A responsabilidade do cônjuge pela administração dos bens comuns ou próprios do outro cônjuge

A responsabilidade do cônjuge pela administração dos bens comuns ou próprios do outro cônjuge

 

No âmbito da responsabilidade do cônjuge pela administração dos bens comuns ou próprios do outro cônjuge, importa distinguir duas situações específicas: a prevista no n.º 1 e a constante do n.º 2 do artigo 1681.º do Código Civil.

Dispõe o artigo 1681.º n.º 1 do Código Civil:

«1. O cônjuge que administrar bens comuns ou próprios do outro cônjuge … não é obrigado a prestar contas da sua administração, mas responde pelos atos intencionalmente praticados em prejuízo do casal ou do outro cônjuge

Conforme resulta desta previsão legal, o cônjuge administrador não tem o dever de prestar contas da administração que faz. Tal visa evitar que a apreciação que, a todo o tempo, poderia ser feita, dos termos da administração e, também, da diligência utilizada nessa administração na constância do matrimónio, ponha em causa o entendimento entre os cônjuges, razão porque a lei civil optou por, expressamente, dispensar o cônjuge administrador deste dever.

Do mesmo modo, a responsabilidade do cônjuge administrador está excluída quanto a prejuízos devidos a negligência, limitando-se esta responsabilidade aos danos causados com dolo direto ou indireto, equivalendo tal a dizer que, nos termos do artigo 1681.º n.º 1 do Código Civil, os atos intencionalmente praticados (com dolo) causadores de danos são considerados factos ilícitos.

Nestas situações, em que o cônjuge administrador está autorizado, pelo outro cônjuge, a administrar os bens comuns ou próprios do outro, a responsabilidade daquele corresponde a uma responsabilidade civil por factos ilícitos que segue o regime previsto no artigo 483.º e seguintes do Código Civil, pelo que o direito de indemnização que o cônjuge lesado pode fazer valer fica sujeito ao prazo de prescrição previsto no mencionado artigo 483.º do Código Civil, ou seja, o prazo de prescrição é de três anos e, nos termos do disposto no artigo 498.º do mesmo Código, este prazo conta-se da data em que o cônjuge lesado teve conhecimento do direito que lhe assiste, ainda que com desconhecimento da extensão dos danos causados.

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Já quanto à previsão do artigo 1681.º n.º 2 do Código Civil, a mesma respeita aos casos em que o cônjuge administrador o é no âmbito de um contrato de mandato celebrado entre os cônjuges, tendo os deveres do cônjuge administrador origem neste contrato (de mandato), pelo que os seus deveres são deveres de prestação e a sua responsabilidade tem natureza contratual.

Assim sendo, os direitos do cônjuge lesado em decorrência da violação, por parte do cônjuge administrador, dos deveres resultantes do contrato de mandato, poderão ser acionados no quadro de uma ação de responsabilidade civil contratual.

Por fim, importa salientar que, nos termos do disposto no artigo 1789.º n.º 1 do Código Civil, se é certo que os efeitos do divórcio se produzem a partir do trânsito em julgado da sentença que o decretar, a verdade é que, nas relações patrimoniais entre os cônjuges, os seus efeitos retroagem à data da propositura da ação de divórcio, o que bem se compreende, pois, desta forma, o legislador civil quis evitar que um dos cônjuges se visse prejudicado por atos, praticados pelo cônjuge administrador, após a propositura da ação e antes do decretamento do divórcio, atos esses com repercussão no património sob sua administração.

 

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Alimentos ou contribuição para os encargos da vida familiar?

Alimentos ou contribuição para os encargos da vida familiar?

De acordo com o artigo 1675.º do Código Civil, um dos deveres decorrentes do casamento é o dever de assistência, o qual se encontra definido no n.º 1 deste artigo, nos seguintes termos:

«1. O dever de assistência compreende a obrigação de prestar alimentos e a de contribuir para os encargos da vida familiar

Mais, prevê o n.º 2 deste artigo que o dever de assistência se mantém durante a separação de facto.

Resulta, pois, de quanto previsto no artigo 1675.º n.º 1 do Código Civil que do dever de assistência decorrem duas obrigações distintas: o dever de prestar alimentos e o dever de contribuir para os encargos da vida familiar.

A estes dois tipos de obrigações correspondem meios processuais distintos para a sua efetivação pelo cônjuge que acione o seu direito (a alimentos ou à contribuição do outro para os encargos da vida familiar): a ação por alimentos - que pode ser precedida ou correr em simultâneo com uma providência cautelar de alimentos provisórios- e o pedido de contribuição do cônjuge para as despesas domésticas.

Quando optar por um e por outro meio processual?

Estando consumada uma situação de separação de facto, com a saída de um dos cônjuges de casa e, não obstante o dever de assistência se manter, a verdade é que o dever de contribuir para os encargos da vida familiar deixa de fazer sentido na medida em que a vida familiar desapareceu, deixando de haver a comunhão de vida que baseava a existência de despesas ocorridas nessa mesma comunhão.

Nestes casos, subsiste o dever de prestar alimentos nos termos do artigo 1675.º nº 1 do Código Civil devendo, para tanto, o cônjuge carenciado propor uma ação contra o outro cônjuge a pedir alimentos, podendo ainda, pedir alimentos provisórios, no quadro de um procedimento cautelar, previsto no artigo 384.º do Código de Processo Civil, requerendo ao tribunal que seja fixada uma quantia mensal a que terá direito e a ser entregue pelo outro cônjuge. Os alimentos provisórios mantêm-se enquanto não houver o pagamento da primeira prestação definitiva fixada na ação definitiva de alimentos.

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O recurso ao procedimento cautelar de alimentos provisórios visa colmatar os inconvenientes que decorrem da delonga da ação de alimentos, na medida em que tratando-se de um procedimento cautelar, a sua tramitação é célere, permitindo ao cônjuge carenciado de alimentos fazer face às necessidades do seu dia-a-dia, ainda que o valor que seja fixado no quadro do procedimento cautelar de alimentos provisórios tenda a ser mais baixo do que aquele que vier a ser fixado na ação definitiva de alimentos tomando, nomeadamente em conta que, nos procedimentos cautelares, o tribunal decide com base no que se mostre indiciariamente provado, pelo que a decisão é tomada com menos elementos e com uma prova mais superficial do que aquela que será produzida na ação definitiva.

Nos restantes casos em que não tenha ocorrido separação de facto, mas em que haja incumprimento de um dos cônjuges do dever de assistência, o meio processual próprio a utilizar, em caso de necessidade, é o previsto no artigo 992.º do Código de Processo Civil, ou seja, o recurso ao processo de jurisdição voluntária traduzido na contribuição do cônjuge para as despesas domésticas.

Neste processo, o cônjuge visado pelo incumprimento do outro pode exigir a entrega direta da parte dos rendimentos deste que corresponda a quanto se mostra necessário para fazer face às despesas domésticas, situação que se deverá manter enquanto subsistir o incumprimento e enquanto se mantiver a vida em comum.

 

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O conceito de residência habitual no Regulamento (CE) n.º 2201/2003 de 27 de novembro de 2003

O conceito de residência habitual no Regulamento (CE) n.º 2201/2003 do Conselho de 27 de novembro de 2003

 

O Regulamento (CE) n.º 2201/2003 do Conselho de 27 de Novembro de 2003 relativo à competência, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria matrimonial e em matéria de responsabilidade parental (adiante designado Regulamento), que é diretamente aplicável na ordem jurídica portuguesa, contém regras de competência internacional, nomeadamente, quanto às responsabilidades parentais.

No seu considerando 12, refere-se que: «As regras de competência em matéria de responsabilidade parentalsão definidas em função do superior interesse da criança e, em particular, do critério da proximidade. Por conseguinte, a competência deverá ser, em primeiro lugar, atribuída aos tribunais do Estado-Membro de residência habitual da criança …»

Assim, a regra geral contida no artigo 8.º n.º 1 do Regulamento é a de que os tribunais de um Estado-Membro são competentes em matéria de responsabilidade parental de uma criança que resida habitualmente nesse Estado na data em que seja instaurado o processo em tribunal.

O conceito de residência habitual, conforme decorre do considerando 12 do Regulamento, afere-se pelo critério da proximidade, tomando em conta o superior interesse da criança devendo ser completado com a interpretação dada pela jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia, tendo-se este Tribunal pronunciado sobre o conceito de residência habitual no acórdão proferido em 22 de dezembro de 2010 no qual se pode ler que: «A fim de que este superior interesse da criança seja respeitado da melhor forma, o Tribunal de Justiça já declarou que o conceito de “residência habitual” na aceção do artigo 8.º n.º 1 do regulamento corresponde ao lugar que traduz uma certa integração da criança num ambiente social e familiar” pelo que: «para determinar a residência habitual de uma criança, além da presença física desta num Estado-Membro, outros fatores suplementares devem indicar que essa presença não tem carácter temporário ou ocasional.»

E, no que respeita a estes fatores suplementares, atente-se no acórdão proferido em 2 de abril de 2009, também pelo Tribunal de Justiça da União Europeia, onde se refere que aqueles se reportam, nomeadamente, à nacionalidade da criança, à sua idade, à duração, à regularidade, às condições e razões da permanência da criança no território de um Estado-Membro, às razões da sua mudança, aos laços familiares e sociais que a criança tiver nesse Estado-Membro.

Assim, nos processos de regulação das responsabilidades parentais, é através deste conceito de residência habitual, que se determina a competência internacional de um tribunal de um Estado-membro importando, por isso, a prova da existência desta residência habitual à data da instauração do respetivo processo, a qual é feita em função e em face da confluência destes fatores de proximidade e de conexão no circunstancialismo concreto do caso.

 

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A compropriedade no regime da separação de bens

A compropriedade no regime da separação de bens

No regime da separação de bens, os bens que os cônjuges adquirem em conjunto integram-se no regime da compropriedade.

Conforme resulta do artigo 1403.º n.º 1 do Código Civil:

«1. Existe propriedade em comum, ou compropriedade, quando duas ou mais pessoas são simultaneamente titulares do direito de propriedade sobre a mesma coisa

E, conforme resulta do n.º 2 do mesmo artigo:

«Os direitos dos consortes ou comproprietários sobre a coisa comum são qualitativamente iguais, embora possam ser quantitativamente diferentes; as quotas presumem-se, todavia, quantitativamente iguais na falta de indicação em contrário do título constitutivo.» (sublinhado nosso)

Assim sendo, por exemplo, se marido e mulher, casados no regime da separação de bens, comprarem uma casa e, apesar de apenas um deles pagar o preço, nada referenciarem a esse propósito na escritura pública de compra e venda, daí resulta que, por aplicação do disposto no n.º 2 do artigo 1403.º, a lei considera que as quotas de ambos são quantitativamente iguais. Ou seja, cada um deles é comproprietário do imóvel na mesma proporção, apesar de só um ter feito um esforço financeiro para aquisição do imóvel.

Esta situação é tanto mais grave quanto este regime de igualdade das quotas prevista no artigo 1403.º n.º 2 do Código Civil não admite produção de prova em contrário.

Tal equivale a dizer que, se do título constitutivo da compropriedade (no exemplo dado, a escritura pública), não constar nenhuma indicação que permita aferir o valor de cada uma das quotas dos consortes, a lei (n.º 2 do artigo 1403.º) considera que ambas as quotas são quantitativamente iguais.

Assim sendo, é de suma importância que quando, por exemplo, um casal, cujo regime de bens seja o da separação de bens, adquira, em conjunto uma casa, verta na escritura pública de compra e venda a realidade do esforço financeiro de cada um, por forma a que, conste do título constitutivo da compropriedade, o real esforço de cada consorte na aquisição pois, não constando tal, a verdade é que, em caso de divórcio, pode-se fazer valer o regime do n.º 2 do artigo 1403.º do Código Civil, ou seja, um dos consortes, ainda que não tenha contribuído para o pagamento do preço pode, por exemplo, numa ação de divisão de coisa comum, fazer valer a igualdade de quotas que resulta da escritura pública, pelo facto de, na mesma, não ter ficado consignada a diferença quantitativa das quotas.

Mais, não sendo a ação de divisão de coisa comum a ação própria para discutir tal, uma vez que não se poderá fazer prova de que, não obstante constar da escritura pública que ambos os consortes têm quotas iguais, a verdade é que um deles contribuiu mais ou na totalidade para a aquisição do imóvel, tal implicará que, só numa outra ação, é que o consorte que ficou prejudicado com a invocação da igualdade de quotas, poderá fazer valer o seu direito de crédito contra o outro consorte, direito de crédito esse resultante do facto de ter pago, na íntegra ou maioritariamente, o preço de aquisição.

 

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