O contrato de comodato

O contrato de comodato é uma espécie contratual que existe e que é relativamente desconhecida pela maioria das pessoas e que, por isso, não recorrem ao mesmo com frequência.

Este contrato encontra-se previsto nos artigos 1129.º do Código Civil e seguintes, sendo definindo como: «o contrato gratuito pelo qual uma das partes entrega à outra certa coisa, móvel ou imóvel, para que se sirva dela, com a obrigação de a restituir

No que respeita à restituição, a lei prevê várias situações: uma é a de ser convencionado um prazo para a restituição, outra é a de, não tendo sido convencionado um prazo, a restituição ocorrer logo que finde o uso determinado para o qual a coisa (móvel ou imóvel) foi emprestada, devendo a mesma ocorreu independentemente de interpelação para o efeito e, uma terceira situação, em que não tendo sido convencionado prazo para a restituição nem determinado  o uso da coisa emprestada, o comodatário terá que a restituir logo que tal lhe seja exigido.

Pense-se, assim, numa situação em que foi celebrado um contrato de comodato relativamente a um imóvel, tendo ficado determinado nesse contrato, que o mesmo imóvel seria usado para habitação familiar dos comodatários.

Neste caso, poderia pensar-se que, só deixando os comodatários de habitar no imóvel e, assim, deixando de existir o uso que foi determinado para o imóvel, é que o proprietário do mesmo poderia exigir aos comodatários a restituição do imóvel pois, enquanto os comodatários continuassem a usar o imóvel para habitação familiar, teriam um título legítimo para o ocupar.

No entanto, convém precisar que o contrato de comodato, tal como resulta da sua noção, prevista no artigo 1129.º do Código Civil, tem associada, entre outras, a característica da temporalidade, pelo que não poderá um contrato de comodato subsistir indefinidamente.

Assim, sendo celebrado um contrato de comodato para uso determinado de um imóvel como no exemplo supra, para além desse uso dever estar expresso de modo inequívoco, esse uso também terá que ter uma duração limitada, razão porque o uso só será considerado como determinado se o mesmo estiver, também, delimitado em termos temporais no que respeita à necessidade que o comodato visa.

A razão de ser de tal, resulta diretamente da função social que se visa preencher com este tipo de contrato, o qual nasce de um favor que alguém faz, situação que não é conciliável com uma utilização prolongada, por exemplo, de um imóvel, pois, nesse caso, o contrato de comodato encobriria uma doação ou, até, um direito de uso e habitação.

Contudo, não será inválida uma cláusula constante de um contrato de comodato em que o comodatário pode utilizar o imóvel até à data da sua morte, sendo que a interpretação desta cláusula tem que ser feita no sentido de que, como resulta da lei, o proprietário do imóvel pode, mesmo nesta situação, a todo o tempo, denunciar o contrato de comodato e pedir a restituição do imóvel, atento quanto supra explicitado quanto à função social que o contrato de comodato tem.

Com efeito, esta interpretação é também confirmada pelo princípio geral contido no artigo 237.º do Código Civil que rege a interpretação e integração das declarações negociais em casos duvidosos, esclarecendo que nos contratos gratuitos (como é o caso do contrato de comodato), prevalece o sentido menos gravoso para o disponente, ou seja, no caso, do exemplo supra, para o proprietário.

Por fim, refira-se que a existência de um contrato de comodato não é um ónus que acompanhe o imóvel em caso de venda do mesmo, pois o comodato não tem eficácia perante terceiros, vinculando apenas quem outorgou o contrato e, em caso de venda, o contrato de comodato cessa.

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O contrato de trabalho e o contrato de prestação de serviços: algumas notas

O contrato de trabalho e o contrato de prestação de serviços: algumas notas

Conforme resulta do artigo 11.º do Código do Trabalho:

"Contrato de trabalho é aquele pelo qual uma pessoa singular se obriga, mediante retribuição, a prestar a sua atividade a outra ou outras pessoas, no âmbito de organização e sob a autoridade destas.

E, de acordo com quanto disposto no artigo 12.º n.º 1 do Código do Trabalho:

"Presume-se a existência de contrato de trabalho quando, na relação entre a pessoa que presta uma atividade e outra ou outras que dela beneficiam, se verifiquem algumas das seguintes características:

a) A atividade seja realizada em local pertencente ao seu beneficiário ou por ele determinado;
b) Os equipamentos e instrumentos de trabalho utilizados pertençam ao beneficiário da atividade;

c) O prestador de atividade observe horas de início e de termo da prestação, determinadas pelo beneficiário da mesma;

d) Seja paga, com determinada periodicidade, uma quantia certa ao prestador de atividade, como contrapartida da mesma;

e) O prestador de atividade desempenhe funções de direção ou chefia na estrutura orgânica da empresa

Diferentemente, um contrato de prestação de serviços é:

«…aquele em que uma das partes se obriga a proporcionar à outra certo resultado do seu trabalho intelectual ou manual, com ou sem retribuição».

Das definições legais, quer de contrato de trabalho, quer de contrato de prestação de serviços, resultam várias diferenças entre uma e outra situação.

No contrato de trabalho existe o fator de subordinação jurídica do trabalho, bem como a subordinação económica (exercendo o trabalhador uma atividade remunerada) e, a subordinação jurídica traduz-se num poder de autoridade e direção do empregador de, através de ordens, diretivas e instruções, conformar a prestação a que o trabalhador se obrigou. Nos contratos de trabalho, a entidade empregadora tem um poder de autoridade e direção do empregador.

Diferentemente, no contrato de prestação de serviços, o prestador obriga-se a um certo resultado do seu trabalho, o qual é efetuado por si, com características de autonomia, agindo da forma que considerar mais adequada, sendo a sua obrigação, a de uma obrigação de resultado e não existindo uma relação de subordinação jurídica.

 Numa ação judicial, cabe ao trabalhador provar os elementos constitutivos da existência de um contrato de trabalho, cabendo à parte contrária, a demonstração que a relação existente não configura a existência de tal contrato, não existindo, por isso, uma relação de trabalho subordinado.

A prova da existência de um contrato de trabalho, em juízo, resulta, por vezes, de situações em que a pessoa que alega ser trabalhador subordinado, assinou com a outra parte, um contrato de prestação de serviços, sendo que, na realidade, a sua situação, configura antes a existência de uma relação de trabalho subordinado, razão porque importa provar que, naquela concreta relação, existe (ou não), essa relação de trabalho subordinado.

Se, por exemplo, se provar que a pessoa que invoca a existência de um contrato de trabalho, tinha liberdade para escolher o seu horário de trabalho, as suas pausas, a sua agenda, recebendo dos clientes os valores que lhe eram devidos decorrentes da execução das suas tarefas (e não da sua disponibilidade para trabalhar) e, pagando, à outra parte, um percentual sobre esse montante, que não havia lugar ao pagamento de subsídio de férias e subsídio de natal, não existindo o regime fiscal e de segurança social próprios da vigência de um contrato de trabalho resultará que, em princípio, a relação em causa não configura uma relação de trabalho subordinado e, configurará antes, uma relação de prestação de serviços.

Quando se pretende provar a existência de um contrato de trabalho, é relevante demonstrar que, quem se arroga a qualidade de trabalhador, recebia ordens e orientações específicas da outra parte sobre o que deveria fazer, sobre a estipulação dos seus horários, sobre as ordens quanto à forma como deveria executar o seu trabalho, etc.

A prova da existência de um contrato de trabalho tem relevância, nomeadamente, ao nível das indemnizações a que o trabalhador tem direito, pelo que iremos continuar a falar-lhe sobre Direito do Trabalho.

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