A condenação em multa por incumprimento da prestação de alimentos

A condenação em multa por incumprimento da prestação de alimentos

Dispõe o artigo 41º nº1 do RGPTC:


«1 - Se, relativamente à situação da criança, um dos pais ou a terceira pessoa a quem aquela haja sido confiada não cumprir com o que tiver sido acordado ou decidido, pode o tribunal, oficiosamente, a requerimento do Ministério Público ou do outro progenitor, requerer, ao tribunal que no momento for territorialmente competente, as diligências necessárias para o cumprimento coercivo e a condenação do remisso em multa até vinte unidades de conta e, verificando-se os respetivos pressupostos, em indemnização a favor da criança, do progenitor requerente ou de ambos.»

De acordo com a letra desta previsão legal, a condenação em multa pode ser determinada, ou oficiosamente pelo Tribunal ou a requerimento do Ministério Público ou do progenitor não faltoso.

Mais, de acordo com esta norma, a condenação em multa não implica que o progenitor faltoso incumpra de forma reiterada, pois a norma em causa não refere, como requisito para a sua aplicação, tal. Antes pelo contrário, tal condenação pode resultar apenas de um único incumprimento.

Acresce que, estando em causa o incumprimento da pensão de alimentos a menor, tal incumprimento assume gravidade, tomando em conta a natureza essencial desta obrigação a cargo do progenitor não guardião, impondo-se mesmo que o progenitor que está obrigado ao pagamento da pensão de alimentos tenha que colocar em primeiro lugar as despesas e as necessidades do menor e, só após, as suas próprias despesas.

Ora, estando em causa um incumprimento que se prolonga no tempo, mais grave tal conduta se torna, pois, mensalmente o progenitor obrigado a alimentos incumpre, prejudicando o menor e faltando ao cumprimento dos deveres que estão a seu cargo.

Em regra, a instauração de um incidente de incumprimento contém o não pagamento de várias prestações de alimentos, na medida em que, por regra, o progenitor guardião não dá entrada de um incidente apenas relativo ao não pagamento de uma pensão de alimentos.

Consideramos, por isso, que nos incidentes de incumprimento em que o Tribunal decide pela declaração do incumprimento deveria o progenitor faltoso ser imediatamente condenado em multa sancionando o Tribunal, de forma clara, o comportamento faltoso e atendendo, nomeadamente, na fixação do valor da multa ao valor das pensões de alimentos em falta, pois se é certo que o não pagamento de uma pensão de alimentos pode dar origem à condenação do progenitor faltoso em multa, também é certo que um comportamento reiterado ainda mais gravoso é.

Assim, num incidente de incumprimento por falta de pagamento de pensão de alimentos deve pedir-se a condenação do progenitor faltoso em multa, pois essa condenação não exige que se prove a reiteração da conduta, como não exige a gravidade dessa mesma conduta (ainda que a reiteração e a gravidade devam ser atendidas como factores para elevar o montante da condenação em multa).

Para além de que o próprio incumprimento faz presumir a existência de culpa por parte do progenitor faltoso, como decorre da aplicação das regras gerais (artigo 799.º do Código Civil).

A falta de culpa será sempre um ónus de prova a cargo do outro progenitor contra quem é instaurado o incidente de incumprimento, conforme resulta da regra do artigo 342.º n.º 2 do Código Civil.

Devem os Tribunais, o Ministério Público e os progenitores ser particular atentos a condutas de incumprimento de pagamento de prestação de alimentos devidas a menores e sancionar, de forma eficaz, tais condutas para que quem incumpra perceba que até o incumprimento, tem um custo monetário.


Gostou deste artigo? Deixe o seu comentário aqui em baixo. A sua opinião é importante para nós.

Subscreva também o nosso blogue para ficar a par das nossas novidades e informações.

Tem alguma questão? Entre em contacto connosco.

0
0

Quem é o responsável pelos documentos dos filhos?

Quem é o responsável pelos documentos dos filhos?

Por regra, na dinâmica de um casal, há sempre um dos membros que assume o papel de “guardião dos documentos” dos filhos. Tal não é um problema pois, sempre que o outro necessite de ter acesso aos referidos documentos, saberá onde os mesmos se encontram, ou, mesmo que não saiba, terá fácil acesso aos mesmos.

Quando o casal se divorcia e, não apenas nas situações em que existe alguma tensão entre o casal, coloca-se a questão de com quem ficam os documentos dos filhos menores.

Frequentemente, um dos progenitores, entende que deve ser, ou continuar a ser, “o guardião dos documentos” – independentemente até do facto de muitas vezes, os filhos viverem em regime de residências alternadas – e, por isso, recusa a entrega dos documentos em causa ao outro progenitor. Fazem-no porque acham “mais prático” ou porque entendem o outro progenitor “os vai perder”. Em casos extremos, fazem-no para exercer um poder sobre a vida do outro progenitor e, assim, perturbar o dia a dia do outro com os filhos.

Os documentos de uma criança são essenciais para, em caso de necessidade, se determinar a legitimidade de atuação da pessoa que a tem à sua guarda.

Por exemplo, se uma criança fica doente e tem que ir ao hospital, tem que ser exibido o seu documento de identificação e, possivelmente, o cartão de seguro de saúde, ou seja, quem acompanha a criança tem que ter os documentos consigo para os poder exibir.

Os documentos das crianças (aqui se inclui, para além do cartão de cidadão, o boletim de saúde infantil e juvenil, o boletim de vacinas e, quando existam, o cartão relativo ao seguro de saúde e o passaporte) são propriedade das crianças que são os titulares dos mesmos e, por isso mesmo, devem sempre, acompanhar as crianças.

Assim, resulta claro que, nas situações em que um dos progenitores se recusa a entregar os documentos dos filhos ao outro progenitor, aquele que se recusa a entregar não está a exercer um direito que tenha mas sim a reter documentação que não lhe pertence.

É tão evidente que os documentos pertencem à criança e, por isso, devem acompanhá-la que esta questão, por regra, não fica prevista nas decisões de regulação do exercício das responsabilidades parentais.

Contudo, por vezes, apesar de tal evidência existem situações, como as acima descritas em que, pela ação de um dos progenitores, o outro se vê impedido de ter consigo os documentos dos filhos, nos períodos em que os mesmos estão à sua guarda, causando por vezes transtornos relevantes no dia-a-dia.

Nestas situações o que pode, este progenitor fazer?

Mostrando-se impossível a resolução de tal questão através do bom senso e, caso o progenitor que tem consigo os documentos mantenha a recusa de disponibilização dos mesmos ao outro então, o progenitor impedido de ter acesso aos documentos do filho, terá que recorrer ao tribunal.

Para tanto deverá, previamente, interpelar formalmente, por qualquer meio escrito de que resulte prova de receção, o progenitor que retém os documentos, para que deixe de o fazer, facultando o acesso aos mesmos. Caso, ainda assim, este mantenha o comportamento, então deverá ser acionado um processo tutelar cível, no qual se requer ao Tribunal que ordene ao progenitor que retém os documentos do filho que altere a sua conduta.

Apesar de neste tipo de procedimentos em tribunal (em primeira instância) não ser obrigatória a constituição de mandatário, é sempre aconselhável que, previamente a qualquer atuação, seja consultado um advogado pois, muitas vezes, por falta de conhecimento, os progenitores iniciam processos de forma errada – ou não iniciam processos por não saberem que o podem fazer - , dando origem a situação que, em vez de resolver as situações de conflito as agudizam com todas as consequências nefastas que tal acarreta.

Gostou deste artigo? Deixe o seu comentário aqui em baixo. A sua opinião é importante para nós.

Subscreva também o nosso blogue para ficar a par das nossas novidades e informações.

Tem alguma questão? Entre em contacto connosco.

0
0

O dever dos pais de proteger a saúde dos filhos e o dever de promoverem a sua educação

O dever dos pais de proteger a saúde dos filhos e o dever de promoverem a sua educação

Com o início do ano letivo de 2020/2021 e, após a forma como o ano letivo anterior terminou, muitos pais encontram-se em situação de incerteza quanto à melhor decisão a tomar: mandar os filhos para a escola ou, em face do aumento de casos de contágio que têm vindo a ser noticiados, mantê-los em casa.

Por outro lado, a falta de informação quanto às medidas tomadas, pelo menos no que aos estabelecimentos de ensino público respeita, também contribui para a incerteza e dificulta a tomada de decisão.

Finalmente o desconhecimento quanto à forma de atuação das escolas em caso de suspeitas e/ou casos confirmados, agudiza a dúvida.

Estamos assim, perante uma situação em que os pais se vêm colocados entre decidir pelo direito dos filhos à educação e o direito dos filhos à saúde.

Em primeiro lugar importa referir que está em causa o ensino obrigatório (aqui se incluindo o ensino básico e o ensino secundário), ou seja, por regra, alunos entre os 6 e os 16 anos de idade.

Na presente data a legislação determina que todas as crianças deverão frequentar a escola num regime presencial.

A exceção à frequência presencial verifica-se se uma criança integrar, comprovadamente (através de atestado médico ou declaração médica), um dos grupos de risco.

Nesta circunstância os pais poderão requerer que a direção do estabelecimento de ensino frequentado pela criança, efetive o direito que estas crianças têm de acesso a apoio remoto o que deverá ser feito através da adoção de um regime excecional não presencial. Deverá/poderá ser implementado um regime misto, ou seja, um regime que combina atividades presenciais com sessões síncronas e com trabalho autónomo. Também poderá, se as circunstâncias assim o exigirem, ser determinado um apoio exclusivamente autónomo e/ou assíncrono.

A situação de doença da criança e o seu consequente enquadramento no grupo de risco, tem que ser transmitida, pelo encarregado de educação, que terá que juntar atestado ou declaração médica. 

No que respeita a crianças que não integrem o grupo de risco a situação é, como supra referido, a da obrigatoriedade de frequência presencial do estabelecimento de ensino.

Se, não obstante tal obrigatoriedade, os pais, ainda assim, optarem por não permitir a frequência escolar da criança, o que acontecerá é que, o estabelecimento de ensino, em face do número de faltas injustificadas que irá verificar, terá a obrigação legal de comunicar a situação à Comissão de Proteção de Crianças e Jovens pois, a verdade é que, por o direito à educação ser um direito da criança, entende-se que, quando uma criança falta, injustificadamente à escola, poderá estar a vivenciar uma situação de risco.

Após esta comunicação do estabelecimento de ensino, a Comissão de Proteção de Crianças e Jovens tem, obrigatoriamente, de averiguar a situação e, caso os pais mantenham a sua oposição à frequência presencial, então a Comissão terá que comunicar tal situação ao Ministério Público, junto do Tribunal de Família e Menores territorialmente competente.

Nesta circunstância o Tribunal de Família decidirá, após ouvir os pais (que terão oportunidade de explicar as razões pelas quais, apesar de a criança não se enquadrar no grupo de risco, optaram por não permitir a frequência presencial do estabelecimento de ensino), se a criança deverá, ou não, frequentar o estabelecimento de ensino presencialmente, sendo que esta decisão será tomada sempre tendo em consideração, em primeiro lugar, o superior interesse da criança, concretamente considerada.

A decisão de frequentar presencialmente, ou não, o estabelecimento de ensino – seja pelo tribunal, seja, previamente, pelos pais – deverá ser tomada tendo sempre em consideração que, em caso de conflito entre o direito à saúde e o direito ao ensino, deverá prevalecer o direito da criança à saúde.

Refira-se ainda que, caso a não frequência presencial do estabelecimento de ensino, por estas crianças que não integram o grupo de risco seja considerada justificada, as faltas que as mesmas deram serão consideradas faltas justificadas.

Finalmente importa esclarecer que são sempre consideradas justificadas as faltas decorrentes de isolamento profilático, determinado por doença infeto-contagiosa - aqui se incluindo a suspeita de contágio por Covid-19 - de pessoa que coabite com a criança, devendo tal situação de isolamento ser comprovada através de declaração da autoridade sanitária competente.

Em todas as situações de ausência justificada às atividades escolares, a criança tem direito a que lhe sejam aplicadas medidas de suporte à aprendizagem e à inclusão, as quais, nos termos legais, podem ser organizadas em três níveis de intervenção: medidas universais, medidas seletivas e medidas adicionais as quais deverão ser definidas pelos professores responsáveis e/ou pela escola, nos termos constantes do regulamento interno do estabelecimento de ensino em causa e que deverão ser adequadas à recuperação da aprendizagem em falta, garantindo-se a possibilidade de sucesso escolar das crianças impedidas de frequentar o estabelecimento de ensino presencialemnte.

Gostou deste artigo? Deixe o seu comentário aqui em baixo. A sua opinião é importante para nós.

Subscreva também o nosso blogue para ficar a par das nossas novidades e informações

Tem alguma questão? Entre em contacto connosco.

0
0

Encargos com imóvel, responsabilidade pelo pagamento e divórcio

Encargos com imóvel, responsabilidade pelo pagamento e divórcio

Inúmeras vezes, um casal, para aquisição de casa própria, contrai junto de uma entidade bancária, um mútuo, que lhe permita a imediata liquidez para proceder ao pagamento do preço do imóvel que pretendem adquirir.

Uma vez adquirido o imóvel importa proceder ao pagamento mensal das prestações do mútuo, ao pagamento do seguro de vida, do seguro multirriscos do imóvel, do seguro do recheio da habitação e outras despesas.

Se esse casal tiver casado no regime da separação de bens, na falta de indicação em contrário e perante a presunção prevista pelo artigo 1403º, n.º 2 do Código Civil, as mesmas devem ser consideradas quantitativamente iguais.

Divorciando-se o casal, não raras vezes sucede que, ainda que estando o imóvel na titularidade de ambos, um dos ex-cônjuges proceda ao pagamento das prestações mensais devidas pelo mútuo bancário e pague outras despesas, como sejam as referentes ao seguro de vida, ao seguro multiriscos, etc., apesar de essas despesas serem da responsabilidade de ambos.

Ora, nos termos do disposto no artigo 524º do C. Civil, “o devedor que satisfizer o direito do credor além da parte que lhe competia, tem direito de regresso contra cada um dos condevedores, na parte que a este compete”.

Sendo que, de acordo com quanto previsto no art.º 516º do Código Civil “nas relações entre si, presume-se que os devedores ou os credores solidários, comparticipam em parte iguais na dívida ou no crédito, sempre que da relação jurídica entre eles vigente não resulte que são diferentes as suas partes”.

Mais, de acordo com o previsto no nº2 do artigo 1405º do Código Civil, “os comproprietários, separadamente, participam nas vantagens e encargos da coisa, em proporção das suas quotas”

Ou seja, não obstante um dos membros do ex-casal ter pago, a exclusivas expensas suas, as prestações bancárias e restantes despesas, importa referir que, os comproprietários têm obrigação de participar nos encargos com aquisição do imóvel, na proporção das suas quotas, o que equivale a dizer, na proporção de metade para cada um.

Deste modo, se um dos comproprietários tiver pago, a expensas suas, tais valores (prestação ao banco, seguros, condomínios, etc), este poderá exigir do outro o correspondente a metade de todos os valores que tenha pago, desde a data do divórcio.

Gostou deste artigo? Deixe o seu comentário aqui em baixo. A sua opinião é importante para nós.

Subscreva também o nosso blogue para ficar a par das nossas novidades e informações.

Tem alguma questão? Entre em contacto connosco.

0
0

A obrigatoriedade do registo de casamento celebrado no estrangeiro

A obrigatoriedade do registo de casamento celebrado no estrangeiro

De acordo com o disposto no artigo 1651.º n.º 1 alínea b) do Código Civil:

«1. É obrigatório o registo:

… b) dos casamentos de português ou portugueses celebrados no estrangeiro…»

E, sendo obrigatório o registo do casamento, importa atentar ainda no artigo 1669.º do mesmo Código que, no que concerne à atendibilidade do casamento prevê que:

«O casamento cujo registo é obrigatório não pode ser invocado, seja pelos cônjuges ou seus herdeiros, seja por terceiros, enquanto não for lavrado o respetivo assento, sem prejuízo das exceções previstas neste Código».

E, também o artigo 2.º do Código do Registo Civil refere, em matéria de atendibilidade que:

«Salvo disposição legal em contrário, os factos cujo registo é obrigatório só podem ser invocados depois de registados».

De acordo com o artigo 69.º n.º 1 alínea a) do Código do Registo Civil, o registo do casamento é averbado ao assento de nascimento.

É, pois, obrigatório o registo do casamento de português celebrado no estrangeiro, resultando ainda que, enquanto o mesmo não estiver registado, não pode ser atendido, não produzindo efeitos, ou seja, não pode o casamento ser invocado, seja pelos cônjuges ou seus herdeiros, seja por terceiros.

Resulta, pois, que o registo do casamento é condição de eficácia ou produção de efeitos do próprio ato.

A razão de ser de tal obrigatoriedade resulta do facto de a lei considerar que, por razões de segurança e precisão, os factos mais relevantes no âmbito do estatuto pessoal e familiar das pessoas, como seja o casamento, têm que estar registados (no registo civil).

Esta regra comporta uma exceção que se encontra prevista no artigo 1601.º, al. c), do Código Civil, estabelecendo como impedimento dirimente absoluto, obstando ao casamento da pessoa a quem respeita:

«o casamento anterior não dissolvido, católico ou civil, ainda que o respetivo assento não tenha sido lavrado no registo do estado civil».

Esta exceção, que atribui efeitos ao casamento não registado, destina-se a evitar situações de bigamia, através da realização do registo do primeiro casamento, após a celebração do segundo casamento.

Deve, pois, ser atendida e cumprida esta regra que impõe a obrigatoriedade do registo do casamento, nos termos supra mencionados, até para que o mesmo possa ser invocado, nomeadamente, para efeitos patrimoniais.

Gostou deste artigo? Deixe o seu comentário aqui em baixo. A sua opinião é importante para nós.

Subscreva também o nosso blogue para ficar a par das nossas novidades e informações.

Tem alguma questão? Entre em contacto connosco.

0
0

A partilha do acervo comum no regime da comunhão geral de bens

A partilha do acervo comum no regime da comunhão geral de bens

Com a dissolução do casamento, uma das consequência práticas é a necessidade de proceder à partilha dos bens comuns do casal, na medida em que, para além de cessarem as relações pessoais entre os cônjuges, cessam também as suas relações patrimoniais, situação que se encontra prevista no artigo 1688.º do Código Civil.

Conforme resulta do artigo 1689.º do Código Civil, os ex-cônjuges  receberão, para além dos seus bens próprios,  a sua meação no património comum, estando cada um deles obrigado a restituir aquilo que tiver em dívida para com o referido património.

De acordo com o artigo 1789.º n.º 1 do Código Civil, os efeitos do divórcio produzem-se a partir do trânsito em julgado da respetiva sentença, mas no que concerne às relações patrimoniais entre os cônjuges, os efeitos do divórcio retrotraem-se à data da propositura da ação.

Se o fundamento do divórcio for a separação de facto e a mesma ficar provada nos autos, qualquer dos cônjuges poderá requerer que os efeitos do divórcio retroajam à data da separação de facto.

Tendo os cônjuges casado no regime da comunhão geral de bens, de acordo com quanto disposto no artigo 1732.º do Código Civil, o património comum é constituído por todos os bens, presentes e futuros dos cônjuges, que não sejam excetuados por lei.

Para efeitos de partilha por divórcio, rege quanto previsto no artigo 1790.º do Código Civil, ou seja, nenhum dos cônjuges pode receber mais do que receberia se o casamento tivesse sido celebrado segundo o regime da comunhão de adquiridos.

Em termos práticos, esta regra implica que, perante a dissolução por divórcio de um casamento celebrado sob o regime da comunhão geral de bens, terá que, em primeiro lugar, determinar-se o valor que corresponderia ao quinhão de cada um dos cônjuges no património global, em cada um dos regimes (comunhão geral e comunhão de adquiridos).

Se o valor encontrado para o preenchimento do quinhão de cada um dos cônjuges, aplicando o regime da comunhão geral, levar a que o valor encontrado para o preenchimento do quinhão de um dos cônjuges seja superior ao valor que esse quinhão teria pela aplicação das regras do regime da comunhão de adquiridos, terá que reduzir-se o valor desse quinhão àquele valor, aumentando-se correspondentemente a quota do outro cônjuge.

Significa tal que, uma vez apurada a diferença de quinhões de cada um dos cônjuges em cada um dos regimes, nenhum dos interessados (ex-cônjuges) poderá receber um valor superior ao resultante da aplicação do regime da comunhão de adquiridos.

Esse limite quantitativo imposto pelo artigo 1790.º do Código Civil não implica uma alteração do regime de bens, pelo que a relação de bens deve ser apresentada de acordo com o regime de bens do casamento.
Ou seja, o que se pretende com este limite quantitativo não é alterar o regime de bens, mas sim não permitir que, numa situação de divórcio, um dos cônjuges acabe por beneficiar de um acervo que é comum por força do regime de bens e que, muitas vezes, inclui património de família, que se pretende seja passado de geração em geração mantendo-se, por isso, na família e que não deverá poder ser partilhado numa situação de divórcio que, se não houvesse este limite, permitiria que, por exemplo, bens que são da família do cônjuge marido acabem por passar para uma família terceira, por via de um novo casamento da cônjuge mulher, que por os ter recebido na partilha por divórcio, os levaria para um novo casamento, se não vigorasse este limite quantitativo.

Gostou deste artigo? Deixe o seu comentário aqui em baixo. A sua opinião é importante para nós.

Subscreva também o nosso blogue para ficar a par das nossas novidades e informações.

Tem alguma questão? Entre em contacto connosco.

0
0

O Avô...

O Avô...

Até receber o desafio para escrever sobre a figura do avô, confesso que não tinha ainda meditado profundamente sobre essa minha condição que há já algum tempo tenho  a alegria de viver, em particular no momento em que procuro escrever este texto......

“-Espera João Maria que o avô tem de acabar aqui uma coisa e depois já te dá toda a atenção.”

Na sua simplicidade ser avô é ser duas vezes Pai, na medida em que vivemos os netos com o sentido de quem tem uma segunda oportunidade de vivência da paternidade e dessa forma ajudar os nossos filhos.

Mas é uma paternidade em muitos sentidos diferente e mais profunda, na medida em que o nosso papel educador, ou seja de quem educa no amor,  apesar de existente é de reserva e não de primeira linha o que o torna mais desejado e cada vez mais presente, mais concentrado, mais transbordante, mais apaixonadamente puro, com a liberdade de quem sabe ser a sua responsabilidade subsidiária e por isso mais cúmplice, menos formal, mais compreensiva e  companheira e como tal muito mais marcante por paradoxal que isso possa parecer à primeira vista....

E isso não é por acaso, por três razões principais.

Antes de mais porque o avô ao já ter uma vida profissional menos ativa, dispõe desse bem precioso que é o tempo, o que nos dá a disponibilidade para usufruir do crescimento dos netos como não se pôde com os filhos, num tempo que por ser normalmente mais curto é-nos a ambos avós e netos mais marcante.

Em segundo lugar por ser um amor muito mais infantil e nessa medida mais genuíno e desinteressado que a ambos marca em igual medida. Muitas vezes quando brinco ou interajo com os netos percebo que Deus nos permite voltar a ser criança....

Em terceiro lugar por ser uma missão de apoio aos nossos filhos, ajudando-os numa tarefa sempre incompleta que é a educação, que com a doçura típica dos anos vividos lhe dá uma “patine” diferente e por isso exemplo sempre passível de ser recordada de forma mais marcante.

“João Maria, o avô já te mostra o que está a fazer, dá só mais um minuto ao avô....”

Quando como profissional em assuntos de família me pedem para explicar a relação inter-geracional socorro-me muitas vezes da imagem da Trindade para o explicar, na medida em que o amor entre avós e netos é-o semelhante ao Espírito Santo (no caso o pai que está no meio, mas que mais não é do que a força geradora desse amor) e curiosamente na nossa vida são muitas vezes três pessoas em uma só. Nós somos na família, como elos de uma corrente, e muitas vezes ainda que não estejamos em contacto direto, o sentido e razão de ser da nossa função resulta dessa ligação que se prolonga e não se esquece.

“João Maria o avô está quase a ir combater o Ninjago....”

Na segunda oportunidade que temos de dar sentido a algo que foi criado por quem nós criamos, evidencia-se o verdadeiro poder divino do homem, na sua aliança criadora, de algo que deve ser nosso mas diferente de nós com um sentido próprio que nós podemos e devemos desejar que seja único e evolutivo  não um clone de uma obra que nunca acaba, pois “ninguém é progenitor de si mesmo.

A vida não se gera a si mesma; portanto, vem de um horizonte e, ao mesmo tempo, é impelida a gerar de novo.

O verdadeiro herdeiro é aquele que diz sim à proveniência, e porque o faz, sabe conquistá-la, sabe apropriar-se dela, torná-la sua e, portanto, sabe gerar algo novo.”

Como avô o que se me pede é exatamente ajudar a gerar algo novo, mas numa expressão muito simples e fácil:

“- João Maria o avô aqui vai como o Ninja verde!!!”

João Perry da Câmara

Avô/Advogado

Gostou deste artigo? Deixe o seu comentário aqui em baixo. A sua opinião é importante para nós.

Subscreva também o nosso blogue para ficar a par das nossas novidades e informações.

Tem alguma questão? Entre em contacto connosco.

0
0

A Importância de ter Avós

A Importância de ter Avós

Dou graças a Deus por ainda ter conhecido os meus quatro avós e por ter privado com os mesmos momentos dos quais guardo óptimas memórias.

Embora fosse pequeno quando partiu, sete anos para ser exacto, lembro-me vivamente do meu avô João. A sua boa disposição e paciência para crianças eram características que lhe faziam uma pessoa excepcional. Médico de profissão e vocação recordo-me bem de brincar com os seus materiais de trabalho e fingir que lhe dava consultas. Divertíamo-nos muito.

A minha avó Flor transmitiu-me uma boa disposição sem igual que ainda hoje se faz sentir apesar dos seus 90 anos de idade e ensinou-me o valor de uma boa anedota acompanhada com uma boa gargalhada. Se tenho bom humor sei perfeitamente de quem o herdei.

O meu avô Luís, que também já partiu há relativamente pouco tempo, marcou-me muito pela sua cultura geral e ensinou-me a apreciar os pequenos prazeres da vida.

A minha avó, Petita, transmitiu-me os valores da Fé, da coragem e da piedade. Foi ela quem me apresentou à Igreja e por conseguinte aos códigos morais que procuro seguir.

Cada um desempenhou o seu papel de uma maneira ou de outra, e eu não poderia estar mais contente pela maneira como o desempenharam.

 Comecei com uma nota mais pessoal para evidenciar que os avós são construtores da nossa identidade. Não entrei em medicina como ambos os meus avôs, nem sei se sou tão engraçado como a minha avó Flor, ou então pio como a avó Petita, mas quero pensar que herdei as qualidades de cada um.

O papel dos avós é este mesmo. Através da sabedoria capitalizada por muitos anos de experiência que sejam transmissores dos valores e das lições que forma o carácter dos seus netos. Pois, quando com a idade a força nos falha, que a sabedoria nos valha.

Desde criança que me ensinaram que os avós são pais a dobrar. A dada altura compreendemos a verdade deste ensinamento quando experienciamos o seu carinho a dobrar. Por ventura não são tão exigentes como os pais, mas dão certamente o dobro dos mimos.

O papel educativo dos pais deve estar sempre correlacionado com um certo nível de exigência. O que não é mau e muitas vezes é necessário na formação de carácter, mesmo que custe a ambas as partes. Porém os avós já passaram por isso e nessa medida parecem querer ser mais brandos com os seus netos. Dessa maneira são importantes educadores para o humanismo.

Considerando a família como a célula central da sociedade, é de extrema importância sabermos escutar quem habita esta Terra há mais tempo. Apesar dos choques geracionais e da conflitualidade de valores é de extrema importância que saibamos cuidar da memória daqueles que cuidaram de nós e para além de cuidar da memória cuidarmos deles.

Num tempo em que atribuímos cada vez mais à vida humana uma visão utilitarista, mais preocupada com o que se produz do que o que se ensina, é relevante prestarmos atenção às necessidades dos avós. Estarmos na linha da frente do cuidado e acompanhá-los, não deixá-los ao abandono e à sorte. Bons avós nunca fariam isso a um neto em necessidade, logo a melhor maneira de lhes agradecer pela sabedoria transmitida em cuidando em vida e honrando a memória.

Um papel importantíssimo dos avós que eu não posso deixar de mencionar, trata-se da transmissão dos valores da tradição familiar. Ritos e histórias são os elos de ligação de povos, de nações, de comunidades e sobretudo de famílias.

Sempre fui interessado nas histórias de família. Não falo apenas dos feitos históricos e dos pergaminhos de antepassados distantes, falo das histórias de festas, episódios cómicos, episódios trágicos, que os avós puderam testemunhar e que por conseguinte são fonte histórica por excelência.

É nos possível olhar para os documentos e aprendermos sobre a história da família, mas para compreender a família é necessário falarmos com os nossos pais, tios e avós. Apesar das diferenças que temos dos nossos pais, umas mais profundas que outras, somos frutos da educação e da genética que nos atribuem.

Ao compreendermos os nossos pais podemos compreender-nos melhor. E a melhor maneira de compreender os nossos pais é compreendendo melhor os nossos avós e dessa maneira compreendemos melhor a família como um todo.

Ao compreender melhor a família como um todo atribuímos às tradições e aos ritos um significado mais profundo, desejando conservar os jantares de Domingo, os Natais e as Páscoas em família.

Muitos avós no Mundo, devido aos acontecimentos recentes, ficaram privados de estarem próximos da sua descendência. Apesar de todo o flagelo que isto nos causou, apenas podemos esperar que o desejo de reunião e da retoma dos ritos tenha ficado fortalecido, porque muitas vezes só sentimos falta do que não temos.

E há-de chegar o dia em que ficarei sem avós, e sentirei a falta de todos, como já sinto do Avô João e do Avô Luís. Mas seria uma tolice minha acreditar que não os posso consultar.

Os ensinamentos e as memórias ficam e no coração dos netos hão-de habitar um lugar especial, vivendo em nós para sempre.

Salvador Sommer Sacadura

Estudante, 21 anos

Gostou deste artigo? Deixe o seu comentário aqui em baixo. A sua opinião é importante para nós.

Subscreva também o nosso blogue para ficar a par das nossas novidades e informações.

Tem alguma questão? Entre em contacto connosco.

0
0

A urgência do acompanhamento de maior

A urgência do acompanhamento de maior

Nos dias de hoje, cada vez mais pessoas se debatem com situações em que têm que tomar decisões em representação de outra pessoa porque estas, por uma razão ou outra, não estão em condições de o fazer.


Quando se vivem situações destas, seja com pais, com filhos maiores, com o cônjuge ou com outra pessoa que nos é próxima, fica-se com a noção de que não é fácil fazê-lo seja a nível emocional, seja a nível legal.

Com efeito, a nível legal, para que se possam tomar decisões em representação de alguém que, por algum motivo, está incapacitado de o fazer, torna-se necessário que a pessoa incapacitada beneficie do estatuto de maior acompanhado.

O estatuto de maior acompanhado veio substituir a interdição e a inabilitação e aplica-se, de acordo com o disposto no artigo 138º do Código Civil, aos maiores de 18 anos que estejam impossibilitados de exercer de forma plena, pessoal e consciente os seus direitos ou de cumprir com os seus deveres.

Esta impossibilidade pode resultar de um vasto leque de situações que vai desde a saúde (física e psicológica) ao comportamento adotado pela pessoa em causa (por exemplo situações de alcoolismo, toxicodependência, vício de jogo, etc).

Quando se verifiquem os pressupostos para tal, o Tribunal, poderá decretar as medidas de acompanhamento, concretamente adequadas à situação do acompanhado. Poderá, por exemplo, ser determinada a representação geral ou especial. Poderão, também, ser determinadas medidas mais concretas como a administração total ou parcial dos bens do maior pelo acompanhante.

O acompanhante é designado pelo Tribunal e, para além da representação do maior, nos termos determinados na sentença, fica ainda com o especial dever de priorizar o bem-estar e a recuperação (sempre que esta seja possível) do acompanhado devendo com este manter uma relação próxima e visitá-lo, pelo menos, uma vez por mês.

A não ser em situações mais graves e excecionais a pessoa maior carecida de acompanhamento, mantém a capacidade para exercer os direitos de carácter pessoal, como por exemplo contrair casamento, estabelecer uma união de facto, ter filhos, etc.

Apenas se a situação do maior for de tal modo grave que seja imperioso restringir estes direitos é que, nesse caso, a sentença que decidir o acompanhamento, poderá determinar impedimentos ao exercício destes direitos.

O processo de acompanhamento de maior é, para além de urgente, um processo de jurisdição voluntária, o que significa que juiz pode utilizar critérios de conveniência e oportunidade na tomada de decisões e, bem assim, na alteração das mesmas sempre que se verifiquem situações supervenientes que justifiquem a modificação da decisão inicial.

O processo de acompanhamento de maior pode iniciar-se de uma de três formas: a requerimento do próprio maior, a requerimento do Ministério Público ou a requerimento de um terceiro com legitimidade para tal.
É nesta situação de início do processo a requerimento de um terceiro com legitimidade para tal (situação em que se incluem, por exemplo, os filhos em relação aos pais e, bem assim, os pais de filhos maiores carecidos de acompanhamento) que, muitas vezes, se encontram os maiores problemas e atrasos no desenvolvimento do processo.

Com efeito, quando o processo não é requerido pelo próprio, nem iniciado pelo Ministério Público, previamente à verificação da necessidade, ou não, da aplicação da medida há, obrigatoriamente, que verificar a capacidade do potencial beneficiário da medida, para se opor à aplicação da mesma.

É aqui que, não raras vezes, seja por atrasos nas notificações, seja por tentativas de evitar a aplicação da medida, seja ainda pela demora natural destas avaliações, por vezes, se perde tempo que, dependendo das circunstâncias concretas de cada caso, se pode revelar precioso.

É verdade que, conforme prevê o artigo 891º, nº 1 do Código de Processo Civil, podem ser decretadas providências cautelares, seja oficiosamente pelo Tribunal, seja a requerimento, sendo também verdade que, nos termos do artigo 139º, nº 2 do Código Civil, se prevê que em qualquer momento do processo podem ser determinadas medidas de acompanhamento provisórias e urgentes mas, a verdade prática é que, não raras vezes, estas medidas chegam demasiado tarde, principalmente quando em causa estão situações que envolvem idosos.

Assim, sendo certo que deverá ter-se todas as cautelas possíveis quando se trata de um processo que pode determinar a restrição do exercício de direitos de uma pessoa por si própria, deverá também ter-se muito presente que, estas situações, são por regras situações que se revestem de uma urgência que vai para além da urgência processual a qual determina que estes processos correr em férias.

Muitos destes processos têm situações complexas a carecer de resolução verdadeiramente urgente e imediata.

Gostou deste artigo? Deixe o seu comentário aqui em baixo. A sua opinião é importante para nós.


Subscreva também o nosso blogue para ficar a par das nossas novidades e informações.

Tem alguma questão? Entre em contacto connosco.

0
0

Falar de emoções

Falar de emoções

Neste período em que a maioria de nós ainda se sente mais desconfiada que desconfinada, mantêm-se os desafios à família no reajuste de rotinas e nas dinâmicas dos relacionamentos. Para muitos, este reajuste parece quase impossível de alcançar, mantendo a tranquilidade e sanidade mentais necessárias para o bem-estar emocional e psicológico da família como um todo, e de cada um em particular. O teletrabalho, a lida da casa, as necessidades fisiológicas e emocionais das crianças tornam-se frequentemente demasiadas bolas no ar para gerir, não deixando espaço para atividades de lazer, momentos de tranquilidade e comportamentos de autocuidado. 

As escolas mantêm, na generalidade, algum contacto com as crianças, privilegiando naturalmente os conteúdos letivos. Contudo, sendo este um tempo de aproximação da família nuclear e em que as interações entre pais e filhos se intensificam, é possível que estejamos a viver um momento de excelência para reforçar outras competências para além das intelectuais, tão ou mais relevantes para o bom desenvolvimento das crianças, nomeadamente as competências socioemocionais.

Em muitos casos, é, aliás, visível o impacto emocional da pandemia no surgimento de sintomas de ansiedade, inquietação, medo, aumento da frequência de birras, pensamentos repetitivos ou mesmo alterações do sono e apetite. Tal como os adultos, as crianças também podem experienciar nestas circunstâncias emoções difíceis de gerir, sendo importante que os pais promovam um ambiente facilitador do diálogo acerca destes assuntos.

Perante a situação actual de incertezas e insegurança é natural que os pais se sintam ansiosos, inquietos e inseguros. Assim sendo, é de suma importância aceitar estas emoções, não procurando evitá-las, nem compensando os seus sintomas. Reconhecer estas emoções sem oferecer resistência é muitas vezes o primeiro passo para diminuir a intensidade com que as sentimos. É essencial ter consciência de que é natural que nos sintamos ansiosos por não saber como e em que circunstâncias voltaremos a ter a rotina que conhecíamos. Deste modo, devemos manter presente que é expectável que nos sintamos frustrados pelo facto de, em muitos dos dias, não conseguirmos cumprir as metas a que nos tínhamos proposto, por ser tão difícil ter tempo para a família, para o trabalho e para nós próprios. Aceitar o que sentimos e procurar estratégias para lidar com as emoções que nos são mais difíceis de gerir pode ser a melhor forma de encontrar um novo equilíbrio.

Nesta perspectiva, a realidade das crianças não é muito diferente… também elas se viram a braços com uma mudança repentina na sua vida social e escolar e também elas perderam as rotinas que tão importantes são para a sua regulação. Talvez ainda mais do que para os adultos, a actual conjuntura é especialmente enigmática para as crianças e, deste modo, passível de criar inseguranças e ansiedade. Posto isto, de que forma podem os pais ajudar as crianças a lidar com as emoções mais desafiantes que podem surgir em tempos de pandemia, investindo simultaneamente nas suas competências socioemocionais?

Em resumo, as ferramentas socioemocionais são um pilar fundamental para o bem-estar psicológico, emocional e social, permitindo que as crianças aprendam a conhecer e gerir as suas emoções, estabelecendo relações positivas e empáticas, tanto com os pares, como com os adultos que as rodeiam. Para as ajudarmos a desenvolver uma inteligência emocional saudável, resiliente e consistente temos, inevitavelmente, de falar de emoções. Quanto mais vasto for o vocabulário emocional fornecido às crianças, maior facilidade estas terão em identificar o que sentem e compreender por que razão o estão a sentir. Por sua vez, esta capacidade para identificar e reconhecer as próprias emoções, facilita a comunicação dos estados emocionais a terceiros, bem como a adopção de comportamentos mais adaptativos. Todo o comportamento é, aliás, forma de comunicação pelo que os momentos de descontrolo, inquietação, euforia ou de isolamento nos podem fornecer informações valiosas sobre a saúde mental e emocional das crianças. Com base nestes comportamentos, podemos ajudar as crianças a compreender o que sentem, salientando as sensações que as emoções lhes provocam no corpo, dando nome às experiências emocionais e fazendo a ponte entre “o que sentem” (emoção) e “o que fazem” (comportamento). Gradualmente estas informações são interiorizadas e as crianças começam a fazer este trabalho autonomamente, tendendo a manifestar cada vez menos comportamentos desafiantes, o que permite também aos pais darem respostas mais adequadas às necessidades dos filhos.

Em tempos de pandemia e de alterações tão bruscas das rotinas, será precioso o investimento neste tipo de competências, fundamentais para o bem-estar de cada um de nós e da sociedade em geral.

Discutir o tema das emoções será certamente uma experiência enriquecedora para todos e um momento de fortalecimento dos laços familiares.

Mariana Belmar da Costa

Neuropsicóloga – Centro de Apoio e Intervenção no Desenvolvimento Infantil

Mariana Achiame

Psicóloga Clínica - Associação Ester Janz

Gostou deste artigo? Deixe o seu comentário aqui em baixo. A sua opinião é importante para nós.


Subscreva também o nosso blogue para ficar a par das nossas novidades e informações.


Tem alguma questão? Entre em contacto connosco.

0
0