Insolvência de ex-cônjuge e existência de património comum

Insolvência de ex-cônjuge e existência de património comum

Por vezes acontece que, por razões várias, um casal, após o decretamento do seu divórcio, opta por manter o património em comum, não procedendo, no imediato, à partilha do mesmo.

Assim, muitas vezes, verificam-se situações em que, ex-cônjuges, continuam a ter um ativo (e, por vezes, um passivo) em comum.

Se é certo que, na maioria das vezes em que tal opção resulta de um acordo entre ambos a situação é pacífica, não levando a conflitos nem a problemas, a verdade é que, mesmo nestas situações, existem circunstâncias que não dependem da vontade das partes e que, por vezes, trazem situações de complexa resolução.

É, por exemplo o problema que se coloca quando, tendo os ex-cônjuges um património comum, um deles é declarado insolvente e, para a massa insolvente, são apreendidos bens que integram o património conjunto do ex-casal.

O que acontece nestas situações?

Foi, sobre uma questão como esta, que se debruçou o acórdão de 22 de Setembro de 2020, do Tribunal da Relação de Lisboa, no qual foi chamado a decidir sobre uma questão decorrente da inclusão, como receita, num processo de insolvência, da totalidade do produto do venda de bens imóveis que, por não terem sido objeto de partilha, integravam o património comum do insolvente e seu ex-cônjuge.

Com efeito, no processo em causa, aquando da apreensão de bens do insolvente, apenas havia sido apreendido o direito que este tinha, na meação dos bens em causa. Assim, consequentemente, apenas poderia ser considerado, como fazendo parte da massa insolvente, metade do produto da venda dos bens.

No caso dos autos, não se discutia se a apreensão da meação estava, ou não, correta pois, a verdade é que a mesma havia sido efetuada sem que a sua validade tivesse sido questionada.

O que se passou, na situação analisada pelo referido acórdão foi que a apreensão da meação foi efetuada, a existência da declaração de insolvência foi registada na Conservatória do Registo Predial competente, em relação à meação do insolvente e, na sequência do desenvolvimento do processo, o Administrador da Insolvência (enquanto representante do insolvente) procedeu à venda da totalidade do bem imóvel o que fez, em conjunto com o ex-cônjuge daquele.

Assim, o Tribunal da Relação de Lisboa, entendeu que, efetivamente, apenas metade do produto dão venda poderia ser considerado como receita no âmbito do processo de insolvência.

Contudo, a realidade da situação, levou a que o ex-cônjuge do insolvente, por não ter invocado a nulidade da apreensão da meação, requerendo a apreensão da totalidade do bem e a sua citação para requerer a separação de meações, saísse prejudicado.

Com efeito, o bem cuja meação havia sido apreendida e que foi vendido, era garantia de uma divida comum do ex-casal e, porque não foi pedida a separação de meações, aquando da escritura o adquirente do bem (no caso o credor hipotecário que, no âmbito do processo, requereu a sua adjudicação), efetuou, como pagamento, o depósito de 20% do preço de aquisição tendo ficado dispensado do pagamento do remanescente do preço em resultado da referida qualidade de credor hipotecário.

Ou seja, na prática, o ex-cônjuge do insolvente acabou por não receber 50% do valor de venda do imóvel.

A questão está diretamente relacionada com a questão de saber o que deve ser apreendido, numa situação em que o insolvente tem património por partilhar.

Em alternativa à apreensão da meação, poderia ter sido efetuada a apreensão da totalidade dos bens e, após, proceder-se à citação do ex-cônjuge para que este, no processo de insolvência, viesse requerer a separação da meação.

Esta segunda solução, permitiria a venda da totalidade dos bens e o cumprimento de todos os demais trâmites legais, nomeadamente, se fosse o caso, o cancelamento de ónus que, sobre o bem em causa, impendiam, obrigando ao pagamento do credor hipotecário (que assim não se poderia fazer valer dessa qualidade e depositar apenas 20% do valor) e permitindo ao ex-cônjuge do insolvente salvaguardar a sua posição, não saindo prejudicado.

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Quando os cônjuges prescindem mutuamente de alimentos e a manutenção do direito a alimentos

Quando os cônjuges prescindem mutuamente de alimentos e a manutenção do direito a alimentos

Ocorrendo um divórcio por mútuo consentimento, deverão os cônjuges acordar quanto a um conjunto de questões, nomeadamente, quanto à atribuição, ou não, de alimentos a ex-cônjuge.

Pode, no futuro, um ex-cônjuge que, em sede de acordo, prescindiu do direito a alimentos vir posteriormente pedir alimentos ao outro? A resposta é afirmativa.

Os alimentos prestados a ex-cônjuge radicam no entendimento de que esta obrigação de prestação de alimentos resulta do conceito de solidariedade pós-conjugal, que existe após a dissolução do casamento, acrescendo que, mesmo tendo sido firmado entre ambos os cônjuges, um acordo em que estes prescindiram reciprocamente de alimentos a verdade é que, nos termos do disposto no artigo 2008.º n.º 1 do Código Civil, o direito a alimentos não pode ser renunciado.

Assim, o acordo firmado em que, no âmbito de um divórcio por mútuo consentimento, ambos os cônjuges prescindiram reciprocamente de alimentos, não pode ser interpretado como uma renúncia ao direito a alimentos.

A única interpretação admissível é a de que, no momento em que acordaram nesses termos, não quiseram exercer o direito a alimentos (também não podemos esquecer aqui as situações em que um dos cônjuges acaba por assinar o acordo não porque concorde com a desnecessidade de pedir alimentos, mas sim porque sente que para poder ter o divórcio resolvido e, nomeadamente, questões com ele conexas, como seja a regulação das responsabilidades parentais, acede a prescindir de alimentos, mesmo sabendo que, de facto, precisa dos mesmos).

Com efeito, sendo o direito a alimentos irrenunciável, a lei não faz depender a admissibilidade do pedido judicial de alimentos, em data posterior à assinatura do acordo quanto a alimentos, da existência de circunstâncias supervenientes diferentes das que existiam no momento da assinatura do acordo em que não se exigiu alimentos.

Equivale tal a dizer que, tendo sido outorgado um acordo de não prestação de alimentos e vindo, posteriormente, um dos ex-cônjuges exigir alimentos ao outro, o tribunal deverá aferir se existe fundamento para o pedido que é formulado, verificando se, em face da factualidade alegada, se encontram reunidos os requisitos legais para a fixação de alimentos a ex-cônjuge, mais concretamente, se existe necessidade de alimentos e se existe possibilidade de os prestar, por parte do obrigado a tal.

Ao tribunal não caberá inventariar as situações pretéritas, com vista a confirmar se entre o momento do acordo sobre alimentos e o momento em que é pedida a fixação judicial de alimentos a ex-cônjuge, ocorreram circunstâncias supervenientes que justificam o deferimento de tal pedido.

O acordo firmado apenas pode ser interpretado como um documento de onde resulta que, naquele momento, os cônjuges não quiseram exercer o direito alimentos sendo que as motivações que deram origem a tal acordo não têm que ser apreciadas pelo tribunal que tem que decidir sobre a fixação de pensão de alimentos a ex-cônjuge que, previamente, tenha outorgado acordo a prescindir desses alimentos.

Em conclusão: o acordo em que ambos os cônjuges prescindem reciprocamente do direito a alimentos não equivale a uma renúncia a tal direito, o qual pode vir a ser exercido, em momento ulterior.

Tal conclusão vale e deve ser entendida especialmente pelo ex-cônjuge que, por razões subjetivas, se viu confrontado com a necessidade de ter que declarar que prescindia de alimentos quando, a verdade é que, precisava desses alimentos.

O processo pode ser reavivado e a lei protege quem precisa de alimentos, impondo a quem os pode prestar a obrigação de o fazer, dentro do circunstancialismo legal relevante, por isso, quem precisa de alimentos deve ter o necessário apoio legal para que possa exercer o seu direito que, no caso, corresponde a uma necessidade.

 

 

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Pensão de alimentos a ex-cônjuge

Pensão de alimentos a ex-cônjuge:

A Lei n.º 61/2008, de 31 de outubro, veio alterar o regime jurídico do divórcio alterando, também, o regime da obrigação de alimentos entre ex-cônjuges.

A regra geral, em matéria de alimentos entre ex-cônjuges, depois do divórcio ou da separação judicial de pessoas e bens, é a que se encontra enunciada no n.º 1 do artigo 2016.º do Código Civil:

«1 – Cada cônjuge deve prover à sua subsistência, depois do divórcio

Desta regra geral, resulta que a obrigação de alimentos tem um caráter excecional e temporário, na medida em que a mesma tem como finalidade auxiliar o ex-cônjuge carecido de alimentos na satisfação das suas necessidades básicas, dando-lhe um mínimo de condições que lhe permita, nos primeiros tempos após o divórcio, reorganizar a sua vida, sendo esta obrigação devida pelo período de tempo necessário para o alimentando se adaptar à sua nova vida apoiando-se, assim, a transição para a sua independência económica.

Deste modo, o critério para atribuição de alimentos é o da necessidade do ex-cônjuge deles carecido.

Assim sendo, a obrigação de alimentos entre ex-cônjuges não perdurará para sempre, na medida em que o beneficiário dos alimentos tem obrigação de providenciar ao seu sustento, esforçando-se para tal.

O dever de prestação de alimentos, após o divórcio ou após a separação judicial de pessoas e bens assume, pois, um caráter subsidiário e assenta no dever assistencial que perdura para além do casamento, dever este limitado nos termos supra referidos.

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No que respeita à determinação do montante de alimentos, importa ter em conta quanto previsto no artigo 2016.º-A do Código Civil, o qual enuncia várias circunstâncias a que se deve atender para efeitos de fixação da obrigação de alimentos, como sejam o tempo de duração do casamento, a colaboração que o ex-cônjuge carecido de alimentos prestou à economia do casal, o seu estado de saúde, a sua idade, as suas qualificações profissionais e possibilidades de emprego, a sua capacidade económica em vista de rendimentos que possa ter, a reorganização da sua vida familiar, etc.

Refira-se, ainda que, existindo uma obrigação de alimentos a filhos do cônjuge onerado com a obrigação de alimentos, esta prevalece sobre a obrigação de prestação de alimentos a favor do ex-cônjuge.

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Questão diferente é a de, após o divórcio, o cônjuge que mais contribuiu para os encargos da vida familiar, ter direito a exigir do outro uma compensação resultante do facto de ter renunciado, de forma excessiva, à satisfação dos seus próprios interesses em benefício da vida em comum, designadamente, deixando para trás a sua carreira profissional e, daí lhe advindo prejuízos patrimoniais relevantes.

Tal prestação compensatória pode ser pedida ao outro ex-cônjuge no momento da partilha dos bens do casal, salvo se entre ambos vigorar o regime de separação de bens, conforme resulta do artigo 1676.º do Código Civil.

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As alterações do regime jurídico em matéria de alimentos entre ex-cônjuges resultaram da opção legislativa de permitir a livre dissolução do casamento, liberdade esta que tinha também que se refletir no plano patrimonial do divórcio, levando à consagração do atual regime relativo à obrigação de alimentos entre ex-cônjuges a qual, conforme supra explicitado, foi fortemente reduzida a limites mínimos, pautando-se pelo critério da necessidade estrita do cônjuge carecido de alimentos.