Alguns efeitos patrimoniais da comunhão de adquiridos

Alguns efeitos patrimoniais do regime da comunhão de adquiridos

Conforme decorre do disposto no artigo 1724.º do Código Civil, consideram-se integrados no acervo patrimonial comum do casal, os bens que tenham sido adquiridos pelos cônjuges na constância do casamento, ressalvados os bens excetuados por lei que mantém a qualidade de bens próprios.

Assim sendo, se um casal, casado no regime da comunhão de adquiridos, edificar uma casa num terreno que seja bem próprio de um deles (porque lhe adveio por doação após o casamento) recorrendo, para o efeito, a um mútuo bancário contraído por ambos, este bem (terreno com casa construída) deverá ser considerado como bem próprio do cônjuge a quem foi doado o terreno para construção ou, pelo contrário, deverá ser entendido como um bem comum tomando em conta a edificação da casa, paga a expensas de ambos, com recurso a crédito bancário?

De acordo com o disposto no artigo 1726.º do Código Civil, os bens adquiridos, em parte, com dinheiro ou bens próprios de um dos cônjuges e, noutra parte, com dinheiro ou bens comuns revestem a natureza da mais valiosa das prestações.

Assim, por aplicação desta norma, decorrerá que o bem se modifica, passando a revestir a natureza de bem comum sendo que esta solução será, também, aquela que melhor se adequa ao regime da comunhão de adquiridos, na medida em que, neste regime ingressam, no património comum, todos os ganhos e bens recebidos pelos cônjuges durante a vigência do casamento (que não sejam excetuados por lei).

Deste modo, a edificação de uma casa, nos termos referidos, deverá considerar-se como abrangida pelo conceito de “bem adquirido” na constância do casamento, perdendo significado os termos de aquisição do terreno, doado apenas a um dos cônjuges.

Em conclusão, numa situação como a supra relatada, deverá passar-se a falar de um bem comum a ambos os cônjuges.

 

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A interdição, por anomalia psíquica, como causa prejudicial da ação de divórcio

A interdição, por anomalia psíquica, como causa prejudicial da ação de divórcio

 

De acordo com o artigo 17º do Código de Processo Civil, quem seja incapaz, pode estar representado em juízo, seja através de representante nomeado pelo tribunal, seja através de curador ad litis (em caso de urgência).

Por outro lado, resulta do artigo 1785º, nº 2 do Código Civil que o cônjuge declarado interdito pode intentar ação de divórcio, fazendo-o através do seu representante legal e, desde que autorizado pelo conselho de família.

Acresce que, se o representante legal do interdito for o outro cônjuge, ainda assim, a ação de divórcio pode ser intentada em nome do titular do direito de agir (o interdito), sendo o impulso processual concretizado por qualquer parente deste, na linha reta ou até ao terceiro grau da linha colateral, devendo estar devidamente autorizado pelo conselho de família.

Da conjugação destes dois preceitos resulta que, a interdição por anomalia psíquica, não impede que o interdito proponha uma ação de divórcio, desde que esteja devidamente representado.

Assim, ainda que previamente à ação de divórcio o cônjuge demandado nesses autos, tenha instaurado, contra o cônjuge demandante, uma ação especial de interdição por anomalia psíquica, esta ação não poderá ser considerada como causa prejudicial da ação de divórcio, na medida em que, esta ação de divórcio, independentemente da decisão a proferir nos autos de interdição por anomalia psíquica, deverá prosseguir os seus termos em face do regime da representação supra mencionado.

Do mesmo modo, ainda que a ação de interdição por anomalia psíquica venha a ser julgada procedente por provada e, em consequência, decretada a interdição, tal nunca terá como consequência, nos autos de divórcio, a absolvição da instância, mas apenas o estabelecimento, nos autos de divórcio, da representação judiciária do interdito.

Em conclusão, a ação de interdição por anomalia psíquica não constituiu causa prejudicial em relação à ação de divórcio instaurada pelo interditando contra o seu cônjuge, na medida em que será nos autos de divórcio que cumpre estabelecer se o cônjuge demandante é capaz ou se, sendo incapaz, se mostra necessária a nomeação de curador nos termos do artigo 17º do Código de Processo Civil.

 

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Anulação de casamento: o erro que vicia a vontade de casar

Anulação de casamento: o erro que vicia a vontade de casar

 

A matéria relativa ao erro atendível, que vicia a vontade casar encontra-se prevista no artigo 1636.º do Código Civil, que dispõe:

«O erro que vicia a vontade só é relevante para efeitos de anulação quando recaia sobre qualidades essenciais da pessoa do outro cônjuge, seja desculpável e se mostre que sem ele, razoavelmente, o casamento não teria sido celebrado

Da leitura deste preceito resulta que não é qualquer erro que vicia a vontade de casar, invalidando o casamento, sendo necessário que o erro recaia sobre as qualidades essenciais do outro cônjuge, devendo ainda este erro ocorrer antes do casamento, na medida em que os eventos futuros (após o casamento) não se apresentam como relevantes para efeitos da aplicação da previsão do artigo 1636.º do Código Civil e devendo ainda tratar-se de erro desculpável e determinante da vontade de casar.

Quanto ao erro sobre as qualidades essenciais do outro cônjuge, este erro refere-se à pessoa deste, englobando realidades como sejam: o seu estado civil, a sua condição religiosa, a sua nacionalidade, a prática de crime infamante, a vida e costumes desonrosos, a impotência, deformidades físicas graves, doenças incuráveis que sejam hereditárias ou contagiosas, etc.

Diferentemente, já não se apresentam como realidades que possam ser enquadradas como erro sobre as qualidades essenciais do outro cônjuges situações como sejam as mudanças de humor do cônjuge, as suas reais intenções ao querer celebrar casamento, a sua personalidade, os seus comportamentos, etc, as quais não podem servir de fundamento para acionamento da previsão do artigo 1636.º do Código Civil, não podendo, assim, fundamentar um pedido de anulação do casamento.

Assim, mesmo numa situação em que se venha a provar que, após o casamento, um dos cônjuges descobriu que o outro apenas se casou com ele para se garantir financeiramente tendo, inclusivamente, após o casamento, adotado posturas pouco corretas, como levantar dinheiro de contas bancárias comuns e tendo passado a ter amantes, tal não configura uma situação de erro sobre as qualidades essenciais do outro cônjuge, pois aqui está-se perante um caso em que o cônjuge que adotou as posturas referidas demonstrou ser uma pessoa pouco séria e aproveitadora, reportando-se tal a um problema de personalidade, que cai fora do âmbito previsional do artigo 1636.º do Código Civil.

 

 

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A modificação do regime de bens do casamento e a determinação do tribunal competente para apreciar da ação de simples separação de bens

A modificação do regime de bens do casamento e a determinação do tribunal competente para apreciar da ação de simples separação judicial de bens

O artigo 1714.º n.º 1 do Código Civil consagra a regra da imutabilidade das convenções antenupciais e dos regimes de bens legalmente fixados.

Dispõe esta norma nos seguintes termos:

«1. Fora dos casos previstos na lei, não é permitido alterar, depois da celebração do casamento, nem as convenções antenupciais nem os regimes de bens legalmente fixados

Ora, uma das exceções a esta regra encontra-se prevista na alínea b) do n.º 1 do artigo 1715.º do Código Civil, ao admitir que seja operada uma alteração ao regime de bens através da simples separação judicial de bens.

Com efeito, de acordo com quanto previsto no artigo 1767.º do Código Civil:

«Qualquer dos cônjuges pode requerer a simples separação judicial de bens quando estiver em perigo de perder o que é seu pela má administração do outro cônjuge

Esta separação tem que ser judicialmente decretada, através de ação movida, pelo cônjuge lesado contra o outro, conforme decorre do preceituado nos artigos 1768.º 1769.º, ambos do Código Civil.

Sendo intentada esta ação, após o trânsito em julgado da sentença que decretar a separação judicial de bens, é modificado o regime de bens, o qual passa a ser o da separação de bens, quando antes vigorava ou o regime da comunhão geral de bens ou o regime da comunhão de adquiridos.

Com a modificação do regime de bens, para o da separação de bens, importará proceder à partilha do acervo comum do casal, tal como ocorreria se o casamento tivesse sido dissolvido (artigo 1770. N.º 1 do Código Civil).

Desde já, importa destrinçar a separação judicial de bens da separação judicial de pessoas e bens, na medida em que aquela, uma vez decretada, modifica apenas a relação matrimonial quanto aos bens, mantendo inalterada a relação matrimonial quanto às pessoas, pelo que os cônjuges continuam a ter os mesmos direitos e deveres decorrentes do casamento.

Já na separação judicial de pessoas e bens, a separação produz efeitos, quer em relação aos bens, quer em relação às pessoas dos cônjuges.

Por esta razão, a ação de simples separação judicial de bens não se confunde com a ação de separação de pessoas e bens, com diferenças assinaláveis a nível processual, nomeadamente, o facto de aquela ter sempre carácter judicial e litigioso, seguindo o processo comum, contrariamente a esta que pode tramitar no quadro do mútuo consentimento, seja em tribunal, seguindo o processo especial de jurisdição voluntária previsto e regulado nos artigos 994.º e seguintes do Código de Processo Civil, seja junto da conservatória do registo civil, seguindo o processo previsto no artigo 931.º do Código de Processo Civil.

Assim sendo, é materialmente competente para conhecer da ação de simples separação judicial de bens a seção cível da instância local e não a secção de competência especializada de família, na medida em que a ação de simples separação judicial de bens não se enquadra em nenhuma das previsões constantes do artigo 122.º da Lei Organização do Sistema Judiciário.

Já quanto à ação de separação de pessoas e bens é materialmente competente para conhecer da mesma a secção de competência especializada de família, em decorrência de quanto previsto neste artigo 122.º n.º 1, alínea c).

 

 

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Doações entre marido e mulher

Doações entre marido e mulher

Um tema que não é muito falado, mas que, nem por isso, deixa de ter relevância, é o das doações efetuadas entre cônjuges.

Em que termos podem ser feitas, quais as suas restrições, qual a validade destas doações, são algumas das perguntas que se colocam e que importa esclarecer.

Desde logo, o primeiro aspeto a considerar, prende-se com o regime de bens do casamento pois, sempre que o regime da separação de bens resulte, não de uma escolha de ambos, mas de uma imposição legal - nos casos em que não foi precedido do processo preliminar de casamento ou nos casos em que, um dos nubentes tenha, à data do casamento, 60 anos - as doações, que sejam feitas entre marido e mulher, são nulas nos termos do artigo 1762º do Código Civil.

Importa, também, salientar que são proibidas as doações de bens comuns, resultando esta proibição do princípio da imutabilidade do regime de bens, com o qual se pretende proteger o património comum do casal, proteção esta que pode assumir relevância em matéria de salvaguarda dos direitos de credores de ambos os cônjuges.

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Sendo possível a doação entre cônjuges, uma das especificidades a ter em conta é a de que o doador pode, a todo o tempo, revogar a doação, sendo este direito irrenunciável, o que se explica pelo facto de se pretender evitar que, através de ascendente físico, intelectual ou moral, de um dos cônjuges sobre o outro, o cônjuge beneficiário da doação, possa extorquir - ao outro - bens conseguindo, por esta via, modificar o regime de bens em que casou.

Para acautelar este perigo de extorsão nas doações entre casados, a lei consagrou a livre revogação destas, sem necessidade de o cônjuge revogante ter que invocar qualquer justificação para tal, permitindo assim que, caso a doação tenha sido fruto da pressão do outro cônjuge, o doador possa destruir a doação feita, sem que o outro tenha que ter conhecimento de tal revogação e sem que se possa opor à mesma.

Este direito de livre revogação, encontra-se previsto apenas para as doações efetuadas entre casados, não separados judicialmente de pessoas e bens.

Com efeito, a separação judicial de pessoas e bens, apesar de não dissolver o vínculo conjugal, extingue o dever de coabitação entre os cônjuges e, quanto aos bens, a separação produz os mesmos efeitos que se produziriam com a dissolução do casamento.

Assim, numa situação de separação judicial de pessoas e bens, já não se verificam os riscos de extorsão que levaram à consagração legal da livre revogabilidade das doações entre casados, razão porque o direito de livre revogação se encontra previsto apenas para as doações entre casados, não separados de pessoas e bens.

Por completude quanto ao regime da livre revogabilidade previsto na lei, refira-se que, os herdeiros do cônjuge doador não podem revogar a doação que este haja feito.

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Outro aspeto a considerar é o de que as doações de um cônjuge ao outro, não se comunicam, seja qual for o regime de bens, o que equivale a dizer que, ainda que o regime seja o da comunhão geral de bens, o bem doado, por exemplo, pela mulher ao marido, será sempre considerado bem próprio deste.

Já quanto ao regime da caducidade das doações entre casados, a lei prevê, no artigo 1766º do Código Civil, três situações em que esta caducidade opera automaticamente:

- quando o cônjuge beneficiário da doação morra antes do doador, exceto se este confirmar a doação nos três meses seguintes à morte daquele;

- quando o casamento seja declarado nulo ou anulado;

- quando seja decretado o divórcio ou a separação judicial de pessoas e bens.

Tomando em conta a redação da alínea c) do nº 1, do artigo 1766º do Código Civil, que refere que a doação entre casados caduca em caso de divórcio ou separação judicial de pessoas e bens «por culpa do donatário, se este for considerado único ou principal culpado» e, tomando em conta que, com a Lei nº 61/2008, de 31 de outubro de 2008 deixou de existir o divórcio litigioso fundado na culpa de um dos cônjuges, colocou-se a questão de saber se, não podendo o divórcio ocorrer por culpa do cônjuge beneficiário da doação - não podendo este vir a ser considerado cônjuge único ou principal culpado pelo divórcio -, a causa de caducidade prevista na alínea c) do nº 1, do artigo 1766º do Código Civil devia, ou não, operar em caso de divórcio.

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A resposta a esta questão encontra-se na previsão do artigo 1791º, nº1 do Código Civil, na redação que lhe foi dada pela referida Lei nº 61/2008 que, a seguir se transcreve:

«1 – Cada cônjuge perde todos os benefícios recebidos ou que haja de receber do outro cônjuge ou de terceiro, em vista do casamento ou em consideração do estado de casado, quer a estipulação seja anterior quer posterior à celebração do casamento.».

Ou seja, por efeito do divórcio, os cônjuges perdem todos os benefícios, não carecendo o cônjuge de ser declarado, como era antes da entrada em vigor da Lei nº 61/2008, único e principal culpado. Um dos benefícios é o da doação que tenha sido feita entre casados.

Tomando em conta que, crê-se, por lapso, não foi alterada a redação da parte final da alínea c) do nº 1 do artigo 1766º do Código Civil, - que deveria ter sido adequada à nova redação do artigo 1791º do mesmo Código, que eliminou a referência ao cônjuge declarado único ou principal culpado -, deve ser considerado que esta se encontra tacitamente revogada na parte em que faz depender a caducidade da doação da exigência de o divórcio ter ocorrido por culpa do beneficiário da mesma sendo este considerado cônjuge único ou principal culpado.

Deste modo, a interpretação que deve ser feita da alínea c) do nº 1 do artigo 1766º do Código Civil é a de que, a doação entre casados, caduca sempre por efeito do divórcio. Neste sentido, encontramos o parecer nº 44/CC/2014, do Instituto dos Registos e do Notariado, datado de 18 de agosto de 2014. Também no sentido de que se deve fazer uma interpretação revogatória ou ab-rogante da alínea c) do nº 1, do artigo 1766º do Código Civil refere-se, a título de exemplo, o acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Coimbra, datado de 21 de fevereiro de 2017.

Conforme resulta do referido parecer, operando a caducidade por efeito do divórcio, terá que ser feito um novo registo de aquisição, pelo doador, invocando como causa a caducidade da doação, por forma a extinguir o direito na esfera jurídica do beneficiário da doação.

Caducando a doação, o doador pode determinar que esta reverta para os filhos do casamento, conforme previsão do artigo 1791º, nº 2 do Código Civil, com o que se pretende proteger os interesses dos filhos do casamento, fazendo-se reverter a doação a favor destes.

Seguindo de perto o aludido parecer nº 44/CC/2014 neste segmento, resulta que: «o registo a fazer, na sequência da caducidade da doação, deverá ser de aquisição a favor dos filhos do casamento, tendo por base a declaração de vontade do doador destinada a operar em face do divórcio, do efeito patrimonial extintivo em tabela e da existência de filhos comuns do dissolvido casal

As questões que acabámos de referir, apesar de não esgotarem o tema das doações entre casados, são as que, em termos gerais, se apresentam como mais relevantes e que, por isso, cumpre assinalar.