O direito de usufruto e o direito de uso e habitação

O direito de usufruto e o direito de uso e habitação

Tanto o direito de usufruto como o direito de uso e habitação são direitos reais que permitem que, quem não é proprietário de um bem, o utilize e se sirva dele.

Enquanto que o direito de usufruto é um direito que permite ao seu titular que, desde que respeite o fim económico a que o bem em causa se destina, se possa comportar exatamente como se fosse proprietário do bem, nomeadamente (tratando-se de um imóvel), arrendando-o o direito de uso e habitação (quando incida sobre um imóvel), apenas permite ao seu titular que o utilize para a sua habitação (e da sua família) na estrita medida das suas necessidades.

Com efeito, decorre do artigo 1484º do Código Civil que, a extensão do direito de uso se mede pelas necessidades do seu titular, bem como pelas da sua família. Resulta daqui que o direito de uso e habitação não confere ao seu titular um direito de gozo pleno sobre a coisa (como acontece com o direito de usufruto), na medida em que está estabelecido como limite a este direito o critério da necessidade do titular e da sua família.

Esta referência às necessidades da família do titular do direito, na determinação da extensão do direito de uso e habitação, não implica que este direito também pertença aos elementos da família do seu titular. Pelo contrário: o direito de uso e habitação pertence apenas ao seu titular o que implica que, extinguindo-se o direito de uso e habitação em relação ao titular, o mesmo acontece em relação aos membros da sua família que, até então, em virtude do direito deste, também habitavam o imóvel sobre o qual incidia o referido direito.

Outra das características distintivas em relação ao direito de usufruto, consiste no facto de ao usuário-morador estar vedada a possibilidade de alienar ou transmitir o direito que tem. Com efeito, dispõe o artigo 1488º do Código Civil que: «O usuário e o morador usuário não podem trespassar ou locar o seu direito, nem onerá-lo por qualquer modo.»

Como refere Carvalho Fernandes em Lições de Direitos Reais, o direito de uso e habitação, ao estar condicionado à satisfação das necessidades pessoais e familiares do seu titular, não podendo ser alienado nem onerado, é um direito pessoalíssimo.

Ao não poder ser onerado, tal significa que o direito de uso e habitação não pode ser penhorado pelo que, caso exista uma execução pendente contra o titular de um direito de uso e habitação este direito não poderá ser penhorado sendo, nesta situação, um direito “inatacável”.

O mesmo não acontece se, o imóvel sobre o qual incide o direito de uso e habitação, tiver registada uma garantia real (hipoteca, penhora, arresto, etc) anterior ao registo da constituição do direito de uso e habitação. Nesta situação, caso a garantia registada seja executada e o imóvel em causa seja vendido em execução a verdade é que o direito de uso e habitação caduca.

Com efeito, dispõe o artigo 824º, nº 2 do Código Civil que: «Os bens são transmitidos livres dos direitos de garantia que os onerarem, bem como dos demais direitos reais que não tenham registo anterior ao de qualquer arresto, penhora ou garantia, com exceção dos que, constituídos em data anterior, produzam efeitos em relação a terceiros independentemente de registo.»

Em conclusão, o direito e uso e habitação, enquanto direito real com características que o tronam um direito pessoalíssimo é, de alguma forma, inatacável em sede de execução movida contra o seu titular mas, tal inatacabilidade não se mantém quando a execução é movida contra o titular do direito de propriedade do imóvel sobre o qual o direito incide e o registo da garantia executada é anterior à constituição do direito de uso e habitação.

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A atribuição, a título gratuito, da casa de morada de família

A atribuição, a título gratuito, da casa de morada de família 

Nos termos do artigo 931º, nº 7, do Código de Processo Civil, estando pendente ação de divórcio pode, o juiz (por iniciativa própria ou a requerimento de uma das partes) fixar um regime provisório quanto à utilização da casa de morada de família.

No âmbito desta medida cautelar, surge uma questão de particular importância que se prende com a possibilidade de, essa atribuição da casa de morada de família, poder ser feita a título gratuito.

Já em 2016, o Supremo Tribunal de Justiça havia entendido que a norma do artigo 931.º, nº 7, do Código de Processo Civil, ao ter uma redação «ampla, indeterminada e flexível» permite que o tribunal, baseando-se em critérios de equidade e justiça e ponderando todas as circunstâncias dos cônjuges, tanto pessoais como patrimoniais, opte por proferir uma decisão provisória que permita que o cônjuge mais carenciado possa utilizar o imóvel que é casa de morada de família, ainda que esse imóvel seja apenas da propriedade do outro cônjuge.

No momento em que seja proferida decisão provisória sem incluir a obrigação de pagamento, por parte do cônjuge que fica a utilizar provisória e exclusivamente a casa e, após o seu trânsito em julgado, não poderá o outro cônjuge (que é o proprietário do imóvel), vir posteriormente, por meio de uma nova ação, pretender fazer valer o direito a uma compensação que não ficou prevista na decisão provisória, por ter o tribunal entendido que a melhor solução, em termos de equidade e justiça, em função da valorização judicial do caso concreto, impunha a atribuição a título gratuito da casa de morada de família.

Esta solução, que tem vindo a ser sufragada em vários acórdãos, resulta do facto de se entender que a casa de morada de família deve ser utilizada pelo cônjuge que está em situação mais precária, impondo-se assim, a sua proteção, resultando esta solução na que se apresenta como a mais justa na composição do litígio.

É evidente que a decisão provisória a tomar pelo tribunal pode ainda, em face das especificidades do caso concreto, vir a atribuir a casa de morada de família a título oneroso, impondo ao cônjuge que fica com a utilização exclusiva do imóvel, o pagamento de uma contrapartida económica ao outro, podendo tal contrapartida ser de valor reduzido, se a tal conduzir a valoração prudencial das circunstâncias pessoais e patrimoniais dos cônjuges.

O uso exclusivo da casa de morada de família pelo cônjuge a quem a mesma foi provisoriamente atribuída é lícito, não podendo o outro cônjuge vir invocar a existência de uma situação de enriquecimento sem causa, exatamente porque existe uma causa consubstanciada na decisão judicial proferida.

Em conclusão, releva o entendimento jurisprudencial que sufraga a admissibilidade de atribuição provisória da casa de morada de família ao cônjuge mais necessitado, sendo essa atribuição feita a título gratuito e, ainda que, a propriedade do imóvel seja do outro cônjuge.

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Onde deve ser pedida a alteração da decisão de atribuição da utilização da casa de morada de família?

Onde deve ser pedida a alteração da decisão de atribuição da utilização da casa de morada de família?

 

Nos termos do artigo 990º, nº 4 do Código de Processo Civil, ainda que estejam findos os autos de divórcio, deve correr por apenso aos mesmos, o pedido de alteração da decisão de atribuição da utilização da casa de morada de família, na medida em que se está perante uma competência por conexão, o que significa que a competência de um tribunal pode ser alargada por via de um vínculo estabelecido em função das partes ou do objeto da causa.

Desta competência por conexão resulta que, a alteração da decisão de atribuição da utilização da casa de morada de família, não está incluída nas competências atribuídas às Conservatórias do Registo Civil, no Decreto-Lei 272/2001 de 13 de outubro.

Mais, não se deve entender que, nos casos em que estejam findos os autos de divórcio, a previsão do nº 4, do artigo 990º do Código de Processo Civil, colide com a previsão do artigo 5º, nº 1, alínea b) e nº 2 do mencionado Decreto-Lei 272/2001.

Ou seja, se o processo de divórcio tiver corrido na Conservatória do Registo Civil e, assim, aí tenha sido homologado o acordo relativo à atribuição da utilização da casa de morada de família, a alteração deste acordo, também por consenso, pode ser pedida perante a Conservatória do Registo Civil, nos termos do Decreto-Lei 272/2001.

Diferentemente, se não existir acordo quanto à alteração, este pedido já não será da competência da Conservatória do Registo Civil, mas sim dos Tribunais de Familia e Menores, fundando-se esta competência no nº 4, do artigo 990º do Código de Processo Civil, tomando em conta que com o Decreto-Lei 272/2001 a competência das Conservatórias do Registo Civil se cinge aos procedimentos tendentes à formação do acordo das partes.

Por fim, caso o divórcio tenha sido judicialmente decretado, a alteração da decisão relativa à atribuição da utilização da casa de morada de família, terá que correr por apenso aos autos de divórcio, ainda que já estejam findos, mesmo que exista consenso quanto à alteração a pedir.

Este é, nomeadamente, o entendimento sufragado no acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, em 7 de fevereiro de 2017, disponível para consulta em http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/75fd999c412cfa90802580df0052714a?OpenDocument

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