Da Mediação Familiar e da Justiça para uma parentalidade tranquila

Da Mediação Familiar e da Justiça para uma parentalidade tranquila

 

Simão e Joana são pais de Francisco de seis anos de idade. No correr dos dias atribulados, Simão e Joana não se querem mais na mesma casa, na mesma mesa, no mesmo leito.

Separam-se e ameaçam-se reciprocamente de não mais verem o filho.

Simão deu entrada, no tribunal, de uma acção de regulação do exercício das responsabilidades parentais.

Algum tempo depois são chamados a uma Conferência de Pais onde ambos manifestaram a vontade inabalável de ficarem com Francisco na sua residência. O juiz fixa um regime provisório em que a criança permanece junto do pai e convive com a mãe em datas definidas. É solicitada a intervenção da Audição Técnica Especializada.

Convocada nova conferência de pais, tudo permaneceu na mesma, com Simão e Joana ainda mais zangados, de olhares quase fulminantes. Conhecem já a posição processual de cada um, conhecem o campo de batalha, só não conhecem todas as armas.

São elaborados os relatórios sociais com vista à marcação de julgamento e quase um ano e meio depois do início da acção judicial, chegamos ao dia de produzir prova sobre qual dos dois pais proporciona um quotidiano mais favorável à satisfação das necessidades do Francisco.

Ah…..por falar em Francisco, por onde tem andado ele neste longuíssimo entretanto? Sem dúvida, a circular entre pai e mãe zangados, cada vez mais zangados com o que tudo isso deixa transparecer para uma criança que, agora, já fez sete anos.

Decorreu o julgamento, extenso como se previa. Requerimentos e mais requerimentos, alegações que notoriamente indiciavam a manutenção da residência de Francisco com o pai.

No fim-de-semana seguinte, como de costume o pai faz 100 kms para levar o filho à mãe. A mãe não comparece no local de sempre.

Aguardam.

Nada.

Regressam.

O pai envia uma sms e a resposta chega: “Fica com ele. É teu, agora é todo teu.”

E de novo o Francisco, do alto dos seus sete anos, um menino grande que tem de se portar bem, como tantas vezes ouve, o que sentirá ele?

Teria de ser assim? Terá de ser assim tantas vezes? Somos capazes de ouvir em coro uníssono “não, nunca devia ser”, seguido da conformação “mas não temos alternativa”.

Temos sim, temos outras atitudes e outros caminhos possíveis. Vim aqui para vos deixar a dica do que há muito defendo como um outro caminho a trilhar para alcançar a paz social, enquanto fim último da justiça. Um caminho que permite poupar energias emocionais, poupar tempo e preservar afectos.

A Mediação é hoje um meio de resolução de conflitos, previsto e regulamentado na lei portuguesa. A pertença a uma união europeia assim o recomendou e assim o impôs. Confrontados com a existência de um conflito familiar, temos todos a possibilidade de escolher a mediação para através dela alcançarmos a solução mais adequada e mais justa no caso concreto.

Perante uma questão controvertida, dispomos de duas vias, o que é apanágio de sociedades ditas desenvolvidas. Entregamos o assunto ao tribunal para decidir de acordo com a convicção que vier a formar, ou pomos mãos à obra e construímos nós próprios a solução à medida da nossa realidade familiar. Nesse percurso devemos contar com a ajuda de um profissional devidamente qualificado, escolhendo um mediador do sistema público, ou um mediador privado, mas em qualquer dos casos inscrito nas listagens que se encontram disponíveis no site da Direcção Geral da Politica de Justiça, já que estes respondem a requisitos de formação reconhecida pelo próprio Ministério da Justiça.

O processo de mediação familiar desenvolve-se, então, num espaço profissional e acolhedor, onde todos os intervenientes são tratados de igual forma, onde têm igual oportunidade de falar das suas emoções, dos seus interesses e das suas necessidades e onde o mediador não formula juízos de valor, simplesmente legitima as partes enquanto pessoas que vivenciam dificuldades para as quais estão interessadas em encontrar uma solução exequível. Uma solução que não dê lugar a sucessivos incumprimentos e porque os próprios são os obreiros da sua resposta, sentem-se muito mais predispostos ao cumprimento do que numa qualquer solução que lhes seja imposta.

Cabe aqui referir que a mediação não é panaceia para todos os males. Ao longo dos mais de vinte anos que dedico à prática, ao estudo e ao ensino do tema sou com frequência questionada sobre tal, e a resposta inevitável é a de que nem todos cabemos nos mesmos fatos, nem todos respondemos de igual forma à mesma medicação. Porque haveriam os conflitos de caber todos na mesma forma de resolução e aí obter respostas eficazes? É com a diversidade de caminhos e de abordagens disponibilizadas ao cidadão, que se enriquece uma sociedade que aspira alcançar um elevado índice de paz social, mas um facto é certo, quanto mais precoce for o recurso à mediação maior a probabilidade de se conseguir trabalhar a comunicação das pessoas desavindas e como consequência alcançar um acordo satisfatório para os seus destinatários. Antes de conhecerem o campo de batalha deveriam conhecer a mesa da negociação assistida.

Uma última referência, que se julga da maior pertinência para o tema em reflexão, é a da ligação da mediação a outras actividades profissionais com intervenção nestas matérias. Falamos de magistrados, advogados e psicólogos, chamados à colação em direito da família. É urgente a aceitação, o respeito e a interligação entre todos. Cada um tem um papel diferente, mas complementar no apoio às famílias.

Para que todos os Franciscos saiam do centro do conflito dos pais e permaneçam no centro da sua cooperação, na nobre tarefa da parentalidade.

Anabela Quintanilha

Mestre em Direito com especialização em Justiça Alternativa, advogada, mediadora familiar e formadora

 

 

 

Gostou deste artigo? Deixe o seu comentário aqui em baixo. A sua opinião é importante para nós!

Subscreva também o nosso blogue, para ficar a par das nossas novidades e informações.

Tem alguma questão? Entre em contacto connosco

0
0

As deslocações da criança ao estrangeiro com um dos pais e a desnecessidade de autorização do outro

As deslocações da criança ao estrangeiro com um dos pais e a desnecessidade de autorização do outro

 

Por hábito, quando uma criança se desloca ao estrangeiro, acompanhada apenas de um dos progenitores, aquele que se desloca com a criança, considera que tem que se fazer acompanhar de uma autorização escrita do outro.

Ora, tal não corresponde a uma exigência legal, conforme resulta do artigo 23º, do Decreto-lei n.º 83/2000 de 11 de maio, na redação introduzida pelo Decreto-lei nº 138/2006 de 26 de julho.

É a seguinte a previsão deste artigo 23º:

«1 - Os menores, quando não forem acompanhados por quem exerça o poder paternal, só podem sair do território nacional exibindo autorização para o efeito.

2 - A autorização a que se refere o número anterior deve constar de documento escrito, datado e com a assinatura de quem exerce o poder paternal legalmente certificada, conferindo ainda poderes de acompanhamento por parte de terceiros, devidamente identificados.

3 - A autorização pode ser utilizada um número ilimitado de vezes dentro do prazo de validade que o documento mencionar, a qual, no entanto, não poderá exceder o período de um ano civil.

4 - Se não for mencionado outro prazo, a autorização é válida por seis meses, contados da respetiva data.»

Da leitura do n.º 1 deste artigo resulta que, quando um pai, que exerça as responsabilidades parentais, pretenda viajar com a criança, não necessita de obter qualquer autorização do outro, para o efeito.

No entanto, e em termos práticos, esta autorização escrita acaba por ser necessária na medida em que as transportadoras aéreas têm, como regra, a exigência de tal autorização.

Assim sendo: «… se a transportadora aérea exige uma autorização da progenitora à margem da lei o apelante deve reagir na sede própria, que não é, seguramente, o Tribunal de Família e Menores.» (cfr, acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 11 de outubro de 2017, em www.dgsi.pt).

 

Gostou deste artigo? Deixe o seu comentário aqui em baixo. A sua opinião é importante para nós!

Subscreva também o nosso blogue, para ficar a par das nossas novidades e informações.

Tem alguma questão? Entre em contacto connosco

0
0

A hipoteca legal como garantia da obrigação alimentar do menor

A hipoteca legal como garantia da obrigação de alimentos do menor

 

Conforme resulta do artigo 704º do Código Civil, as hipotecas legais são as que resultam imediatamente da lei não dependendo, a sua constituição, da vontade do titular do bem hipotecado.

De entre o conjunto de credores que têm hipoteca legal sobressai o credor de alimentos (artigo 705º, alínea d), do Código Civil).

No que respeita à abrangência das hipotecas legais, conforme resulta do artigo 708º do Código Civil, estas podem incidir sobre quaisquer bens do devedor.

Aos pais dos menores compete representar os filhos, compreendendo-se neste poder de representação o exercício de todos os direitos do menor (artigo 1881º do Código Civil).

Assim sendo, um progenitor, enquanto representante do menor, tem legitimidade para requerer o registo de uma hipoteca legal a favor do filho.

Com efeito, conforme resulta do artigo 706º, nº 2, do Código Civil, têm legitimidade para requerer o registo, entre outros, o administrador legal.

Assim, a incapacidade do menor é suprida pelo poder paternal.

O pedido de registo da hipoteca legal deve ser instruído com certidão da sentença judicial na qual é fixado o valor e a periodicidade dos alimentos a pagar ao menor.

Aquando do pedido do registo de hipoteca legal deve ser indicado o valor da hipoteca estabelecida a favor do menor para efeito do registo, devendo tal valor ser também indicado pelo progenitor que requer o registo da hipoteca legal, na medida em que, também aqui, atua em representação do menor, conforme resulta do já mencionado artigo 1881º do Código Civil.

 

Gostou deste artigo? Deixe o seu comentário aqui em baixo. A sua opinião é importante para nós!

Subscreva também o nosso blogue, para ficar a par das nossas novidades e informações.

Tem alguma questão? Entre em contacto connosco

0
0

Extensão do exercício das responsabilidades parentais

Extensão do exercício das responsabilidades parentais

 

A possibilidade de estender o exercício das responsabilidades parentais a terceiros que não os progenitores, encontra-se prevista nos artigos 1903.º, 1904.º e 1904º-A do Código Civil, sendo que os dois primeiros foram reformulados com a entrada em vigor da Lei 137/2015 de 7 de setembro, a qual introduziu também o artigo 1904º-A.

A ordem pela qual, em caso de impedimento de um dos progenitores da criança, decretado pelo Tribunal, poderão terceiros ser chamados, em caso de impedimento do progenitor não previamente impedido, a exercer as responsabilidades parentais de uma criança, está prevista no artigo 1903º do Código Civil figurando, em primeiro lugar, o cônjuge ou a pessoa que viva com qualquer um dos pais da criança e, apenas em segundo lugar, alguém da família de qualquer um dos pais da criança.

Desta nova redação resulta que se pretendeu dar uma importância ao cônjuge ou pessoa com quem o progenitor vive que, anteriormente não tinha, sendo que esta nova importância está diretamente relacionada com o facto de através do convívio se estabelecerem laços com a criança que poderão colocar o cônjuge ou a pessoa com quem o progenitor vive, em melhores condições de exercer as responsabilidades parentais de uma criança que, por exemplo, uns avós que não terão uma relação de dia-a-dia com a criança.

[hr height="15" style="zigzag" line="default" themecolor="1"]

Já se estivermos perante uma situação de morte de um dos progenitores, em que, por impedimento do progenitor sobrevivo, a quem, nos termos do nº 1 do artigo 1904º do Código Civil, caberia o exercido das responsabilidades parentais, este progenitor não possa exercer as mesmas, o nº 2 do artigo 1904º do Código Civil, mantém a ordem de preferência estabelecida no artigo 1903º, ou seja, em primeiro lugar o cônjuge ou pessoa que viva com qualquer um dos pais e, apenas em segundo lugar, alguém da família de qualquer um dos pais. Nestas situações, contudo, deverá ainda ter-se em consideração a eventual designação de tutor, efetuada em testamento, pelo progenitor falecido, a qual deverá, dentro do possível, ser respeitada.

Já para situações em que, a filiação da criança, apenas se encontra estabelecida quanto a um dos progenitores, como por exemplo nos casos de adoções singulares ou - mais raros – em que não foi possível estabelecer uma relação de paternidade, aplica-se o artigo 1904º-A do Código Civil cujo número 1, dispõe que:

«Quando a filiação se encontre estabelecida apenas quanto a um dos pais, as responsabilidades parentais podem ser também atribuídas, por decisão judicial, ao cônjuge ou unido de facto deste, exercendo-as, neste caso, em conjunto com o progenitor

O conteúdo dos mencionados artigos traduz também, a evolução que, o conceito de família tem vindo a sofrer aos longo dos anos, passando a valorizar-se, tanto social como legalmente, o afeto resultante das relações estabelecidas entre a criança e os cônjuges e/ou companheiros do progenitor.

Deixando assim a família de ser entendida apenas como o conjunto de pessoas que estão ligadas entre si por laços biológicos, para passar a incluir-se, no conceito de família, também as pessoas que entre si estabelecem laços afetivos relevantes, resultantes de relações de amparo psicológico, financeiro, emocional, etc, nas quais se incluem as relações com as crianças.

[hr height="15" style="zigzag" line="default" themecolor="1"]

A nova redação dada pela Lei 137/2015, de 7 de setembro, aos artigos 1903º, 1904.º e o conteúdo do novo artigo 1904º-A do Código Civil, remete-nos para o conceito de paternidade sócio-afetiva, na medida em que, em causa, estão situações que, na sua base têm o afeto estabelecido entre uma criança e alguém que, com a mesma não tem qualquer relação biológica mas que, ao nível do exercício da parentalidade de facto age como se tal relação existisse, comportando-se como Pai, ou como Mãe da criança.

Concretamente, quanto ao artigo 1904ºA do Código Civil, veio permitir-se que, em determinadas circunstâncias – e, sempre que apenas exista o estabelecimento de filiação quanto a um progenitor -, seja criado um vínculo que não sendo de filiação é-lhe equiparável em termos de exercício de responsabilidades parentais conjuntamente com o progenitor com filiação estabelecida, sendo o estabelecimento deste vinculo decorrente de uma prévia relação de afeto estabelecida com a criança.

Este vínculo decorrente do afeto, após decisão judicial que o decrete, passa a ser vigente na ordem jurídica sendo equiparado ao vínculo decorrente de uma relação biológica, da qual resultam os mesmos direitos e deveres.

A decisão judicial que dá corpo à relação de afeto entre a criança e o terceiro que passará a ser titular do exercício das responsabilidades parentais terá que, como qualquer decisão relativa a uma criança proferida por um Tribunal, ser sempre norteada pelo superior interesse da criança, a qual, nos termos da lei, terá que se ouvida, devendo o tribunal, sempre que possível, estar suportado, sempre que possível, pela opinião de pedopsiquiatras, psicólogos e assistentes sociais, em face da delicadeza e complexidade da decisão que é chamado a tomar.

Com efeito, o impacto que o estabelecimento de uma filiação baseada no afeto, tem na vida da criança em relação à qual tal situação se verifica, impõe um exercício probatório consistente, nomeadamente, quanto ao nível de relação afetiva desenvolvida entre a criança e a madrasta ou padrasto o que implica, por exemplo, uma averiguação da real capacidade deste, enquanto futuro titular das responsabilidades parentais da criança em respeitar e promover a manutenção da relação desta com a família biológica do progenitor em relação a quem se encontra estabelecida a filiação, na medida em que a regra é a de que a manutenção de tais relações salvaguardará o superior interesse da criança.

[hr height="15" style="zigzag" line="default" themecolor="1"]

O campo de aplicação destes normativos é muito sensível e se a verdade é que se pode verificar o cuidado de adaptar a legislação vigente à evolução da família do ponto de vista social, também não é menos verdade que aplicar, em termos práticos, os conceitos de família legal e de família afetiva, nos termos dos normativos em causa, corresponde a um exercício do Direito que se exige de suma prudência tomando em conta que antes de tudo e, acima de tudo, importa respeitar os direitos da criança.

As alterações legislativas operadas ainda são muito recentes, pelo que não permitem a ponderação dos efeitos que uma decisão judicial proferida, por exemplo, nos termos do artigo 1904-ºA n.º 1 do Código Civil terá na vida da criança em causa e no círculo global das relações afetivas desta, seja com a sua família biológica, seja com a sua família afetiva.

Caberá, por isso, aos tribunais escrever a história judiciária do sucesso das finalidades que estes artigos tiveram em vista salvaguardar devendo o legislador estar e ser atento ao curso dos processos e aos desfechos judiciais, já prolongados no tempo para que, sempre, se mantenha a salvaguarda do superior interesse da criança.

 

Gostou deste artigo? Deixe o seu comentário aqui em baixo. A sua opinião é importante para nós!

Subscreva também o nosso blogue, para ficar a par das nossas novidades e informações.

Tem alguma questão? Entre em contacto connosco

0
0

A comparticipação nas despesas relativas a atividades extracurriculares

A comparticipação nas despesas relativas a atividades extracurriculares

 

No exercício das responsabilidades parentais colocam-se duas grandes questões: as de particular importância para a vida das crianças e as questões relacionadas com a sua vida corrente.

 

As questões de particular importância são aquelas que têm um impacto decisivo na vida das crianças e, por isso, têm que ser tomadas por ambos os pais. Falamos, por exemplo de decisões como a mudança de residência para um país estrangeiro, a realização, ou não, de uma intervenção cirúrgica que comporte riscos, nas situações em que a criança sofre de um problema grave de saúde, a autorização para casar, quando o filho tenha mais de 16 anos, etc.

 

Já as questões da vida corrente são aquelas que se relacionam com questões como a prestação de cuidados de saúde correntes, como sejam as visitas de rotina ao pediatra e a administração de medicação prescrita, tratamentos dentários e outros, desde que não comportem risco para a vida ou para a integridade física da criança, a escolha de atividades extracurriculares, a frequência de atividades de tempos livres, etc. Todas estas questões não precisam de ser decididas por ambos os pais, podendo aquele que reside com a criança tomar as decisões que considere adequadas.

 

Quanto a estas últimas, caso o progenitor residente tome uma decisão com a qual o outro progenitor não está de acordo, por exemplo quanto à frequência de uma atividade extracurricular, pode, em determinadas circunstâncias, colocar-se a questão de quem é o responsável pelo pagamento da atividade em causa.

 

Se da regulação do exercício das responsabilidades parentais, tiver ficado a constar que tais despesas estão sujeitas ao consentimento prévio de ambos, então, o progenitor que decidiu pela frequência da atividade, terá que suportar o seu custo sozinho, nada podendo exigir, a este título, ao outro.

 

Contudo, se da regulação do exercício das responsabilidades parentais, apenas tiver ficado a constar que, este tipo de despesas serão suportadas por ambos os progenitores, em partes iguais, então o progenitor que não concorda com a decisão do progenitor residente será, também ele, responsável pelo pagamento da despesa originada com a frequência da atividade em causa.

 

Importa pois que, na regulação do exercício das responsabilidades parentais, os pais estejam atentos aos termos em que o mesmo é redigido, nomeadamente no que respeita às questões relacionadas com a vida corrente da criança.

 

Gostou deste artigo? Deixe o seu comentário aqui em baixo. A sua opinião é importante para nós!

Subscreva também o nosso blogue, para ficar a par das nossas novidades e informações.

Tem alguma questão? Entre em contacto connosco

0
0

A avoenga e a bisavoenga no ordenamento jurídico português

A avoenga e a bisavoenga no ordenamento jurídico português

 

Percorridas as normas relevantes do ordenamento jurídico português, verifica-se que o mesmo consagra apenas o direito ao estabelecimento da maternidade e da paternidade, respetivamente, nos artigos 1814.º e 1869.º do Código Civil, nada se encontrando regulado quanto ao estabelecimento da avoenga e da bisavoenga.

Corresponderá tal a uma lacuna ou a uma proibição legal de estabelecimento da avoenga e da bisavoenga?

As proibições legais têm que resultar expressamente da lei ou, não estando expressamente previstas, terão que decorrer, de forma inequívoca, da interpretação da lei.

Ora, do regime jurídico do estabelecimento da filiação, não decorre qualquer proibição relativamente ao pedido tendente à fixação da avoenga ou da bisavoenga, por recurso a uma ação judicial com vista a estabelecer tal.

Mais, o estabelecimento da ascendência familiar de uma pessoa com o conhecimento detalhado da sua árvore genealógica traduz-se numa interesse legítimo a que terá que corresponder um direito de personalidade, direito esse diretamente ligado ao conhecimento da historicidade pessoal de cada individuo, o qual se encontra consagrado na Constituição da República Portuguesa e que não pode ficar limitado à possibilidade de estabelecimento da maternidade e da paternidade, na medida em que o direito à identidade pessoal engloba o direito à historicidade pessoal, o qual inclui necessariamente o conhecimento da identidade dos progenitores, o que nos remete para o direito ao estabelecimento da avoenga e da bisavoenga.

Assim, a inexistência de uma previsão legal concreta quanto ao estabelecimento da avoenga e da bisavoenga não poderá resultar de uma proibição legal a tal estabelecimento, mas antes de uma lacuna da lei que tem que ser integrada, nos termos do artigo 10.º do Código Civil, o que impõe o recurso ao regime jurídico do estabelecimento da filiação materna e paterna, na medida em que estando em causa o conhecimento da sua ascendência, os interesses do filho, do neto ou do bisneto são necessariamente idênticos, pelo que se preenche a lacuna com recurso à analogia com o supra referido regime.

[hr height="15" style="zigzag" line="default" themecolor="1"]

O direito ao estabelecimento da bisavoenga foi recentemente tratado no acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto em junho de 2017, onde o que estava em causa era o direito de um bisneto a ver judicialmente declarado que determinada pessoa, já falecida, era seu bisavô, num contexto em que não se encontrava estabelecida a filiação paterna da sua avó, não estando também, consequentemente, estabelecida a avoenga materna da mãe do autor da ação.

Para a resolução da questão jurídica em causa – direito ao estabelecimento da bisavoenga – o Tribunal da Relação do Porto não encontrou obstáculo no facto de, por exemplo, já se encontrar caduco o direito ao estabelecimento da filiação paterna da avó do autor, na medida em que em causa não estava o direito da avó do autor da ação a instaurar a ação de investigação de paternidade mas sim o direito do autor a ver judicialmente reconhecida a sua ascendência, no caso, a sua bisavoenga, por se estar perante pessoas diferentes e, consequentemente, com direitos diferentes, pelo que não poderá a caducidade do direito da avó do autor determinar a caducidade do direito deste a ver estabelecida a sua bisavoenga.

Este direito de personalidade corresponde a um direito que nasce na esfera jurídica de cada sujeito não estando dependente de direitos pré-existentes na esfera jurídica de outrem não podendo, por isso, ser afetados na sua existência pelo comportamento de terceiros podendo, por isso, ser exercido autonomamente pelo seu titular, sendo certo que o exercício destes direitos de personalidade vai ter reflexos na esfera jurídica dos terceiros, seus ascendentes. Com efeito, o estabelecimento da bisavoenga do autor da ação implica, necessariamente, o estabelecimento da filiação paterna da sua avó e avoenga da sua mãe.

[hr height="15" style="zigzag" line="default" themecolor="1"]

O Tribunal da Relação considerou a doutrina que sobre esta questão jurídica se tem vindo a pronunciar a propósito da caducidade do direito de investigar a maternidade e a paternidade tendo transcrito, por exemplo, o entendimento de Jorge Duarte Pinheiro constante da obra “O Direito de Família Contemporâneo”, nos seguintes termos: «… ao paralisar totalmente o direito de investigar, por causa de uma atuação censurável do investigante, não contempla a posição de terceiros que possam estar legitimamente interessados no estabelecimento da filiação entre o investigante e o pretenso pai (v.g., dos filhos do investigante: o direito à identidade ou historicidade pessoal não se reduz ao conhecimento e reconhecimento do parentesco no 1.º grau da linha reta).»

Este autor entende que a possibilidade de instaurar uma ação de investigação de paternidade fora dos prazos de caducidade previstos no artigo 1817.º do Código Civil, deverá existir sempre que esteja em causa o “exercício do direito à identidade pessoal e do direito de constituir família”, limitando-se apenas a caducidade prevista neste artigo à obtenção de efeitos sucessórios.

Este entendimento traduz-se, em termos práticos, no afastamento da possibilidade de produção de efeitos patrimoniais resultantes do exercício do direito ao estabelecimento da avoenga e da bisavoenga.

Ou seja, os direitos patrimoniais decorrentes de tal estabelecimento não podem operar na medida em que radicam na esfera jurídica daquele que poderia ser herdeiro, pelo que tendo-se extinguido, por exemplo, pelo não exercício, o direito ao estabelecimento da sua filiação e consequente qualidade de herdeiro, não poderá tal qualidade de herdeiro, mais tarde, ser reconhecida por via indireta, através do direito de representação, a quem pretende ver reconhecida a sua avoenga ou bisavoenga.

No caso dos autos, o reconhecimento da bisavoenga do autor da ação não lhe confere a qualidade de herdeiro, por via do direito de representação da sua falecida avó materna, na medida em que, na esfera jurídica desta, por ter caducado o direito ao estabelecimento da sua filiação paterna, não existiam direitos sucessórios quanto ao bisavô do autor.

De quanto supra exposto resulta que o reconhecimento do direito ao estabelecimento da avoenga ou da bisavoenga tem que conviver com a perda do direito patrimonial na esfera jurídica do ascendente relativamente ao qual terá que se fixar a filiação.

[hr height="15" style="zigzag" line="default" themecolor="1"]

Concluímos com o acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto, supra citado, nos seguintes termos:

«Sendo omissa no registo civil a paternidade da avó materna do Autor e tendo já caducado o direito desta e dos seus descentes instaurarem ação de investigação de paternidade – artigo 1817.º do Código Civil -, a ordem jurídica não impede que o Autor, seu neto, peça em tribunal declaração judicial de que ele (neto) é bisneto da pessoa que identifica como pai da sua avó materna.

O reconhecimento da existência do direito de um neto ou bisneto a obter a declaração de que certa pessoa é seu avô ou bisavô, não implica o renascimento de direitos patrimoniais que os seus ascendentes tenham perdido por ter decorrido o prazo estabelecido no n.º 1 do artigo 1817.º do Código Civil, dentro do qual podiam ter instaurado a ação de investigação de maternidade/paternidade».

 

Gostou deste artigo? Deixe o seu comentário aqui em baixo. A sua opinião é importante para nós!

Subscreva também o nosso blogue, para ficar a par das nossas novidades e informações.

Tem alguma questão? Entre em contacto connosco

 

0
0

Atualização do agregado familiar para efeitos de IRS de 2017 - prazo até 15 de fevereiro de 2018

Atualização do agregado familiar para efeitos de IRS de 2017 – prazo até 15 de fevereiro de 2018

Se não for efetuada, até 15 de fevereiro, a atualização da composição do agregado familiar - bem com outra informação relevante para a liquidação de IRS de 2017 - a Administração Fiscal utilizará, para efeitos de declaração automática de IRS (a qual abrange cerca de três milhões de agregados) os dados que tinha em 2016 calculando, com base nesses dados, o imposto a liquidar e os reembolsos.

A atualização desta informação deverá ser feita até 15 de fevereiro, na medida em que esta é a data limite para validar as faturas de despesas feitas ao longo do ano de 2017.

Para além do número de dependentes, é também possível, no Portal das Finanças, atualizar dados relativos à identificação do imóvel, no qual o agregado familiar, tem a sua residência permanente.

Por outro lado, os casais com guarda conjunta de filhos, em regime de residência alternada estabelecido por acordo de regulação do exercício das responsabilidades parentais, devem fazer a comunicação, pois a residência alternada tem impacto na atribuição da dedução fixa para cada dependente.

A Administração Fiscal defende que a “atualização da composição do agregado familiar tem ainda a vantagem para os contribuintes que estejam dispensados da entrega da declaração de IRS e que pretendam obter isenções de taxas moderadoras do SNS ou beneficiar da tarifa social de fornecimento de energia elétrica e benefícios sociais que exijam o prévio conhecimento da composição do agregado familiar para efeitos de IRS.”

0
0

Jornadas de Direito da Família e da Criança - O Direito e a Prática Forense

Jornadas de Direito da Família e da Criança - O Direito e a Prática Forense

 

16 e 17 de Janeiro

Auditório da Faculdade de Medicina Dentária

Entrada livre, sujeita a marcação prévia

0
0

Da (ir)responsabilidade na família. O valor do afeto.

Da (ir)responsabilidade na família. O valor do afeto.

A temática da responsabilidade civil no direito da família é controversa. Expressões como "o amor não se compra", "o amor não tem preço", "não se pode obrigar ninguém a amar" são comuns e representam ideias difíceis de combater.

A responsabilidade civil no seio da família é, pois, o tipo de responsabilidade mais delicado, uma vez que confronta dois princípios muito próximos em si mesmo o que coloca a dignidade do membro familiar acima de qualquer circunstância com aquele que dispõe sobre a função social da família e a limitação da intervenção estatal.

Por outro lado, a reparação civil por abandono afetivo lida com partes desiguais: os pais adultos, convictos dos seus direitos e deveres na sociedade e a criança alheia aos direitos e deveres, totalmente dependente de amparo e proteção.

Na verdade, não tem sido prática judiciária explorar as soluções legais existentes quando um dos pais deixa de estabelecer contacto com os filhos, mesmo que esse contacto seja desejado por estes ou pelo outro progenitor.

Assim, pela sua dimensão e abrangência, o abandono de crianças e jovens apresenta-se como um assunto complexo. Esta postura adotada pelos adultos contra crianças e jovens dentro da família é uma das formas menos visíveis de maus tratos, ocorrendo na privacidade da vida doméstica e sendo uma realidade transversal a todos os países e classes sociais.

São vários os estudos que corroboram que autorrepresentação, a sociabilidade e a capacidade dos futuros adultos na definição dos respetivos projetos de vida, dependem, em larga medida, da estabilidade e maturidade emocionais que lhes tenha sido assegurada, enquanto crianças, pelos cuidados materiais e afetivos dispensados por ambos os pais.

É, assim, fulcral, atender aos sentimentos de perda e à potencial quebra de autoestima que a rutura afetiva com qualquer dos progenitores pode provocar, sendo certo que este dano se torna mais gravoso no momento em que se dá o desenvolvimento da personalidade, uma vez que a criança necessita de paradigmas de comportamento e impressões de afeto que lhe transmitam direção e segurança para que se possa desenvolver plenamente.

Podemos argumentar que estamos perante um dano ao projeto de vida, definido por este como sendo aquele que transcende a integridade psicossomática do sujeito, isto é, um dano radical e profundo que compromete em alguma medida o ser do homem, afetando a liberdade da pessoa e frustrando o projeto de vida que livremente cada pessoa formula e através do qual se realiza como ser humano, ou seja, estamos perante um dano que impede que a pessoa desenvolva livremente a sua personalidade.

Contudo, é necessário que esses danos possam ser juridicamente considerados como causados pelo ato ou facto praticado, ou seja, que da conduta do progenitor hajam resultado os danos causados ao filho, as ignomínias na personalidade ou psicopatias isto é, deve estabelecer-se um nexo causal entre a ação do agente e o dano gerado. Ulteriormente, o dano sofrido pela criança deve corresponder a um objeto tutelado pelo ordenamento jurídico.

O afeto deve, assim, ser entendido como o princípio jurídico organizador das relações familiares e a sua ausência culposa provoca sofrimento naqueles que deveriam ser os destinatários supremos dessa relação.

A imposição de soluções indemnizatórias no recurso aos pressupostos gerais da responsabilidade civil deve ser admissível num quadro em que se demonstre consumada a dissolução dos laços afetivos por lesão culposa dos deveres parentais de que haja resultado sério e manifesto prejuízo para os filhos, sendo de ressalvar que a aplicação de tais consequências em nada se relaciona com o preenchimento dos pressupostos mais graves que justificam a inibição do exercício das responsabilidades parentais ou o decretamento das providências a que se referem os artigos 1915.º e 1918.º do Código Civil, respetivamente.

É de salientar, nesse sentido, que, inibir ou limitar o exercício dos poderes-deveres funcionais que integram o dever de afeto e de cuidado, relativamente a quem não os quis exercer, quando podia e devia fazê-lo, pode até consubstanciar um sinal de que o Estado não consegue acautelar a violação dos direitos de personalidade de um filho abandonado, bem como os efeitos que este abandono pode provocar no seu desenvolvimento.

Nem sempre a responsabilidade civil por abandono afetivo terá lugar ou será possível especialmente quando não estejam verificados os seus pressupostos ou se mostre mais adequado o recurso a instrumentos coercivos dos deveres de cuidado parental.

Porém, nos casos em que tiver lugar, a sua função social não poderá deixar de ser essencialmente pedagógica e nem sempre punitiva ou reparadora.

Esta função social não dispensa o juízo ético do julgador sobre as circunstâncias de cada caso (o apelo aos critérios de equidade) por forma a evitar a mera satisfação de vaidades ou de vinganças ou a "monetarização dos afetos".

Assim, entendemos que a responsabilização civil deve constituir outra opção a ser considerada como dissuasora destes comportamentos violadores dos direitos subjetivos da criança.

Complementando essa discussão, é inegável a sua função social e pedagógica junto da comunidade quando se afirma a reparação dos danos causados aos filhos pelos pais que não lhes proporcionam o afeto a que têm direito.

Em suma, importa sempre ressalvar uma máxima essencial quando estamos a falar da relação entre pais e filhos: "amar é faculdade, cuidar é dever".

Ana Catarina Fialho

Mestre em Direito

Associada da AAMM, Abecasis, Moura Marques, Alves Pereira & Associados

Gostou deste artigo? Deixe o seu comentário aqui em baixo. A sua opinião é importante para nós!

Subscreva também o nosso blogue, para ficar a par das nossas novidades e informações.

Tem alguma questão? Entre em contacto connosco

 

0
0

Cooperação Judiciária Transfronteiriça - Responsabilidades Parentais e Medidas de Proteção

Cooperação Judiciária Transfronteiriça - Responsabilidades Parentais e Medidas de Proteção

Dia 11 de dezembro, entre as 14.30H e as 17.30H. E

Entrada livre, sujeita a inscrição.

 

 

0
0