto permanente com este, estabelecendo a lei que, no mínimo, deverá visitá-lo com uma periodicidade mensal.

Na nomeação do acompanhante, ter-se-á em conta a pessoa que melhor salvaguardará os interesses do acompanhado e que melhor possa garantir a sua recuperação e o seu bem-estar, tendo em conta, nomeadamente, as relações de proximidade que mantém com o acompanhado, razão porque o cônjuge, os descendentes e os ascendentes não poderem recusar-se a serem acompanhantes, nem poderão ser exonerados dessa  função, exceção feita aos descendentes, os quais poderão pedir a sua exoneração após 5 anos de exercício da função, se existirem outros descentes igualmente capazes.

Os restantes acompanhantes podem pedir escusa desde que, para o efeito, invoquem os fundamentos que se encontram previstos no artigo 1934.º do Código Civil e, independentemente destes fundamentos, poderão pedir para serem substituídos ao fim de 5 anos de exercício da função.

Com vista a garantir que se determinará a solução mais adequada ao caso concreto, o n.º 3 do artigo 143.º do Código Civil prevê a possibilidade de serem nomeados vários acompanhantes com diferentes funções, especificando-se as atribuições de cada um, nada impedindo também que sejam nomeados vários acompanhantes que exercerão a sua função de forma rotativa.

Por exemplo, se o acompanhado tiver 3 filhos, nada impede que os 3 sejam nomeados acompanhantes exercendo cada um essa função por específicos períodos de tempo.

Também nada impede que sejam nomeados acompanhantes que visem objetivos específicos: um acompanhante para as questões pessoais do acompanhado e, outro acompanhante, para tratar dos assuntos patrimoniais deste.

Em conclusão, de quanto supra exposto, resulta que, no quadro legal, é possível, de acordo com a solução que se apresentar como a mais adequada ao caso concreto, nomear um único acompanhante, nomear um acompanhante e um acompanhante substituto que apenas exercerá funções caso o acompanhante esteja impedido de o fazer, nomear vários acompanhantes cada um com a sua função, nomear vários acompanhantes que exercerão funções, por períodos de tempo concretos e de forma rotativa.

 

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A conciliação da vida familiar com a vida profissional

A conciliação da vida familiar com a vida profissional

A conciliação entre a vida familiar e a vida profissional é um tema que tem vindo a ser objeto de várias propostas da Comissão Europeia relativas ao futuro da política social europeia, com a preocupação de se tentar promover uma mudança no binómio trabalho-família para garantia de que os trabalhadores, ao longo da sua vida, alcancem um equilíbrio entre estes dois vetores.

Efetivamente, na Europa tem sido crescente a adoção de medidas de conciliação entre a vida familiar e profissional, no sentido de se legislar sobre horários de trabalho mais flexíveis.

Em Portugal, também encontramos um conjunto de normas que vão no mesmo sentido da salvaguarda da vida familiar e profissional. Senão vejamos.

Conforme resulta do artigo 59.º da Constituição da República Portuguesa:
1. Todos os trabalhadores, sem distinção de idade, sexo, raça, cidadania, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, têm direito:


b) A organização do trabalho em condições socialmente dignificantes, de forma a facultar a realização pessoal e a permitir a conciliação da atividade profissional com a vida familiar;”.

Também o artigo 68.º da Constituição da República Portuguesa prevê que:

«1. Os pais e as mães têm direito à proteção da sociedade e do Estado na realização da sua insubstituível ação em relação aos filhos, nomeadamente quanto à sua educaçãocom garantia de realização profissional e de participação na vida cívica do país.
2. A maternidade e a paternidade constituem valores sociais eminentes.»
Assim, encontra-se constitucionalmente garantido que o trabalho não pode ser prestado em condições impeditivas da conciliação da atividade profissional com a vida familiar.

E, o artigo 56.º do Código do Trabalho, reportado ao horário flexível do trabalhador com responsabilidades familiares, prevê que:


“1 - O trabalhador com filho menor de 12 anos ou, independentemente da idade, filho com deficiência ou doença crónica que com ele viva em comunhão de mesa e habitação tem direito a trabalhar em regime de horário de trabalho flexível, podendo o direito ser exercido por qualquer dos progenitores ou por ambos.
2 - Entende-se por horário flexível aquele em que o trabalhador pode escolher, dentro de certos limites, as horas de início e termo do período normal de trabalho diário.

5 - O trabalhador que opte pelo trabalho em regime de horário flexível, nos termos do presente artigo, não pode ser penalizado em matéria de avaliação e de progressão na carreira.”

Sendo ainda relevante mencionar que, nos termos do artigo 127.º do mesmo Código a entidade patronal deve proporcionar ao trabalhador condições de trabalho que favoreçam a conciliação da sua atividade profissional com a vida familiar e pessoal.

Mas, a conciliação entre a vida profissional e familiar não se esgota na maternidade e na paternidade, na medida em que esta conciliação é importante para os trabalhadores que têm filhos, mas também o é para os que cuidam dos seus pais ou dos seus avós e é ainda importante para os trabalhadores que, independentemente do estado civil, possam ter que cuidar do seu parceiro.

A adoção de medidas flexíveis nas empresas contribui para o aumento da produtividade e do compromisso dos trabalhadores, reduzindo ainda os conflitos e permite a promoção da valorização da imagem da própria empresa.

Por exemplo, em França, desde 2017 que foi criada uma lei que visa proteger os trabalhadores, na medida em que as empresas ficam obrigadas a definir um horário em que não é obrigatória a consulta e leitura de emails.

Importa salientar que, em 12 de julho de 2019, foi publicada a Diretiva (UE) 2019/1158, do Parlamento Europeu e do Conselho, relativa à conciliação entre a vida profissional e a vida familiar dos progenitores e cuidadores, a qual entrou em vigor 20 dias após a sua publicação, tendo os Estados-membros que transpor a mesma para o seu direito nacional até 2 de agosto de 2022.

Nos termos desta Diretiva, estabelecem-se requisitos mínimos que visam facilitar a conciliação entre a vida profissional e familiar dos trabalhadores que são progenitores ou cuidadores, entendendo-se por cuidador o trabalhador que presta cuidados pessoais ou apoio a um familiar ou uma pessoa que vive no agregado familiar do trabalhador e que necessita de cuidados ou assistência significativos, por uma razão médica grave.

Nos termos desta Diretiva, estabelece-se que os Estados-membros deverão adotar as medidas adequadas a garantir que os trabalhadores com filhos até, pelo menos, 8 anos de idade e que os cuidadores possam solicitar um regime de trabalho flexível que lhes permita ocuparem-se também da prestação de cuidados.

Como se refere no considerando 12 da mesma Diretiva, deverá ser tido em consideração que a utilização das licenças por parte dos trabalhadores, de forma equilibrada, está inter-relacionada com a existência de soluções acessíveis para a generalidade dos trabalhadores, serviços de acolhimento de crianças e cuidados continuados, os quais são determinantes para viabilizar que os progenitores e as pessoas com responsabilidades ao nível da prestação de cuidados, possam entrar, permanecer ou regressar ao mercado de trabalho.

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A situação atual e os seus reflexos no Direito da Família

A situação atual e os seus reflexos no Direito da Família

Ninguém nega que a situação de confinamento em que nos encontramos tem reflexos profundos em todos os campos da nossa vida, nomeadamente, no quadro do núcleo familiar.

As pessoas e as famílias vivem tempos de incerteza, de angústia, de dificuldades financeiras e o isolamento forçado que tem que ser cumprido passa fatura, do ponto de vista psicológico.

Todos estamos mais irritados, mais cansados, mais angustiados, mais temerosos.

Não são fáceis os desafios que somos chamados a superar.

Hoje, os pais estão em teletrabalho e têm os filhos em casa, a ter aulas à distância, tendo uma sobrecarga emocional grande e que, em cada dia, por repetição, se torna desgastante.

O lar que, antes era um ponto de recolhimento familiar, tornou-se um local onde conflui família, trabalho e aulas à distância e esta convivência forçada, nos termos abruptos em que se instalou, levou a que núcleos familiares estáveis não aguentem a pressão instalada.

Nós, advogados de Família, temo-nos vindo a aperceber que vai aumentando o número de pessoas que nos consultam, para se esclarecerem sobre o divórcio e todas as questões conexas, como seja a utilização do lar conjugal, as pensões de alimentos, a regulação das responsabilidades parentais, as partilhas, etc.

Também temos vindo a ser confrontados com pedidos de redução de pensões de alimentos, em vista da degradação da situação profissional dos progenitores e, também, com ações executivas resultantes de incumprimentos do regime de regulação das responsabilidades parentais.

Sem dúvida que a crise pandémica tem tido efeitos na família e, por isso, os problemas surgem, nomeadamente, cai um silêncio ensurdecedor sobre as vítimas de violência doméstica que, fruto do confinamento, têm que conviver diariamente com o agressor.

E, se pensarmos nas restrições que existem nas viagens internacionais, com restrição de movimentos transfronteiriços, percebemos os reflexos que tal tem em famílias que haviam apostado por uma nova vida no estrangeiro e que, fruto desta situação pandémica, tiveram que adiar esta nova fase nas suas vidas, com tudo o que isso implica, nomeadamente, ao nível económico e, também por isso, o desgaste relacional que estas situações acabam por produzir.

Em termos internacionais, não podemos esquecer as decisões unilaterais que um progenitor toma em relação aos filhos de mudar de país e, assim, se inicia um processo difícil e traumatizante para as crianças que, de repente, se vêm sem a presença de um dos pais, sem saberem porquê e, esta realidade, também nos chega e nos leva a ter que tratar de processos de rapto internacional.

Ou seja, a situação de pandemia criou uma convulsão no seio da família e, consequentemente, os advogados são chamados, cada vez mais a intervir, para ajudar a resolver os problemas jurídicos que existem e, desta forma, tentar que a paz retorne.

Porque a situação de confinamento tem repercussões ao nível do funcionamento dos tribunais, nós, advogados, somos chamados a procurar, por via consensual, a resolução dos diferendos existentes, a bem da família que, apesar de desunida, continuará pela vida a ter laços.

Trata-se de um esforço negocial que nos leva a procurar formação, nomeadamente, ao nível da mediação, como ferramenta de ajuda para melhor e mais ajudar quem nos procura, tentando que o encerramento dos tribunais não tenha um impacto tão grande e obste a que se chegue a uma solução final.

É evidente que a situação de encerramento também não ajuda os processos que correm em tribunal e que, neste momento, estão suspensos, porque não são processos urgentes e, por isso, não correm, não avançam, com todos os prejuízos que tal causa.

Sabemos que os tribunais fazem um esforço meritório para resolver, da melhor maneira possível, os processos que ficam atrasados e que se acumulam mas a verdade é que a realidade quotidiana de uma família, que se está a degradar, não pode esperar pelo tempo necessário à recuperação do trabalho que está atrasado.

Assim, temos vindo a, cada vez mais, procurar solucionar por consenso, procurando que as partes se envolvam cada vez mais e procurando, através do diálogo, conseguir que o que não era negociável possa ser equacionado, que o que era zanga se transforme em lucidez e vontade de seguir em frente, com os assuntos jurídicos resolvidos por consenso.

Temos sentido cada vez mais esta necessidade, por tudo quanto supra exposto e, também, porque a realização das diligências por meios telemáticos, por muito boa vontade que exista, não é o mesmo que as diligências presenciais, especialmente nos processos que envolvem menores.

Assim, também por esta razão maior, temos vindo a desenvolver cada vez mais as nossas competências no quadro da negociação, da mediação, do crescimento pessoal, que nos ajuda a ser melhores advogadas.

Este tempo de confinamento, para nós, tem sido um tempo intenso de formação profissional e de procura de meios alternativos para se encontrar uma solução consensual.

Um advogado de Família tem que ser uma pessoa próxima dos seus constituintes, pronta a ouvir e a ajudar, pronta a resolver e pronta a consensualizar.

Este é um caminho que seguimos, com formações, nomeadamente, nos Estados Unidos da América e onde percebemos que é possível resolver os assuntos jurídicos de família sem conflito construindo criativamente, com todos os envolvidos, uma solução final global digna e válida que mantenha o respeito para o futuro.

Vamos continuar a aprender e a falar sobre as vantagens de resolver os dissensos por consensos alargados, porque somos conscientes que o Direito da Família tem uma transcendência real na sociedade e nas relações futuras e queremos estar do lado da solução construtiva, sempre que possível.

Acreditamos que haverá mais saúde mental se os assuntos de Direito da Família, sempre que exista perfil das partes para isso, forem resolvidos entre as pessoas, falando e dialogando construtivamente e, para isso, os advogados de Família têm que aportar essa positividade ao tratamento do assunto e esse é o futuro que estamos a construir.

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O regime de visitas dos adolescentes

O regime de visitas dos adolescentes

Na regulação das responsabilidades parentais, seja feita por acordo, seja decidida judicialmente, quando é fixada a residência do menor com um dos progenitores é, ainda, estabelecido o regime de visitas desse menor com o outro progenitor.

Consagração deste direito (de filhos e pais) encontra-se na Declaração Universal dos Direitos da Crianças, onde podemos constatar, no seu artigo 9.º, o direito de as crianças estarem o tempo suficiente com cada um dos progenitores, nos casos em que estes se encontrem separados.

Também os pais têm o direito a estar com os filhos, com qualidade de tempo, por forma a poderem estreitar com estes os laços de afetividade duradouros, mesmo nas situações em que a família se desintegra, tendo ainda os progenitores o dever de exercer, com responsabilidade, o seu papel de progenitores com as obrigações que são inerentes a essa qualidade. 

A fixação e a aplicação do regime de visitas no âmbito da regulação das responsabilidades parentais não pode ser indiferente às circunstâncias do caso concreto e, nomeadamente, à idade dos menores e ao facto de um menor estar em plena adolescência, onde começa a ter uma maior autonomia, a procurar afirmar-se junto dos seus colegas e amigos e a iniciar um caminho de procura e encontro de interesses próprios e convívios com os amigos e de autonomia.

Nesta situação e estando homologado um regime de regulação das responsabilidades parentais que foi estabelecido ainda antes do menor entrar na fase da adolescência, deve este ser rigorosamente cumprido e imposto ao menor? Deve a vontade do menor adolescente prevalecer? Como equilibrar a situação?

A lei não nos dá uma concreta resposta a esta questão, mas a verdade é que, se estivermos perante um menor de 15 ou 16 anos, a vontade deste deve ser tida em conta, mesmo sabendo-se que não é vinculativa, mas é preciso equilibrar o regime de visitas e a necessidade que o menor adolescente tem de começar a trilhar o seu próprio caminho, devendo também compreender-se que gostará de estar com os seus amigos e fazer programas com estes. Sendo sabido que, na adolescência, os filhos privilegiam o convívio com os seus pares, em detrimento dos pais.

É importante que ambos os progenitores estejam atentos a esta realidade e nem o progenitor guardião se deve prevalecer desta fase de maior rebeldia do menor adolescente para se escudar e, assim, ir incumprindo o regime de visitas, nem o outro progenitor deve impor, sem mais, o cumprimento estrito do regime de visitas tomando em conta que se o mesmo foi fixado antes do menor ter esta idade, o mesmo pode apresentar-se desajustado, devendo ambos os progenitores conversar e entenderem-se, sempre a bem do menor, entendendo e flexibilizando esse regime de visitas, sem prejudicar o mesmo.

Neste tipo de situações, o Tribunal têm uma maior dificuldade em impor o cumprimento do regime de visitas sem que o mesmo esteja adaptado à adolescência do menor e, quanto mais este se aproxima da maioridade, mais relevância a mesma apresenta e menos margem terão os Tribunais para impor decisões que vão em sentido contrário ao desejado pelo menor.

No entanto e, porque se está a falar de uma relação filial, devem os Tribunais - e todos os intervenientes - procurar concertar a vontade do menor com a importância deste manter uma relação saudável com o progenitor não guardião, sempre em benefício do menor adolescente.

A relevância dada à vontade do menor adolescente tem que ser consentânea também com o facto de o próprio ordenamento jurídico lhe outorgar determinados direitos como, por exemplo, o direito de este se emancipar, o que demonstra que a partir de determinada idade, o menor tem uma capacidade de discernimento e de maturidade que não pode ser esquecida e tem que ser valorizada.

Por isso, deve ser feita esta distinção entre menores adolescentes de 15 e 16 anos e menores de idade inferior.

Ou seja, num incumprimento do regime de visitas, o Tribunal terá em conta a vontade expressa pelo menor e tenderá a respeitar a mesma e, no segundo caso, ou seja nos menores com, por exemplo, 10 ou 11 anos, o Tribunal procurará indagar, com mais precisão e mais cautela, as razões que o menor invoca para não querer cumprir o regime de visitas ao outro progenitor, nomeadamente, se tal situação tem, na sua génese, uma influência tóxica do outro progenitor e ponderando sempre que o menor beneficiará do contributo do progenitor não guardião para a sua formação e educação fomentando, assim, a promoção de uma relação entre progenitor e filho saudável e contínua.

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Quem é o responsável pelos documentos dos filhos?

Quem é o responsável pelos documentos dos filhos?

Por regra, na dinâmica de um casal, há sempre um dos membros que assume o papel de “guardião dos documentos” dos filhos. Tal não é um problema pois, sempre que o outro necessite de ter acesso aos referidos documentos, saberá onde os mesmos se encontram, ou, mesmo que não saiba, terá fácil acesso aos mesmos.

Quando o casal se divorcia e, não apenas nas situações em que existe alguma tensão entre o casal, coloca-se a questão de com quem ficam os documentos dos filhos menores.

Frequentemente, um dos progenitores, entende que deve ser, ou continuar a ser, “o guardião dos documentos” – independentemente até do facto de muitas vezes, os filhos viverem em regime de residências alternadas – e, por isso, recusa a entrega dos documentos em causa ao outro progenitor. Fazem-no porque acham “mais prático” ou porque entendem o outro progenitor “os vai perder”. Em casos extremos, fazem-no para exercer um poder sobre a vida do outro progenitor e, assim, perturbar o dia a dia do outro com os filhos.

Os documentos de uma criança são essenciais para, em caso de necessidade, se determinar a legitimidade de atuação da pessoa que a tem à sua guarda.

Por exemplo, se uma criança fica doente e tem que ir ao hospital, tem que ser exibido o seu documento de identificação e, possivelmente, o cartão de seguro de saúde, ou seja, quem acompanha a criança tem que ter os documentos consigo para os poder exibir.

Os documentos das crianças (aqui se inclui, para além do cartão de cidadão, o boletim de saúde infantil e juvenil, o boletim de vacinas e, quando existam, o cartão relativo ao seguro de saúde e o passaporte) são propriedade das crianças que são os titulares dos mesmos e, por isso mesmo, devem sempre, acompanhar as crianças.

Assim, resulta claro que, nas situações em que um dos progenitores se recusa a entregar os documentos dos filhos ao outro progenitor, aquele que se recusa a entregar não está a exercer um direito que tenha mas sim a reter documentação que não lhe pertence.

É tão evidente que os documentos pertencem à criança e, por isso, devem acompanhá-la que esta questão, por regra, não fica prevista nas decisões de regulação do exercício das responsabilidades parentais.

Contudo, por vezes, apesar de tal evidência existem situações, como as acima descritas em que, pela ação de um dos progenitores, o outro se vê impedido de ter consigo os documentos dos filhos, nos períodos em que os mesmos estão à sua guarda, causando por vezes transtornos relevantes no dia-a-dia.

Nestas situações o que pode, este progenitor fazer?

Mostrando-se impossível a resolução de tal questão através do bom senso e, caso o progenitor que tem consigo os documentos mantenha a recusa de disponibilização dos mesmos ao outro então, o progenitor impedido de ter acesso aos documentos do filho, terá que recorrer ao tribunal.

Para tanto deverá, previamente, interpelar formalmente, por qualquer meio escrito de que resulte prova de receção, o progenitor que retém os documentos, para que deixe de o fazer, facultando o acesso aos mesmos. Caso, ainda assim, este mantenha o comportamento, então deverá ser acionado um processo tutelar cível, no qual se requer ao Tribunal que ordene ao progenitor que retém os documentos do filho que altere a sua conduta.

Apesar de neste tipo de procedimentos em tribunal (em primeira instância) não ser obrigatória a constituição de mandatário, é sempre aconselhável que, previamente a qualquer atuação, seja consultado um advogado pois, muitas vezes, por falta de conhecimento, os progenitores iniciam processos de forma errada – ou não iniciam processos por não saberem que o podem fazer - , dando origem a situação que, em vez de resolver as situações de conflito as agudizam com todas as consequências nefastas que tal acarreta.

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O dever dos pais de proteger a saúde dos filhos e o dever de promoverem a sua educação

O dever dos pais de proteger a saúde dos filhos e o dever de promoverem a sua educação

Com o início do ano letivo de 2020/2021 e, após a forma como o ano letivo anterior terminou, muitos pais encontram-se em situação de incerteza quanto à melhor decisão a tomar: mandar os filhos para a escola ou, em face do aumento de casos de contágio que têm vindo a ser noticiados, mantê-los em casa.

Por outro lado, a falta de informação quanto às medidas tomadas, pelo menos no que aos estabelecimentos de ensino público respeita, também contribui para a incerteza e dificulta a tomada de decisão.

Finalmente o desconhecimento quanto à forma de atuação das escolas em caso de suspeitas e/ou casos confirmados, agudiza a dúvida.

Estamos assim, perante uma situação em que os pais se vêm colocados entre decidir pelo direito dos filhos à educação e o direito dos filhos à saúde.

Em primeiro lugar importa referir que está em causa o ensino obrigatório (aqui se incluindo o ensino básico e o ensino secundário), ou seja, por regra, alunos entre os 6 e os 16 anos de idade.

Na presente data a legislação determina que todas as crianças deverão frequentar a escola num regime presencial.

A exceção à frequência presencial verifica-se se uma criança integrar, comprovadamente (através de atestado médico ou declaração médica), um dos grupos de risco.

Nesta circunstância os pais poderão requerer que a direção do estabelecimento de ensino frequentado pela criança, efetive o direito que estas crianças têm de acesso a apoio remoto o que deverá ser feito através da adoção de um regime excecional não presencial. Deverá/poderá ser implementado um regime misto, ou seja, um regime que combina atividades presenciais com sessões síncronas e com trabalho autónomo. Também poderá, se as circunstâncias assim o exigirem, ser determinado um apoio exclusivamente autónomo e/ou assíncrono.

A situação de doença da criança e o seu consequente enquadramento no grupo de risco, tem que ser transmitida, pelo encarregado de educação, que terá que juntar atestado ou declaração médica. 

No que respeita a crianças que não integrem o grupo de risco a situação é, como supra referido, a da obrigatoriedade de frequência presencial do estabelecimento de ensino.

Se, não obstante tal obrigatoriedade, os pais, ainda assim, optarem por não permitir a frequência escolar da criança, o que acontecerá é que, o estabelecimento de ensino, em face do número de faltas injustificadas que irá verificar, terá a obrigação legal de comunicar a situação à Comissão de Proteção de Crianças e Jovens pois, a verdade é que, por o direito à educação ser um direito da criança, entende-se que, quando uma criança falta, injustificadamente à escola, poderá estar a vivenciar uma situação de risco.

Após esta comunicação do estabelecimento de ensino, a Comissão de Proteção de Crianças e Jovens tem, obrigatoriamente, de averiguar a situação e, caso os pais mantenham a sua oposição à frequência presencial, então a Comissão terá que comunicar tal situação ao Ministério Público, junto do Tribunal de Família e Menores territorialmente competente.

Nesta circunstância o Tribunal de Família decidirá, após ouvir os pais (que terão oportunidade de explicar as razões pelas quais, apesar de a criança não se enquadrar no grupo de risco, optaram por não permitir a frequência presencial do estabelecimento de ensino), se a criança deverá, ou não, frequentar o estabelecimento de ensino presencialmente, sendo que esta decisão será tomada sempre tendo em consideração, em primeiro lugar, o superior interesse da criança, concretamente considerada.

A decisão de frequentar presencialmente, ou não, o estabelecimento de ensino – seja pelo tribunal, seja, previamente, pelos pais – deverá ser tomada tendo sempre em consideração que, em caso de conflito entre o direito à saúde e o direito ao ensino, deverá prevalecer o direito da criança à saúde.

Refira-se ainda que, caso a não frequência presencial do estabelecimento de ensino, por estas crianças que não integram o grupo de risco seja considerada justificada, as faltas que as mesmas deram serão consideradas faltas justificadas.

Finalmente importa esclarecer que são sempre consideradas justificadas as faltas decorrentes de isolamento profilático, determinado por doença infeto-contagiosa - aqui se incluindo a suspeita de contágio por Covid-19 - de pessoa que coabite com a criança, devendo tal situação de isolamento ser comprovada através de declaração da autoridade sanitária competente.

Em todas as situações de ausência justificada às atividades escolares, a criança tem direito a que lhe sejam aplicadas medidas de suporte à aprendizagem e à inclusão, as quais, nos termos legais, podem ser organizadas em três níveis de intervenção: medidas universais, medidas seletivas e medidas adicionais as quais deverão ser definidas pelos professores responsáveis e/ou pela escola, nos termos constantes do regulamento interno do estabelecimento de ensino em causa e que deverão ser adequadas à recuperação da aprendizagem em falta, garantindo-se a possibilidade de sucesso escolar das crianças impedidas de frequentar o estabelecimento de ensino presencialemnte.

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