O inventário por divórcio e o património comum

Conforme decorre do artigo 1688.º do Código Civil, as relações pessoais e patrimoniais entre os cônjuges cessam pela dissolução do casamento, sendo que não obstante os efeitos do divórcio se produzirem a partir do trânsito em julgado da sentença que o decreta, a verdade é que, conforme decorre do artigo 1789.º do Código Civil, os referidos efeitos patrimoniais retrotraem-se à data da proposição da ação de divórcio.

Para efeitos de partilha por divórcio, tal equivale a dizer que o património comum dos ex-cônjuges (anteriormente casados em regime de comunhão) corresponde àquele que existia na data em que foi proposta a ação de divórcio.

Assim sendo, apenas os bens que compõem o património comum do ex-casal à data da propositura da ação é que relevam para efeitos de partilha. Por exemplo, apenas relevará, para efeitos de partilha, o saldo da conta bancária à data da propositura da ação de divórcio, significando tal que, quer os movimentos anteriores, quer os movimentos posteriores a essa data não assumem relevância para efeitos da partilha a realizar.
Assim, se um dos ex-cônjuges tiver levantado dinheiro de uma conta bancária comum antes da data de propositura da ação de divórcio, tal montante não poderá ser levado à partilha do acervo comum, pois o levantamento de um montante nestes moldes integra um ato de administração ordinária relativamente aos bens comuns do casal conforme resulta do n.º 3 do artigo 1678.º do Código Civil.

Nos termos do disposto no artigo 1681.º n.º 1 do Código Civil, o cônjuge que administra bens comuns está isento de prestar contas da administração que faz sendo que terá que responder pelos «atos intencionalmente praticados em prejuízo do casal ou do outro cônjuge» conforme resulta do artigo 1681.º n.º 1 do Código Civil, mas tal matéria nada tem que ver com a partilha por divórcio, a qual, conforme supra referido, abrange apenas os bens que compõem o acervo comum à data da propositura da ação de divórcio.

 

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Quem representa, na assembleia geral, a quota que faz parte de uma herança indivisa?

Sempre que se abre a sucessão de uma pessoa, o conjunto dos bens, direitos, obrigações e relações jurídicas que não se extinguem com a morte, compõem a herança do de cujus, herança esta que tem que ser administrada até à partilha.

Existindo uma comunhão hereditária, os titulares da herança são os herdeiros do falecido.

Fazendo parte do acervo hereditário uma quota numa sociedade comercial, titulada pelo falecido, importa ter presente o regime de contitularidade de quotas, previsto nos artigos 222.º a 224.º do Código das Sociedades Comerciais.

Conforme resulta do artigo 222.º n.º 1:

«1. Os contitulares da quota devem exercer os direitos a ela inerentes através de representante comum”.

E, de acordo com o disposto no artigo 223.º:

«1. O representante comum, quando não for designado por lei ou por disposição testamentária, é nomeado e pode ser destituído pelos contitulares

Conforme resulta dos artigos 2079.º e seguintes do Código Civil, a lei consagra um regime próprio de administração no que respeita à herança ilíquida e indivisa, a qual incumbe ao cabeça-de-casal.

De acordo com o artigo 2080.º do Código Civil:

«1 – O cargo de cabeça-de-casal defere-se pela ordem seguinte:

  1. a) Ao cônjuge sobrevivo, não separado judicialmente de pessoas e bens, se for herdeiro ou tiver meação nos bens do casal;
  2. b) Ao testamenteiro, salvo declaração do testador em contrário;
  3. c) Aos parentes que sejam herdeiros legais;
  4. d) Aos herdeiros testamentário

2 – De entre os parentes que sejam herdeiros legais, preferem os mais próximos em grau,
3 – De entre os herdeiros legais do mesmo grau de parentesco, ou de entre os herdeiros
testamentários, preferem os que viviam com o falecido há pelo menos um ano à data da morte.
4 – Em igualdade de circunstâncias, prefere o herdeiro mais velho

Assim, a representação da quota numa sociedade que integra o acervo hereditário, é assegurada pelo represente comum dos herdeiros, conforme resulta do artigo 222.º n.º 1 do Código das Sociedades Comerciais, mais concretamente, pelo cabeça-de-casal.

Por vezes, ocorre que, em sociedades em que os sócios têm relações familiares entre si, por exemplo, Pais e filhos, falecendo um deles, um dos sócios assume a qualidade de cabeça-de-casal e, por isso, de representante comum da quota anteriormente titulada pelo falecido.

Nestas circunstâncias, importa ter em conta, que a qualidade de sócio e a qualidade de representante comum da quota não se confundem, pelo que, numa assembleia geral, o sócio que, simultaneamente for represente comum da quota, terá que participar e votar nessa dupla qualidade, sob pena de invalidade da deliberação social.

Com efeito, conforme resulta do artigo 56.º n.º 1 do Código das Sociedades Comerciais, são nulas as deliberações tomadas pelos sócios em assembleia geral não convocada, a menos que todos os sócios tenham estado presentes ou representados.

Para efeitos deste artigo, uma assembleia não convocada será aquela que não foi precedida de qualquer convocatória e, também, aquela que tenha sido realizada sem a presença de um ou mais sócios, que não foram convocados, pelo que, se na ata da assembleia geral, não constar a participação do sócio representante comum da quota (cabeça-de-casal), na sua dupla qualidade, de sócio e de representante comum da herança ilíquida e indivisa, tal conduzirá, nos termos do artigo 56.º, à nulidade das deliberações tomadas nessa assembleia.

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A retenção ilícita de uma criança e a regulação das responsabilidades parentais

Nos dias de hoje, é usual que pessoas de nacionalidades diferentes casem ou se unam de facto e tenham filhos, o que implica que, cada vez mais, surjam problemas relacionados com a residência das crianças, filhas de pais de nacionalidades diferentes.

Uma situação cada vez mais frequente é a de crianças que residiam com os pais num determinado país, no momento da separação daqueles, sejam levadas, por um progenitor, sem o consentimento do outro, para o país da nacionalidade daquele, porque este entende que nada mais o prende ao país que a família tinha escolhido como local de residência da família.

Nestas situações, podemos ter, uma situação processual, em que uma criança, ao ser levada sem o consentimento do outro progenitor para outro país, implique o acionamento da Convenção da Haia de 1980 ou, mesmo, o acionamento do Regulamento n.º 2201/2003, de 27 de novembro de 2003, acrescendo ainda que, o progenitor que ficou no país onde a família residia, interponha pedido de regulação das responsabilidades parentais relativas à criança.

Qual o tribunal internacionalmente competente para conhecer da regulação das responsabilidades parentais relativa a esta criança?

A regra é a de que o tribunal internacionalmente competente é o da residência habitual da criança à data em que o processo de regulação seja instaurado sendo que, na situação supra descrita, existirá uma criança com residência habitual num país (aquele onde vivia) e com um local de permanência (o país onde se encontra).

A competência para conhecer da regulação das responsabilidades parentais dessa criança cabe ao tribunal onde a criança tem a sua residência habitual, sendo que, a existência de um processo a pedir o regresso da criança ao país da sua residência poderá influir na fixação da competência internacional do tribunal que deverá regular as responsabilidades parentais.

Isto porque pode acontecer que o tribunal do Estado para onde a criança tenha sido deslocada ou esteja retida, venha a proferir uma decisão de não regresso da criança ao Estado da sua residência habitual e, nessa situação, o tribunal desse Estado passa a ser internacionalmente competente para conhecer da regulação das responsabilidades parentais.

Assim, numa situação destas, pode o tribunal onde foi pedida a regulação das responsabilidades parentais vir a suspender a instância, atento o facto de a decisão a proferir sobre o regresso ou não regresso da criança ter repercussão na fixação da competência internacional do tribunal que conhecerá da regulação das responsabilidades parentais.

 

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A Convenção da Haia sobre os aspetos civis do rapto internacional de crianças

De acordo com o artigo 3.º da Convenção, a deslocação ou a retenção de uma criança é considerada ilícita quando tenha sido efetivada em violação de um direito de custódia atribuído a uma pessoa, estando esse direito a ser exercido de forma efetiva, individualmente ou em conjunto, no momento da transferência ou da retenção ou devesse estar se tais acontecimentos não se tivessem verificado.

Este direito de custódia pode resultar de uma atribuição de pleno direito, de uma decisão judicial ou administrativa ou de um acordo vigente segundo o Direito do Estado da residência habitual da criança.

O artigo 5.º da Convenção indica o conteúdo do direito de custódia, no sentido de que este inclui o direito relativo aos cuidados devidos à criança, como pessoa e, particularmente, o direito de decidir sobre o lugar de residência desta.

Uma questão que se pode colocar é a de saber se a Convenção é aplicável num caso em que os pais ainda não tenham regulado o exercício das responsabilidades parentais relativas a uma criança e a criança tenha sido deslocada e/ou retida ilicitamente por um dos progenitores em outro País, que não o da sua residência habitual.

A resposta a esta pergunta pode encontrar-se logo no relatório explicativo relativo à referida Convenção, onde é salientado, a propósito do artigo 3.º, que uma das características deste instrumento internacional é a sua aplicabilidade à proteção dos direitos de custódia que sejam exercidos antes de qualquer decisão sobre a matéria. Efetivamente, existem muitos casos em que as crianças são deslocadas ou retidas ilicitamente antes que exista uma decisão sobre a custódia, pelo que se a Convenção não abrangesse também estas situações, um conjunto significativo de crianças estariam desprotegidas numa situação em que um dos progenitores a deslocasse e/ou retivesse ilicitamente, fazendo-se valer do facto de ainda não existir uma regulação das responsabilidades parentais para evitar a aplicação da Convenção.

 

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A quem incumbe o exercício do cargo de cabeça de casal?

Ouve-se muitas vezes dizer que, em caso de morte de alguém que não seja casado, o cabeça de casal é o filho mais velho.

Contudo, nem sempre é assim e, não é este o critério que resulta da lei.

Aliás, o critério de escolha do cabeça de casal, através da idade, existe e está previsto na lei, mas como critério de desempate, ou seja, em situação de igualdade, prefere o mais velho.

A lei estabelece, no artigo 2080º, do Código Civil que, o cargo de cabeça de casal é exercido, em primeiro lugar, pelo cônjuge sobrevivo desde que seja herdeiro ou que tenha meação nos bens do casal.

Isto significa que, se o cônjuge tiver renunciado à qualidade e herdeiro ou se o regime de bens do casamento for o da separação de bens então, o cônjuge, não exercerá o cargo de cabeça de casal.

Também não será o cônjuge a exercer o cargo de cabeça de casal se, à data da morte, estiver separado judicialmente de pessoas e bens.

Não havendo cônjuge sobrevivo (ou havendo mas não estando este em condições de exercer o cabeçalato) o cargo será exercido, nos termos da alínea b), do número 1, do mesmo artigo 2080.º, do Código Civil, pelo testamenteiro, se o autor da sucessão tiver feito testamento.

Não se verificando nenhuma das situações anteriores, resulta que o cargo de cabeça de casal terá que ser exercido por um dos herdeiros e, aqui sim, se põe a questão de, existindo mais que um herdeiro, como se determina qual deles será o cabeça de casal.

A lei estabelece que, havendo herdeiros com diferentes graus de parentesco com o falecido, o cargo de cabeça de casal, pertencerá àqueles que forem de grau mais próximo e, se existirem vários parentes do mesmo grau, será cabeça de casal aquele que viver com o falecido há, pelo menos, um ano antes da data da sua morte.

Imagine-se, por exemplo, uma situação em que existem três filhos e dois netos que são herdeiros e que o filho mais novo e um neto viviam, com o falecido, há mais de um ano, à data da morte.

Quem vai exercer o cargo de cabeça de casal?

Nesta situação será o filho mais novo pois é de grau mais próximo (filho) e vivia há mais de um ano com o falecido.

Numa outra situação em que apenas o neto vivesse como falecido, então, o cabeça de casal seria o filho mais velho pois, com referido, o cargo é exercido em primeiro lugar pelos parentes mais próximos (no caso os filhos) e, porque nenhum vivia com o falecido estando, por isso, todos em igualdade de circunstâncias, o critério de atribuição do cargo é o da idade.

Como refere o n.º 4, do artigo 2080.º do Código Civil: «Em igualdade de circunstâncias, prefere o herdeiro mais velho.»

Assim, para determinação de quem irá exercer o cargo de cabeça-de-casal, importa olhar às circunstâncias concretas de cada caso.

 

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Remoção do cabeça de casal do exercício do cargo

Remoção do cabeça de casal do exercício do cargo

Na grande maioria das situações os processos de partilha são difíceis e, por vezes, geradores de conflitos entre os herdeiros.

Seja porque existem questões subjetivas e emocionais que dificultam o entendimento dos herdeiros, seja, por vezes, por questões mais objetivas e práticas que levam a desentendimentos e, não raras vezes, impõem o recurso a processos de inventário.

Na partilha, seja judicial, seja extra-judicial assume relevância a figura do cabeça-de-casal, que, conforme já referimos em textos anteriores tem, entre outras, a função de administrar o património comum, até à partilha.

Também já referimos, numa publicação anterior, de que forma é designado o herdeiro que deverá assumir tal cargo.

Neste texto, vamos abordar as situações em que o cabeça de casal pode ser (ainda que contra a sua vontade) retirado do cargo e substituído por outro herdeiro.

Assim, nos termos do disposto no artigo 2086º do Código Civil, o cabeça-de-casal pode ser removido exercício do cargo quando, propositadamente, tenha omitido a existência de bens pertencentes à herança e que, por isso, deveriam constar da relação de bens.

Também é motivo para remoção do cabeça de casal o facto de este, também propositadamente, esconder doações que o falecido tenha feito em vida. Com efeito, as doações que são feitas, ao longo da vida (ainda que feitas a quem não é herdeiro) têm que ser, após a morte, relacionadas.

Se o cabeça-de-casal, quando relaciona os bens que compõem a herança, indicar doações que não existiram ou relacionar encargos que não existem, poderá, com fundamento em tal atuação, ser retirado do cargo.

Os interessados na partilha (todos aqueles que podem ser afetados pela mesma), sejam herdeiros ou legatários, têm legitimidade para, tomando conhecimento da prática, pelo cabeça-de-casal, de qualquer um destes atos, pedir o seu afastamento.

Se o cabeça de casal, na sua atuação enquanto administrador da herança, não agir com zelo e prudência e de, nas opções que faz para a administração dos bens que compõem a herança, demonstrar que não é competente para exercer as funções que lhe estão cometidas, poderá também ser removido do cargo, a pedido dos demais interessados.

Também se os interessados na partilha entenderem que o cabeça-de-casal, não cumpre com algum dos deveres que, para si, resultam do desempenho do cargo de cabeça-de-casal pode, com tal fundamento, pedir ao tribunal que o remova do cargo. 

A remoção do cabeça-de-casal do cargo que ocupa não é automática e tem que ser determinada pelo tribunal. Também não basta referir, por exemplo, que o cabeça de casal, não administra bem os bens que compõem a herança ou que não relacionou bens que deveria ter relacionado. Terão que, nos exemplos referidos, ser apresentadas provas de que a administração feita não é a adequada e que não foi por falta de conhecimento ou negligência que não relacionou os bens em causa. Neste último caso (não ter relacionado bens) terá que ser provado que não o fez com intenção de prejudicar os restantes herdeiros.

Provando-se que a conduta do cabeça-de-casal, não é adequada e que, por isso, o mesmo deverá ser removido, dependendo dos fundamentos e da situação concreta, poderá esta ainda estar sujeito a penalizações decorrentes da sua atuação concreta, nomeadamente, poderá o mesmo ser alvo de processo, intentados pelos restantes herdeiros com vista a serem ressarcidos de eventuais danos que a conduta do cabeça-de-casal, lhes tenha, concretamente causado.

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A caminho do Natal

A caminho do Natal

Estamos já em caminho descendente para o Natal! Ensinados a abrir o coração, e a ouvir Deus no ruído, na correria, na eterna lufa-lufa em que existimos hoje, fazer silêncio será indispensável para O sentirmos chegar, mas… será que somos capazes? Teremos nós a sabedoria de travar o remoinho de sons, cores, luzes e gentes que nos preenchem nestes dias, para deixar fluir em nós a Sua voz? E não teremos nós medo de nos permitirmos sermos confrontados com a famosa e pertinente dúvida que Jesus adulto nos coloca hoje, como o fez ontem, como o fará de novo amanhã?

Susana Esgalhado Ferreira, ministro da comunhão na paróquia de Nossa Senhora da Boavista -Porto

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Família de Nazaré em tempos de (in)certeza

Família de Nazaré em tempos de (in)certeza

Parece-me que, para devolver à família a sua verdadeira fisionomia e restituir-lhe o seu esplendor, é lido apresentar, aquele exemplo luminoso e universal que a Sabedoria eterna inventou: a família de Nazaré. Ela pode ser considerada por todas as famílias do mundo que existem e que existirão como modelo e tipo. E não apenas as famílias. Cada um de seus membros pode inspirar-se nela para saber que comportamento adotar, que atitudes assumir, quais os relacionamentos a serem revigorados, que virtudes cultivar.

Estas palavras proferidas em 1981 por Chiara Lubich[1] - fundadora do Movimentos dos Focolares - continuam a interpelar, sobretudo nesta época Natalícia, em que celebramos o nascimento  de Jesus, o Salvador do Mundo. São palavras que convidam a um grande exercício de reflexão e interioridade, onde cada um de nós é convidado a não se sentir só, porque poderá sempre identificar-se com José, Maria e Jesus na Sua “pequenina” mas grandiosa Família de Nazaré.

Lembro-me, que no nosso Matrimónio, eu e o meu marido, manifestávamos diante da imagem de Maria, o desejo de imitar a sua Família - que sempre nos atraiu desde que namorávamos e creio que todos os casais nutrem esse mesmo desejo - conscientes (ou não) das nossas inseguranças, fraquezas e vulnerabilidades, mas seguros que ali seria o nosso molde pelo qual desejaríamos “enformar” a nossa futura Família.

E continua Chiara: “cada homem desta terra que é esposo e pai pode sempre encontrar em José — o esposo de Maria e pai adotivo de Jesus uma luz, um estímulo, uma fonte de inspiração. Dele pode aprender a fidelidade a toda a prova, a castidade heróica, a força, a operosidade silenciosa, o respeito, a veneração, a proteção à mãe de seus filhos, a participação nas preocupações familiares […] e toda mulher que é esposa e mãe pode descobrir em Maria o seu próprio modelo, a igualdade com o homem e a sua própria identidade. Na esposa de José verá realizado plenamente o desejo de ser também ela protagonista; dela compreenderá como sair do círculo familiar para difundir, em proveito de muitos, as riquezas que são próprias da mulher: a capacidade de sacrificar-se, a interioridade que a torna segura, a religiosidade que a distingue, a necessidade inata de elevar-se e de elevar, irradiando candura, beleza e pureza. Assim também os filhos encontrarão no Filho de Maria e de José, harmonizadas numa admirável unidade as duas tendências que podem angustiá-los: a necessidade de se afirmarem como outra geração que deve abrir um novo capítulo na história, e o desejo de se abrigarem à sombra de seus entes queridos no amor e na obediência.”

Igino Giordani (Foco)[2], pai, esposo, escritor, jornalista e político italiano, co-fundador com Chiara Lubich do Movimento dos Focolares - dirigindo-se em 1969 a um grupo famílias, afirmava: “Basta que eu ame a minha mulher, basta que a minha mulher me ame, e nela e em mim há Deus. A nossa cozinha, a nossa sala de trabalho, a nossa sala de jantar, torna-se imediatamente um templo, um tabernáculo, onde Deus está.” 

Uma afirmação que se encontra em sintonia com aquilo que anos mais tarde afirmou S. João Paulo II: "O 'nós' divino constitui o modelo eterno do 'nós' humano, daquele 'nós' acima de tudo, que é formado pelo homem e pela mulher, criado à imagem e semelhança divina”.

Porque - continua Igino Giordani (Foco) - o autêntico amor conjugal é assumido no amor divino, ou seja, está incluído no amor da Santíssima Trindade. Quando amo a minha mulher e a minha mulher me ama, quando amamos os nossos filhos e os filhos amam os seus pais, mas sobretudo quando os dois cônjuges se amam, o Espírito Santo passa entre eles como entre o Pai e o Filho.  É amor, é a Santíssima Trindade neles, é Deus Amor vivendo neles. É por isso que é um ‘grande sacramento, é por isso que os cônjuges são os sacerdotes deste sacramento e conferem a graça do sacramento.”

Portanto e se dúvidas houvesse, escreve Chiara Lubich: o modelo de família existe e está escrito no nosso próprio ser como pessoas: um modelo comunitário.
O projeto de vida para a família existe sim - e todos os dias somos desafiados a encarná-lo - é o amor que une o “nós" divino, esse mesmo amor que a Palavra trouxe à terra: um projecto comunitário.

[…]

Assim, deste modo é possível afirmar que toda a vida da família é composta de amor, nas suas várias expressões e nuances, e é uma interacção contínua de distinção e unidade, um amor que, se iluminado pela fé, reconhece a sua fonte ao saber morrer por outro, como o Filho de Deus soube fazer por nós. Onde cada pessoa da família procura o bem do outro estar atento às suas necessidades, por amor ao outro e deste modo, construir a sua família como uma verdadeira comunidade, a primeira célula da sociedade.

Saibamos nós, acolher os desafios lançados pelo S. Padre, o Papa Francisco, - procurando que este amor, da família para as famílias, que se pretende comunitário, imitando assim a dinâmica Trinitária - possa ser já visível no encontro da família com as periferias geográficas e existenciais, pois é aí que a obra de Deus continua a manifestar-se. É que não levar esta realidade a sério, continua o S. Padre, equivale a não levar a sério o Evangelho.

E só assim - escreve Chiara Lubich - veremos verdadeiramente o mundo da família sarar e florescer novamente, e através dele, a sociedade e a humanidade. Mesmo no meio das contradições e provações de cada dia, poderemos verdadeiramente viver, entre a terra e o céu, com o Menino que vai nascer, entre nós!

Com desejo de um Santo Natal para toda sua Família,

Susana Rocha Fouto da Silva - Mediadora Familiar / Especializada em Logoterapia e Análise Existencial

Isabel Almendra - Catequista na Igreja de São João de Deus


[1] https://focolares.pt/chiara-lubich/

[2] http://focolares.pt/o-pacto-de-16-de-julho-de-1949/

Referências:

Chiara Lubich: Família de Nazaré - Mensagem para o Family Fest de 1981 in https://www.focolare.org/pt/news/2017/12/30/chiara-lubich-a-familia-de-nazare/

Chiara Lubich: A família como uma verdadeira comunidade - a primeira célula da sociedade in https://centrochiaralubich.org/pt/uma-luz-para-a-familia/

Igino Giordani: A família - um templo, uma pequena igreja in https://www.focolare.org/famiglienuove/en/news/2019/04/26/igino-giordani-la-famiglia-un-tempio-una-piccola-chiesa/

Papa Francisco: Ciclo de catequeses dedicado a São José, convidando a valorizar «periferias» geográficas e existenciais in https://www.vatican.va/content/francesco/pt/audiences/2021/documents/papa-francesco_20211117_udienza-generale.html

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A quem cabe o exercício do cargo de cabeça-de-casal da herança indivisa

A quem cabe o exercício do cargo de cabeça-de-casal da herança indivisa

A generalidade das pessoas tem a convicção que o cargo de cabeça de casal de uma herança indivisa é exercido pelo cônjuge sobrevivo ou, não havendo cônjuge, pelo filho mais velho.

Contudo, da letra da lei, não é exatamente isso que resulta sendo, o exercício do cabeçalato, pelo mais velho, a forma de “desempate” em igualdade de circunstâncias.

Nos termos do disposto no artigo 2080º do Código Civil, o exercício do cargo de cabeça de casal compete, em primeiro lugar, ao cônjuge sobrevivo (desde que não separado judicialmente de pessoas e bens) se for herdeiro ou se tiver meação (por força do regime de bens do casamento) nos bens do casal.

Não havendo cônjuge, o cargo de cabeça de casal será exercido, nos termos da lei, pelos parentes que sejam herdeiros legais (aqui se incluem os filhos), determinando a lei, no mesmo artigo 2080º que, de entre os parentes têm preferência, no exercício do cargo, os mais próximos em grau.

Significa isto que, por exemplo, concorrendo à herança, simultaneamente, filhos e netos, os filhos terão preferência no exercício do cargo de cabeça-de-casal.

Existindo testamento, o cargo será exercido pelo testamenteiro nomeado pelo testador (a menos que, expressamente, o testador tenha excluído o exercido do cargo de cabeça-de-casal).

Existindo apenas herdeiros como mesmo grau de parentesco (por exemplo apenas filhos ou apenas netos), a preferência no exercício do cargo, irá para aqueles que vivessem com o autor da herança, pelo menos, no ano anterior à data da morte.

O número 4, do artigo 2080º do Código Civil estabelece que, em igualdade de circunstâncias, prefere o herdeiro mais velho ou seja, apenas quando existam herdeiros com o mesmo grau de parentesco (por exemplo filhos) e todos eles estejam nas mesmas circunstâncias (por exemplo, todos viviam com o falecido ou nenhum vivia com o falecido) é que o cargo competirá ao mais velho.

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Os poderes de administração do cabeça-de-casal

Os poderes de administração do cabeça-de-casal

Quando uma pessoa falece, abre-se a sua sucessão, cabendo ao cabeça-de-casal a administração da herança, até ao momento da sua liquidação e partilha, administrando os bens próprios do falecido, bem como os bens comuns do casal, caso o falecido tenha sido casado sob o regime da comunhão.

No quadro do regime especial de administração da herança indivisa, pode o cabeça-de-casal dar de arrendamento bens que fazem parte da herança, sem o consentimento dos outros herdeiros, desde que o contrato de arrendamento seja celebrado até um prazo de seis anos.

Com efeito, dispõe o artigo 1024.º do Código Civil:

«1.A locação constitui, para o locador, um ato de administração ordinária, exceto quando for celebrada por prazo superior a seis anos

Nestes termos, a celebração de um contrato de arrendamento, pelo cabeça-de-casal, nos termos supra, não o fere de invalidade, exatamente porque se trata de um ato de administração ordinária.

Situação diferente seria se do contrato de arrendamento constasse uma cláusula de opção de compra por parte do arrendatário pois a opção de compra, não sendo um ato de conservação ou frutificação, não corresponde à prática de um ato de mera administração não cabendo, por isso, nos poderes do cabeça-de-casal.

Assim, o cabeça-de-casal apenas poderia celebrar o contrato de arrendamento com a cláusula de opção de compra com o consentimento de todos os herdeiros, conforme resulta do artigo 2091.º n.º 1 do Código Civil.

Como consequência, a opção de compra, se celebrada pelo cabeça-de-casal, sem o consentimento dos restantes herdeiros, será nula na medida em que, de acordo com o artigo 294.º do Código Civil, os negócios jurídicos que sejam celebrados contra norma imperativa são nulos.

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