Família, Crise ou Esperança

Família, Crise ou Esperança

  1. Quando se fala de família, a primeira coisa a ter em conta é o como ela se define. A família, no seu modelo tradicional e jurídico, é constituída pela união de um homem e de uma mulher que, no amor recíproco, garantem a estabilidade necessária à geração dos filhos e a educação integral, até à autonomia de cada um deles. O par humano, o casal, com os seus filhos, constitui o fundamento de toda e qualquer família, família essa que, depois, se vai abrindo às gerações futuras.O mesmo Papa, na Exortação Apostólica, Christifideles Laici diz que a família é um espaço social onde a vida nasce, cresce e se desenvolve até à plenitude da felicidade de todos os seus membros. Então, o grande objectivo da família é a felicidade de todos.
  2. Há no entanto, duas definições de família que vale a pena conhecer. O Papa S. João Paulo II, na Exortação Apostólica, Familiaris Consortio, diz que a família é uma comunhão de pessoas ao serviço da vida para o desenvolvimento da humanidade. Esta definição tem três dinamismos: o da comunhão entre o homem e a mulher e os seus filhos, o do serviço à vida que se transmite e se educa, e o próprio desenvolvimento da humanidade que, com a família, cresce continuamente.
  3. No mundo contemporâneo apareceram muitos modelos de família, alguns deles, porém, conduzindo à destruição da própria estrutura familiar. A família patriarcal mantém a tradição inalterável. A família nuclear assegurou os elementos fundamentais da relação homem e mulher com a complementaridade dos seus filhos. Os outros modelos agora em voga comprometem a família, como referência fundamental no projecto de vida. É o caso da família uniparental, às vezes imprescindível, como acontece em situações de viuvez ou de mães solteiras. Sucede o mesmo com a família pluriparental, e famílias muitas vezes reconstruídas, mas incapazes de suportar as normais tensões do encontro de desconhecidos. Já não se fala de famílias entre pessoas do mesmo género, ou de pessoas sem família. Perante este universo negativo torna-se urgente reflectir sobre a família e tentar encontrar a referência modelo que respeita os valores fundamentais e que abre a porta à felicidade. São poucas as famílias referência na sociedade contemporânea.
  4. A família vive num défice de relações, uma crise centrada na negação das suas características fundamentais: a liberdade, a fecundidade e a felicidade. Há muitas famílias em que alguns dos seus membros perderam completamente a sua dignidade, pela perda da liberdade a que têm direito. Daqui, por exemplo, a violência doméstica. A fecundidade é hoje limitadíssima, fica-se muitas vezes num filho único ou no “casalinho”. É sabido que Portugal tem o índice de natalidade mais baixo de toda a Europa. No que se refere à felicidade, a falta de amor é frequente, com o divórcio, a separação, o contrair de outras relações. É esta rotura de unidade que compromete definitivamente a família. O processo educativo dos filhos também deixa muitas vezes a desejar. Os pais têm muito trabalho profissional, as casas estão vazias, os mais velhos foram colocados em residências meramente assistenciais. É esta crise de família, com todos estes contornos, que preocupa o Papa Francisco e o levou a convocar dois sínodos sobre a família. O documento conclusivo dos sínodos, a Exortação Apostólica, Amoris Laetitia ajuda a repensar a família em todos os seus aspectos. É tempo de renovarem-se as estruturas familiares, a ponto de estas se tornarem fonte de alegria no amor, razão de felicidade no sorriso das crianças, coragem e serenidade no tempo do sofrimento e referência em todas as situações da vida.
  5. Notam-se actualmente esforços positivos para levar a família ao lugar que sempre ocupou na vida das pessoas. Não pode esquecer-se a importância de ter uma mãe e um pai a quem se recorre sempre nas horas boas e nas mais difíceis. Reafirma-se a ternura de ver a continuação da vida no olhar de uma criança. É de sublinhar o carinho dos avós com missão específica de apoiar os pais na educação dos filhos. Voltar a dar à família esta missão é indiscutivelmente razão de esperança.É com alegria que se repara que há hoje uma melhor preparação para a constituição das novas famílias. Sobretudo as igrejas, católica e outras igrejas cristãs, fazem um esforço muito grande no acompanhamento dos jovens a partir dos primeiros namoros. Quando os jovens começam a viver um amor comprometido multiplicam-se cursos, sessões de estudo e tempos de oração, para que de uma maravilhosa relação afectiva possa nascer uma família cristã. A preparação para o casamento já se não preocupa exclusivamente com as características da festa. O grande acontecimento, o sacramento do Matrimónio, celebra-se na igreja com enorme exigência. Depois, estão a mudar os critérios da fecundidade. Há muitos casais novos com três e mais filhos o que é revelador da sua responsabilidade social. No tempo das normais crises, psicólogos e sacerdotes, ajudam a vencer as normais dificuldades do amor. Finalmente o processo educativo desenvolve-se de uma maneira responsável em muitos casos até à autonomia completa dos jovens que constroem a sua família. Podemos dizer que é um tempo de esperança. Assim sendo, longe de dizer mal das famílias, cada cidadão tem que contribuir à sua maneira para dar à família o lugar que lhe compete na construção de uma sociedade justa e fraterna.

Maio de 2017

Padre Vitor Feytor Pinto

Pároco da Igreja do Campo Grande

Vamos casar: detalhes práticos do processo

Vamos casar: detalhes práticos do processo

Quando duas pessoas decidem casar, existem vários detalhes práticos que têm que ser tratados, para que o casamento possa ocorrer.

Em primeiro lugar, há que ter em conta que, para casar, os noivos, se não forem ainda maiores de 18 anos, terão que, pelo menos, ter mais de 16 anos e estar devidamente autorizados para o efeito.

Também não poderá casar quem apresente demência notória, nem os maiores acompanhados (neste caso, deste que tal impedimento tenha sido devidamente declarado na decisão de acompanhamento).

Para além de outros impedimentos, nomeadamente, os resultantes da existência de relações de parentesco entre os noivos, também não poderá casar quem ainda se mantenha no estado de casado com outra pessoa.

Para que o processo de casamento se inicie, os noivos deverão, pessoalmente ou através de procurador, com poderes especiais para tal, iniciar o processo, junto de uma Conservatória do Registo Civil, onde, após declararem que pretendem casar um com o outro, indicarão se o casamento será civil, católico ou civil sob forma religiosa (no caso de a religião não ser a católica), o local onde pretendem casar, o dia e hora.

É também nesta altura que, os noivos, escolhem qual o regime de bens sob o qual pretendem casar, podendo também, em determinadas circunstâncias, escolher a lei que querem que seja aplicada na determinação do regime de bens.

Em alternativa, os noivos podem celebrar, num Cartório Notarial, uma escritura de convenção antenupcial que deverão apresentar na Conservatória do Registo Civil, para efeitos de determinação do regime de bens escolhido.

A escolha do regime de bens deverá ser precedida de aconselhamento legal pois, não é de somenos a compreensão dos vários regimes possíveis (comunhão geral de bens, comunhão de adquiridos e separação de bens) ou ainda a opção, por um regime que seja particular para o caso concreto do casal.

Para iniciar o processo, terão que ser apresentados os documentos de identificação de cada um dos noivos e, caso estes sejam estrangeiros, a respetiva autorização de residência, o passaporte ou documento equivalente.

A partir do momento da formalização do início do processo de casamento, poderão ser apresentados, por qualquer pessoa, motivos que impeçam o casamento. Se, tal acontecer e, por isso, o pedido for recusado, os noivos são notificados de tal decisão (pessoalmente ou por carta registada), podendo recorrer da mesma.

Não existindo qualquer à impedimento a celebração do casamento, os noivos dispõem do prazo seis meses para efetivar o casamento.

Finalmente, porque, por vezes, acontece, refira-se que se um dos noivos estiver representado, por procurador, a procuração terá que ter poderes especiais para casar e deverá ser outorgada através de documento assinado pelo representado e com reconhecimento presencial da assinatura. Da procuração deverá, ainda, constar a identificação completa do futuro cônjuge do mandante, bem como o regime de bens e se o casamento será civil, católico ou civil sob forma religiosa.

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Encargos com imóvel, responsabilidade pelo pagamento e divórcio

Encargos com imóvel, responsabilidade pelo pagamento e divórcio

Inúmeras vezes, um casal, para aquisição de casa própria, contrai junto de uma entidade bancária, um mútuo, que lhe permita a imediata liquidez para proceder ao pagamento do preço do imóvel que pretendem adquirir.

Uma vez adquirido o imóvel importa proceder ao pagamento mensal das prestações do mútuo, ao pagamento do seguro de vida, do seguro multirriscos do imóvel, do seguro do recheio da habitação e outras despesas.

Se esse casal tiver casado no regime da separação de bens, na falta de indicação em contrário e perante a presunção prevista pelo artigo 1403º, n.º 2 do Código Civil, as mesmas devem ser consideradas quantitativamente iguais.

Divorciando-se o casal, não raras vezes sucede que, ainda que estando o imóvel na titularidade de ambos, um dos ex-cônjuges proceda ao pagamento das prestações mensais devidas pelo mútuo bancário e pague outras despesas, como sejam as referentes ao seguro de vida, ao seguro multiriscos, etc., apesar de essas despesas serem da responsabilidade de ambos.

Ora, nos termos do disposto no artigo 524º do C. Civil, “o devedor que satisfizer o direito do credor além da parte que lhe competia, tem direito de regresso contra cada um dos condevedores, na parte que a este compete”.

Sendo que, de acordo com quanto previsto no art.º 516º do Código Civil “nas relações entre si, presume-se que os devedores ou os credores solidários, comparticipam em parte iguais na dívida ou no crédito, sempre que da relação jurídica entre eles vigente não resulte que são diferentes as suas partes”.

Mais, de acordo com o previsto no nº2 do artigo 1405º do Código Civil, “os comproprietários, separadamente, participam nas vantagens e encargos da coisa, em proporção das suas quotas”

Ou seja, não obstante um dos membros do ex-casal ter pago, a exclusivas expensas suas, as prestações bancárias e restantes despesas, importa referir que, os comproprietários têm obrigação de participar nos encargos com aquisição do imóvel, na proporção das suas quotas, o que equivale a dizer, na proporção de metade para cada um.

Deste modo, se um dos comproprietários tiver pago, a expensas suas, tais valores (prestação ao banco, seguros, condomínios, etc), este poderá exigir do outro o correspondente a metade de todos os valores que tenha pago, desde a data do divórcio.

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A partilha do acervo comum no regime da comunhão geral de bens

A partilha do acervo comum no regime da comunhão geral de bens

Com a dissolução do casamento, uma das consequência práticas é a necessidade de proceder à partilha dos bens comuns do casal, na medida em que, para além de cessarem as relações pessoais entre os cônjuges, cessam também as suas relações patrimoniais, situação que se encontra prevista no artigo 1688.º do Código Civil.

Conforme resulta do artigo 1689.º do Código Civil, os ex-cônjuges  receberão, para além dos seus bens próprios,  a sua meação no património comum, estando cada um deles obrigado a restituir aquilo que tiver em dívida para com o referido património.

De acordo com o artigo 1789.º n.º 1 do Código Civil, os efeitos do divórcio produzem-se a partir do trânsito em julgado da respetiva sentença, mas no que concerne às relações patrimoniais entre os cônjuges, os efeitos do divórcio retrotraem-se à data da propositura da ação.

Se o fundamento do divórcio for a separação de facto e a mesma ficar provada nos autos, qualquer dos cônjuges poderá requerer que os efeitos do divórcio retroajam à data da separação de facto.

Tendo os cônjuges casado no regime da comunhão geral de bens, de acordo com quanto disposto no artigo 1732.º do Código Civil, o património comum é constituído por todos os bens, presentes e futuros dos cônjuges, que não sejam excetuados por lei.

Para efeitos de partilha por divórcio, rege quanto previsto no artigo 1790.º do Código Civil, ou seja, nenhum dos cônjuges pode receber mais do que receberia se o casamento tivesse sido celebrado segundo o regime da comunhão de adquiridos.

Em termos práticos, esta regra implica que, perante a dissolução por divórcio de um casamento celebrado sob o regime da comunhão geral de bens, terá que, em primeiro lugar, determinar-se o valor que corresponderia ao quinhão de cada um dos cônjuges no património global, em cada um dos regimes (comunhão geral e comunhão de adquiridos).

Se o valor encontrado para o preenchimento do quinhão de cada um dos cônjuges, aplicando o regime da comunhão geral, levar a que o valor encontrado para o preenchimento do quinhão de um dos cônjuges seja superior ao valor que esse quinhão teria pela aplicação das regras do regime da comunhão de adquiridos, terá que reduzir-se o valor desse quinhão àquele valor, aumentando-se correspondentemente a quota do outro cônjuge.

Significa tal que, uma vez apurada a diferença de quinhões de cada um dos cônjuges em cada um dos regimes, nenhum dos interessados (ex-cônjuges) poderá receber um valor superior ao resultante da aplicação do regime da comunhão de adquiridos.

Esse limite quantitativo imposto pelo artigo 1790.º do Código Civil não implica uma alteração do regime de bens, pelo que a relação de bens deve ser apresentada de acordo com o regime de bens do casamento.
Ou seja, o que se pretende com este limite quantitativo não é alterar o regime de bens, mas sim não permitir que, numa situação de divórcio, um dos cônjuges acabe por beneficiar de um acervo que é comum por força do regime de bens e que, muitas vezes, inclui património de família, que se pretende seja passado de geração em geração mantendo-se, por isso, na família e que não deverá poder ser partilhado numa situação de divórcio que, se não houvesse este limite, permitiria que, por exemplo, bens que são da família do cônjuge marido acabem por passar para uma família terceira, por via de um novo casamento da cônjuge mulher, que por os ter recebido na partilha por divórcio, os levaria para um novo casamento, se não vigorasse este limite quantitativo.

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Arrolamento no âmbito de processo de divórcio

Arrolamento no âmbito de processo de divórcio

Nos termos do artigo 408.º n.º 1 do Código de Processo Civil, o procedimento cautelar de arrolamento, instaurado como preliminar ou como incidente da ação de divórcio tem como finalidade arrolar (listar) os bens comuns do casal permitindo-se, desta forma que, com a sua descrição, se conservem os bens arrolados existentes à data da realização do arrolamento.

De acordo com o mesmo artigo (artigo 408.º do Código de Processo Civil), sendo decretado o arrolamento dos bens, deverá ser nomeado como depositário dos mesmos o seu possuidor, salvo se, por exemplo, existirem razões que levem a considerar que pode existir uma situação de futura dissipação de bens, enquanto estiverem a correr os autos de divórcio.

Nestas situações, cumpre ao requerente do procedimento cautelar de arrolamento requerer, de forma fundamentada, que o possuidor dos bens não seja nomeado depositário dos mesmos.

No entanto, o procedimento cautelar de arrolamento não visa impedir a normal utilização dos bens arrolados, razão porque, uma vez efectivado o arrolamento, o mesmo não tem como resultado a apreensão efectiva dos bens, mantendo-se os bens no domínio dos seus titulares, na medida em que este procedimento cautelar não corresponde a uma partilha de bens, antes será um instrumento auxiliar dessa mesma partilha quando esta tiver lugar, sempre após o decretamento do divórcio entre os cônjuges.

Assim sendo, não pode, nos autos de arrolamento, ser requerido e deferido que, por exemplo, o produto de depósitos, aplicações, etc seja transferido, na proporção de metade, para as contas de requerente e de requerido exatamente porque, tal repartição, corresponderia já a uma partilha do acervo comum, quando o objeto do arrolamento não é efectivar a partilha mas sim, conforme supra referido, listar os mesmos, para que, após o decretamento do divorcio, se facilite os termos da partilha, sendo o arrolamento dos bens uma cautela processual que permite que, até ao momento em que a partilha possa ter lugar, o acervo comum se mantenha identificado e acessível para a futura composição dos quinhões de cada um dos ex-cônjuges.

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A regra da imutabilidade do nome e as suas exceções

A regra da imutabilidade do nome e as suas exceções

Nos termos do disposto no artigo 26º, nº 1 da Constituição da República Portuguesa, a todos é reconhecido o direito à identidade pessoal, o que corresponde a um direito de personalidade que integra o direito ao nome.

De acordo com o artigo 72.º n.º 1 do Código Civil:

«Toda a pessoa tem direito a usar o seu nome, completo ou abreviado, e a opor-se a que outrem o use ilicitamente para sua identificação ou outros fins

Mais, o legislador fixou regras para a atribuição do nome das pessoas conforme resulta de quanto previsto no artigo 1875º do Código Civil que, sob a epígrafe “Nome do filho” estabelece que:

1. O filho usará apelidos do pai e da mãe ou só de um deles.

2. A escolha do nome próprio e dos apelidos do filho menor pertence aos pais; na falta de acordo decidirá o juiz, de harmonia com o interesse do filho.»

Este artigo 1875.º do Código Civil tem, ainda, que ser conjugado com quanto previsto no artigo 103.º do Código do Registo Civil que, também, estabelece regras no que respeita à composição do nome, a qual não pode ser arbitrariamente efetuada pelos interessados, importando aqui salientar a regra do n.º 2 alínea e) deste normativo quanto aos apelidos que integram o nome.

Desta regra decorre que:

«Os apelidos são escolhidos entre os que pertençam a ambos ou só a um dos pais do registando ou a cujo uso qualquer deles tenha direito, podendo, na sua falta, escolher-se um dos nomes por que sejam conhecidos».

Uma vez estabelecido o nome, o princípio que vigora é o da sua imutabilidade, pelo que o mesmo não poderá ser alterado apenas pela vontade do interessado, o que significa que, para que o nome possa ser alterado, terá que se dar inicio a um processo especial de alteração do nome.

Contudo, porque sendo o nome um elemento de proteção da identidade e que o direito à identidade deve prevalecer sobre a inalterabilidade do nome, a lei consagra algumas situações, que constituem exceções a esta regra e, nas quais, bastará a simples manifestação de vontade do interessado na mudança do seu nome.

Estas exceções encontram-se identificadas no n.º 2 do artigo 104.º do Código do Registo Civil e correspondem às seguintes situações:

- alteração fundada em estabelecimento da filiação, adoção, sua revisão ou revogação e casamento posterior ao assento;

- alteração resultante de retificação de registo;

- alteração que consista na simples intercalação ou supressão de partículas de ligação entre os vocábulos que compõem o nome, ou no adicionamento de apelidos, se do assento constar apenas o nome próprio do registado;

- alteração resultante da renúncia aos apelidos adotados por virtude do casamento e, em geral, da perda do direito ao nome por parte do registado;

- alteração resultante do exercício dos direitos previstos no artigo 1876º do Código Civil que corresponde às situações em que não estando a paternidade estabelecida e sendo a Mãe casada com quem não é o Pai da criança, poderão a esta ser atribuídos os apelidos do marido da Mãe desde que essa declaração de vontade seja, inequivocamente, prestada por ambos perante o funcionário do registo civil e, nestes casos, o filho a quem foram atribuídos os apelidos do marido da Mãe pode, nos dois anos seguintes à maioridade ou emancipação, requerer a eliminação dos mesmos do seu nome;

- alteração que consista na mera adoção do nome inicialmente pretendido pelos interessados, quando o assento de nascimento tenha sido lavrado na pendência de consulta onomástica sobre a sua admissibilidade.

- alteração do nome próprio resultante da mudança da menção do sexo.

Fora destas situações, para que o nome possa ser alterado através do referido processo especial de alteração do nome, importará que o interessado apresente um requerimento dirigido ao Conservador dos Registos Centrais, podendo fazê-lo diretamente na Conservatória dos Registos Centrais ou, através de um pedido apresentado em qualquer Conservatória do Registo Civil.

No requerimento, o interessado terá que justificar a sua pretensão e indicar as provas que pretenda apresentar sendo que, porque na sequência da apresentação do requerimento, os serviços procederão à consulta da base de dados do registo civil, não é necessária a junção, pelo interessado, de certidões do registo civil.

Se a alteração do nome respeitar a um menor, a mesma deve ser requerida por ambos os pais, ou por um, com o acordo do outro.

Se o interessado, for um maior de 16 anos, deverá também apresentar um requerimento para a obtenção de certificado de registo criminal.

Para que se proceda no âmbito do processo especial de alteração de nome, efetivamente, à sua alteração, esta terá que se basear numa justa causa na medida em que o Conservador dos Registos Centrais apenas autorizará a alteração do nome se ficar convencido que a situação concreta justifica a exceção ao princípio da imutabilidade do nome.

Por exemplo, a vontade de remover um apelido que cause constrangimento de ordem psicológica, resultante de bullying sofrido em razão do apelido será uma situação que poderá justificar a alteração do nome.

Acresce que, dessa alteração não deverá resultar qualquer prejuízo para terceiros, o que se entende tomando em conta que o processo especial de alteração do nome não pode ser um meio para violar a regra da imutabilidade do nome.

Por exemplo, uma outra situação em que se poderá ponderar autorizar a alteração do nome é a de uma pessoa, viúva, querer voltar a usar o seu nome de solteira devendo, contudo, ter motivos atendíveis para o fazer.

Com efeito, a lei admite a modificação do nome por efeito do divórcio, nada dizendo quanto à possibilidade dessa modificação em razão da dissolução do casamento por morte, não sendo impossível existirem situações em que faça sentido admitir-se esta possibilidade pois, quer num caso, quer noutro, está-se perante o fim da sociedade conjugal.

A alteração do nome, ao contrário do que possa parecer à primeira vista, não corresponderá a um ato impulsivo, na medida em que o nome tem um grande impacto na identidade pessoal e psicológica da pessoa, podendo as razões que estão na base do pedido de alteração do nome serem complexas e terem profundas implicações no quotidiano de quem pede essa alteração, razão porque, fora dos casos excecionais supra mencionados, se impõe uma ponderação adequada dos motivos invocados pelo interessado para esse efeito.

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A importância da escolha do regime de bens: as convenções antenupciais

A importância da escolha do regime de bens: as convenções antenupciais

Em poucas palavras, podemos dizer que casar é celebrar o amor que une duas pessoas.

Já no plano do Direito, a lei civil define o casamento como um contrato que é celebrado entre duas que pretendam constituir família «mediante uma plena comunhão de vida» (artigo 1577.º do Código Civil).

E, neste contrato, existe uma regra: a da igualdade dos direitos e dos deveres dos cônjuges.

E, existe ainda uma outra regra: a direção da família pertence a ambos «que devem acordar sobre a orientação da vida em comum tendo em conta o bem da família e os interesses de um e outro.» (artigo 1671.º do Código Civil).

Casar tem, pois, muito que se lhe diga, para além da felicidade do projeto de vida em conjunto e, no meio de tanta alegria e amor, os futuros cônjuges esquecem-se de pensar e de planear as suas futuras relações patrimoniais. É que do casamento decorrem efeitos patrimoniais que deveriam ser pensados e ponderados pelos futuros cônjuges, devidamente aconselhados por quem os pode ajudar.

Não é indiferente casar num regime de separação de bens, num regime de comunhão de adquiridos ou num regime de comunhão geral de bens, como também não é indiferente casar com ou sem convenção antenupcial.

Mas, a verdade é que muitos futuros casais tratam da “papelada do casamento” sozinhos e nas nuvens e o casamento é um projeto a longo termo: um caminho de vida em comum que tem que ser planeado em vários aspetos e, um dos aspetos, é o patrimonial.

Muitos casais estão completamente desinformados no momento em que casam. Não escolhem regime de bens, não sabem que se não escolherem um regime de bens vigora o regime da comunhão de adquiridos e não sabem quais as implicações deste regime.

Se os futuros cônjuges se ocupam de tudo, se escolhem a igreja, se escolhem o local onde festejarão com família e amigos a celebração desta união de amor, se escolhem as ementas, se escolhem a lua-de-mel, se planeiam ter filhos, se pensam em nomes para os futuros filhos, porque não fazem um planeamento patrimonial que é, por eles, escolhido de forma ponderada e com conhecimento do que escolhem?

Fazer um planeamento patrimonial não é um desacreditar na vida em conjunto. É escolher com consciência o que ambos querem para a sua futura vida em comum.

Não deveriam as convenções antenupciais ser mais divulgadas e estimuladas? Sim.

Em regra, conhecem as pessoas o possível conteúdo de uma convenção antenupcial? Não.

Quem casa não deveria saber que, querendo, pode outorgar uma convenção antenupcial e antes de o fazer pensar, a dois, maduramente sobre o que pretendem? Sim.

Deve-se, por isso, divulgar a importância das convenções antenupciais nas quais os futuros cônjuges podem começar por fixar qual o regime de bens que querem, seja optando por um dos regimes previstos na lei (separação de bens, comunhão de adquiridos ou comunhão geral de bens) seja estipulando um outro regime que melhor se adeque ao que, efetivamente, pretendem desde que o conteúdo desse outro regime esteja dentro dos limites da lei.

É, ou não melhor, poder decidir e deixar, por escrito, o que ambos escolheram? Claro que sim.

Mas o conteúdo das convenções antenupciais não se limita à escolha do regime que deverá reger as relações patrimoniais do futuro casal.

É que, na convenção antenupcial, qualquer um dos futuros cônjuges pode, por exemplo, instituir terceiros como herdeiros ou legatários. Do mesmo modo, a lei permite que a convenção antenupcial contenha a «instituição de herdeiro ou a nomeação de legatário em favor de qualquer dos esposados, feita pelo outro esposado ou por terceiro …».

E, se os futuros cônjuges, escolherem o regime da separação de bens podem, na convenção antenupcial, renunciar reciprocamente à condição de herdeiro legitimário do outro.

É também possível, na convenção antenupcial, estabelecer cláusulas de reversão ou cláusulas fideicomissárias em relação às liberalidades que, na convenção antenupcial, sejam efetuadas.

Evidentemente, que o conteúdo de uma convenção antenupcial necessita de prévio acompanhamento técnico pois, por exemplo, a regulamentação da sucessão hereditária apenas pode ser objeto de convenção antenupcial nos termos permitidos no artigo 1700º do Código Civil (os quais estão referidos acima) e que, para poderem ter validade carecem de aconselhamento para evitar situações de nulidade das disposições efetuadas na convenção antenupcial.

O que é importante fixar é que quem casa deve planear o que pretende, em termos de futuro, deve fazê-lo ponderadamente e pode escolher ou desenhar, em conjunto, um regime que corresponde às suas convicções devendo ter o devido aconselhamento técnico para o efeito, na medida em que existem muitas figuras jurídicas que importa esclarecer e repercussões que têm que ser previamente explicadas.

Para além do que uma convenção antenupcial pode conter, em termos de conteúdo, é importante referir que existem matérias que não podem ser reguladas na mesma.

De tal cuida a previsão do artigo 1699.º do Código Civil que, restringindo o princípio da liberdade contratual, enumera o que não pode ser objeto de convenção antenupcial, como seja a alteração dos direitos e dos deveres dos futuros pais ou dos direitos e dos deveres dos futuros cônjuges, a alteração das regras sobre a administração dos bens do casal, etc.

E, se quem casar tiver filhos, ainda que maiores ou emancipados, não poderá ser escolhido o regime da comunhão geral de bens, nem poderão os futuros cônjuges convencionar a comunicabilidade dos bens que, no regime da comunhão de adquiridos são considerados como bens próprios dos cônjuges e que estão enunciados no artigo 1722.º n.º 1 do Código Civil.

Por fim, refira-se que a convenção antenupcial, deve ser celebrada por declaração prestada perante funcionário do registo civil ou por escritura pública, é livremente revogável ou modificável até à celebração do casamento desde que, quer na revogação, quer na modificação, consintam as pessoas que nela tenham outorgado ou os respetivos herdeiros.

Depois de celebrado o casamento, a regra é a de que não é permitido alterar, nem as convenções antenupciais, nem o regime de bens.

Claro está que se o casamento não for celebrado dentro de um ano ou se, vier a ser declarado nulo ou anulado, a convenção antenupcial caduca.

Muito ficou por dizer sobre as convenções antenupciais e os efeitos que se podem obter quando se pensa, a fundo, sobre o que se quer, antes de casar num projeto de vida até ao fim da vida, mas pensamos que, aqui, fica expressa a importância das mesmas e que mais vale estabelecer e regular o que se pretende pois só assim somos donos da nossa vontade, mesmo que se trate de uma vontade construída a dois.

Existem países, como o Reino Unido, onde as convenções antenupciais são um instrumento com conteúdo e efeito relevante, onde as pessoas pensam, com aconselhamento técnico, aturadamente sobre o que pretendem e essa devia ser a regra em Portugal.

Esperamos ter contribuído para ajudar quem nos lê a pensar sobre a importância de fazer uma convenção antenupcial.

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O regime imperativo da separação de bens

O regime imperativo da separação de bens

Conforme resulta do artigo 1720.º do Código Civil, a lei impõe que as pessoas que tenham completado 60 anos de idade, têm que casar sob o regime da separação de bens.

Compreende-se a existência desta norma e a razão que presidiu à mesma: a proteção de pessoas que, pela idade, se mostram mais vulneráveis a uma atuação de abuso por parte do outro cônjuge, procurando também dissuadir-se as uniões conjugais em que predominam os interesses financeiros.

Apesar de hoje em dia, a lei permitir que quem casa em regime de separação de bens pode prever a renúncia do cônjuges à qualidade de herdeiro, a verdade é que, em situações em que a aproximação e posterior casamento têm na sua base interesses patrimoniais, na prática, não será fácil fazer prova da existência deste interesse patrimonial e pode acontecer que não se preveja a renúncia à qualidade de herdeiros por parte dos cônjuges.

É evidente que nem todas as pessoas, mais novas, que casam com pessoas com 60 anos ou mais têm em mente um interesse patrimonial, mas porque a vida a todos ensina, o legislador entendeu por bem acautelar estes casamentos, impondo que o regime de bens seja imperativamente o regime da separação de bens.

Pode sempre questionar-se se, com o aumento da esperança de vida, não seria de repensar o limite dos 60 anos previsto na norma do artigo 1720.º do Código Civil e alterar o mesmo, para uma idade superior, na medida em que, hoje em dia, uma pessoa de 60 anos, em regra, está plenamente apta a avaliar e analisar comportamentos e a, por si, decidir, o que pretende para a sua vida.

No entanto, até ao momento, o legislador português não modificou a norma e, assim, vigora a imperatividade do casamento sob o regime da separação de bens a partir dos 60 anos de idade, pelo que, em termos práticos, conforme como resulta do artigo 1735.º do Código Civil, sendo este o regime de bens que vigora, do mesmo resulta que cada um dos cônjuges conserva o domínio e a fruição de todos os seus bens, presentes e futuros, podendo dispor dos mesmos livremente.

No entanto, nada obsta, a que no regime de separação de bens, os cônjuges optem por ter bens em regime de compropriedade, situação que tem contornos diferentes de uma comunhão, na medida em que a quota de cada um deles nesses bens, integra o seu património próprio.

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As novas regras relativas aos regimes patrimoniais dos casais internacionais na Europa

As novas regras relativas aos regimes patrimoniais dos casais internacionais na Europa

No passado dia 29 de janeiro de 2019, entrou em vigor o Regulamento (UE) 2016/1103, do Conselho de 24 de julho de 2016 o qual é, neste momento, aplicável em 18 Estados-Membros, a saber: Áustria, Bélgica, Bulgária, Croácia, Chipre, República Checa, Finlândia, França, Alemanha, Grécia, Itália, Luxemburgo, Malta, Países Baixos, Portugal Eslovénia, Espanha e Suécia.

Este regulamento, conforme referido, aplica-se aos regimes matrimoniais, ficando excluídas do mesmo matérias como sejam a capacidade jurídica dos cônjuges, a existência, validade ou reconhecimento de um casamento, as obrigações de alimentos ou, ainda a sucessão por morte do cônjuge.

Nos termos do presente regulamento, é definida a lei aplicável ao regime matrimonial de um casal internacional despistando-se, assim, o cenário de aplicação possível de várias leis atenta as conexões internacionais eventualmente existentes, passando definir-se qual o direito que deve prevalecer, seja durante o casamento, seja no quadro de uma partilha por divórcio ou separação ou, ainda, por morte de um dos cônjuges.

De acordo com o artigo 20º do regulamento, é aplicada a lei resultante das previsões legais do mesmo, independentemente de ser, ou não, uma lei de um Estado-Membro, aplicando-se esta lei a todos os ativos que estejam abrangidos pelo regime matrimonial em causa, independentemente da sua localização, ficando excluída a aplicação das normas de Direito Internacional Privado em vigor no Estado da lei aplicável por força do presente regulamento.

A lei aplicável pode ser fruto da escolha feita, seja pelos cônjuges, seja pelos futuros cônjuges, podendo estes designar ou alterar essa lei (aplicável ao regime matrimonial) desde que a escolha recaia ou sobre a lei do Estado da residência habitual dos cônjuges ou dos futuros cônjuges ou apenas de um deles, à data da conclusão do acordo ou, sobre a lei do Estado da nacionalidade de qualquer um dos cônjuges ou futuros cônjuges, à data da conclusão do mesmo acordo.

Ressalva-se, no número 2 do artigo 22º do regulamento que a alteração da lei aplicável ao regime matrimonial durante o casamento só produz efeitos para o futuro, salvo acordo em contrário do casal.

Não se estando perante uma situação de escolha da lei aplicável, o artigo 26º do regulamento define qual o Direito que se deve aplicar ao regime matrimonial.

Assim, aplicar-se-á a lei do Estado da primeira residência habitual comum dos cônjuges depois da celebração do casamento ou, na sua falta, a lei da nacionalidade comum dos cônjuges no momento da celebração do casamento ou, ainda, na sua falta, a lei do Estado com o qual os cônjuges, em conjunto, tenham uma ligação mais estreita aquando da celebração do casamento.

Caso os cônjuges tenham mais de uma nacionalidade comum (no momento em que casam), a lei aplicável ao regime matrimonial será a lei da primeira residência habitual dos cônjuges (após casarem) ou, na sua falta, a lei do Estado com o qual eles tenham uma ligação mais estreita (quando casam).

A lei aplicável, seja a lei escolhida por acordo, seja a lei determinada nos termos do regulamento, irá reger, entre outras matérias, a responsabilidade de um cônjuge pelas obrigações e dívidas do outro; os poderes os direitos e obrigações de qualquer um deles ou de ambos em relação aos bens; a dissolução do regime matrimonial, bem como a divisão, distribuição ou liquidação do ativo; a validade material de uma convenção nupcial; a oponibilidade do regime matrimonial a uma relação jurídica existente entre um dos cônjuges e terceiros.

Evidentemente que, as regras relativas a este regulamento não afastam a aplicação das disposições imperativas dos quadros legislativos dos Estados-Membros. Estas disposições imperativas, por serem aquelas cujo respeito um Estado-Membro considera fundamental para a salvaguarda do interesse público, determinam a sua aplicação em qualquer situação e independentemente da lei que, de outro modo, seria aplicada aos regimes matrimoniais, em vista da regras resultantes do regulamento.

O regulamento trata, ainda, outras matérias, como seja, por exemplo, a determinação do tribunal competente para apreciação de um conjunto de questões que, neste âmbito, se suscitem, regras estas que abordaremos em outro artigo.

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Renúncia do cônjuge à condição de herdeiro legitimário

Renúncia do cônjuge à condição de herdeiro legitimário

No dia 1 de setembro de 2018, entrou em vigor a Lei n.º 48/2018, de 14 de agosto, nos termos da qual se passou a reconhecer a possibilidade de renúncia recíproca dos cônjuges à condição de herdeiros legitimários um do outro, renúncia esta que deverá ser feita na convenção antenupcial, nos termos da qual é, também, convencionado como regime de bens a vigorar na constância do matrimónio, o regime da separação de bens.

Com efeito, a possibilidade de renúncia do cônjuge à condição de herdeiro legitimário do outro cônjuge é admitida desde que os cônjuges casem entre si no regime da separação de bens e, desde que tal renúncia seja recíproca, ou seja, que ambos renunciem a essa qualidade de herdeiros legitimários um do outro.

Refira-se, no entanto que, esta renúncia pode ser condicionada à sobrevivência ou não de sucessíveis de qualquer classe (bem como de outras pessoas) não se exigindo aqui que esta condição seja recíproca.

De todo o modo, a Lei n.º 48/2018 não desprotege completamente o cônjuge, pois permite que, em vida, o outro cônjuge lhe faça liberalidades (por meio de doações e legados) até à parte da herança que corresponderia à sua legítima, caso não tivesse renunciado à sua qualidade de herdeiro legitimário. Evidentemente, que poderá sempre acrescer o que vier a ser testado, em sede de quota disponível.

Pontualize-se, ainda, que o cônjuge sobrevivo que tenha renunciado à sua qualidade de herdeiro legitimário e se carecer de alimentos, não perde o direito aos mesmos, os quais serão prestados através dos bens da herança, nos termos previstos no artigo 2018.º do Código Civil. O cônjuge sobrevivo não perde, também, o direito às prestações sociais por morte.

Já no que respeita à casa de morada de família, a Lei n.º 48/2018 consagrou expressamente um regime de proteção ao cônjuge sobrevivo que tenha renunciado à qualidade de herdeiro legitimário, conferindo-lhe um direito real de habitação sobre a casa de morada de família se o imóvel em causa for da propriedade do cônjuge falecido. Este direito real de habitação perdurará pelo prazo de 5 anos, sendo que, se à data da abertura da sucessão, o cônjuge sobrevivo tenha 65 anos, este direito será vitalício.

Se à data da abertura da sucessão, o cônjuge sobrevivo não tiver 65 anos, mas caso se encontre numa situação de especial carência, pode o tribunal prorrogar este prazo de 5 anos de vigência do direito real de habitação e de uso do recheio.

Por outro lado, este direito real de habitação caduca caso o cônjuge sobrevivo não habite a casa por mais de um ano, ressalvando o legislador a situação em que tal ausência não lhe seja imputável.

Mais, tal direito real de habitação não será conferido ao cônjuge sobrevivo caso este seja proprietário de um imóvel sito no concelho da casa de morada de família ou neste ou nos concelhos limítrofes se a casa se situar nos concelhos de Lisboa ou do Porto.

Findo o prazo de vigência do direito real de habitação, o cônjuge sobrevivo poderá continuar a habitar no imóvel celebrando um contrato de arrendamento, devendo a renda ser fixada de acordo com as regras de mercado.

Por fim, durante o tempo em que habitar o imóvel e, em caso de alienação do mesmo, o cônjuge sobrevivo goza de direito de preferência.

Em suma, a nova Lei n.º 48/2018 permite a renúncia reciproca à qualidade de herdeiro legitimário do outro cônjuge, mas não deixa de consagrar um conjunto de direitos que permitem que o cônjuge sobrevivo goze de proteção jurídica em várias situações, salvaguardando, nomeadamente, o seu direito a alimentos (se dos mesmos necessitar) e garantindo um direito real de habitação ou um direito a celebrar contrato de arrendamento quanto à casa de morada de família, nos termos supra expostos, pelo que podemos concluir que esta lei, alterando o panorama sucessório anteriormente em vigor, teve o cuidado de não desproteger completamente o cônjuge.

 

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