Apresentação do livro da Dra Rute Agulhas e da Dra Joana Alexandre - Audição da Criança - Guia de Boas Práticas

Apresentação do  livro da Dra Rute Agulhas e da Dra Joana Alexandre

Foi com muita satisfação que recebemos o convite da Dra Rute Agulhas e da Dra Joana Alexandre, para a apresentação do livro - "Audição da Criança - Guia de Boas Práticas".
Para além de agradecer o simpático convite, não queremos deixar de o partilhar, com quem visite o nosso blogue, para que, quem possa, esteja também presente.
A apresentação será no próximo dia 1 de junho, pelas 17.00, no Conselho Regional de Lisboa, da Ordem dos Advogados, na Rua dos Anjos, nº 79.

A gravidez e a separação extrajudicial das pessoas casadas: reflexões críticas ao art. 733 do novo Código de Processo Civil brasileiro e à Resolução N. 35/2007 do CNJ

A gravidez e a separação extrajudicial das pessoas casadas: reflexões críticas ao art. 733 do novo Código de Processo Civil brasileiro e à Resolução N. 35/2007 do CNJ

 

Cristiane Busatto Zardo

Juíza de Direito/TJRS

Rafael Calmon Rangel

Juiz de Direito/TJES

 

Não há muito tempo, o Conselho Nacional de Justiça brasileiro alterou a Resolução n. 35/2007, para impedir mulheres grávidas de celebrarem escrituras de separação e divórcio consensuais. Até então, o impedimento dizia respeito apenas aos pais de filhos comuns incapazes (arts. 33, “d” e 34).

A notícia repercutiu fortemente perante a comunidade jurídica, notadamente nos portais eletrônicos de jornalismo jurídico, levando a reações e comentários de toda sorte. Tamanho alarde parece não ter sido considerado, entretanto, por ocasião da entrada em vigor do novo Código de Processo Civil brasileiro, pois seu art. 733 consagra disposição idêntica, no sentido de que “o divórcio consensual, a separação consensual e a extinção consensual de união estável, não havendo nascituro ou filhos incapazes e observados os requisitos legais, poderão ser realizados por escritura pública, da qual constarão as disposições de que trata o art. 731”.

Não se sabe ao certo o motivo pelo qual uma disposição de cunho administrativo reverberou em nível tão mais alto do que aquele proporcionado pela entrada em vigor da norma legal, mas as provocações daí decorrentes foram tão intrigantes que merecem atenção e reflexão detida dos profissionais que atuam na área.

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Este texto, curto e direto, pretende apenas chamar a atenção para algumas aparentes contradições geradas por essa nova normatização, que seguem listadas nos parágrafos seguintes.

Uma das mais curiosas questões, diz respeito à necessidade de judicialização desse procedimento. Isto porque não só a própria Resolução n. 35, mas diversas outras medidas de cunho administrativo e legal recentemente implantadas no país, vieram a lume justamente com o objetivo de proporcionar aos interessados um expediente mais barato, mais rápido e mais simples, porém, ainda assim, capaz de lhes assegurar a obtenção de resultados idênticos àqueles que seriam obtidos por meio da adjudicação da solução estatal em processos contenciosos, reduzindo, a um só tempo, os custos e ônus das partes, e o número de processos no Poder Judiciário. Basta ver que a escritura “não depende de homologação judicial e constitui título hábil para qualquer ato de registro, bem como para levantamento de importância depositada em instituições financeiras”, como deixa claro o art. 733, par. único do CPC.

Porém, quando se para pra pensar que os dados estatísticos apurados pelo CNJ indicam uma taxa de congestionamento assustadoramente grande e uma verdadeira avalanche de processos em trâmite no país, talvez a elaboração de normas que imponham sempre o ingresso no Poder Judiciário como única forma de resolução do conflito não seja digna de aplausos, sobretudo pelo fato de que os direitos que ela almeja proteger podem nem vir a ser atingidos pela ruptura do laço jurídico que une o casal e pela circunstância de o sistema processual já fornecer uma série de mecanismos voltados à asseguração desses mesmos direitos.

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Ainda que assim não fosse – mas, de fato é -, Corregedorias de Justiça de diversos estados da federação passaram a editar atos possibilitando que mesmo pais de filhos incapazes possam se divorciar, se separar e dissolver consensualmente suas respectivas uniões estáveis, desde que as questões referentes a estes assuntos estejam previamente resolvidas na esfera judicial. No Espírito Santo, por exemplo, o art. 716 do Código de Normas foi alterado no ano de 2014 justamente para que isso se tornasse possível, passando a possuir a seguinte redação:

Art. 716. Havendo filhos comuns do casal, menores ou incapazes, será permitida a lavratura da escritura de separação, divórcio ou a conversão da separação em divórcio consensuais, desde que devidamente comprovada a prévia resolução judicial de todas as questões referentes a guarda, visitação e alimentos dos mesmos, o que deverá ficar consignado no corpo da escritura.

Parágrafo único: Em havendo dúvida a respeito do cabimento da escritura de separação ou divórcio consensuais, diante da existência de filhos menores ou incapazes, o Tabelião de Notas deverá suscitá-la diretamente ao Juízo competente em matéria de registros públicos”. (sem grifos no original)

 

Semelhante disposição pode ser encontrada nos Códigos de Normas dos Estados do Rio Grande do Sul (art. 619-C, §6º), Rio de Janeiro (art. 310, §1º) e São Paulo (art. 86 e 86.1), apenas para nominar alguns. Mas ainda não se tem notícia de que posturas semelhantes estejam sendo adotadas em relação a separações, divórcios e rupturas de uniões estáveis de pais de nascituros.

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Outra questão curiosa envolve a possível necessidade de intervenção do Ministério Público nesses processos.

É claro que o nascituro, embora não possua personalidade, tem uma série de direitos resguardados desde sua concepção, a exemplo do de ser reconhecido (CC, art. 1.609, par. único), do de receber curador (CC, art. 1.779) e do de ser adotado (L. 8069/90, art. 13, §1º), apenas para citar alguns. Não há previsão legal expressa, porém, de que o Ministério Público atue em processos que o envolvam. A ganhar corpo o entendimento de que a presença do nascituro impõe a obrigatoriedade de judicialização do procedimento, certamente se exigirá a participação do Ministério Público, constatação esta que ainda pode levar a outra: se essa intervenção se fará necessária nos processos consensuais, quando os ânimos das partes supostamente se encontram mais calmos, com muito mais razão deve ocorrer nos processos litigiosos de separação, divórcio e dissolução de uniões estáveis, onde as divergências entre o casal se potencializam em grau compatível com o que seu estado emocional se sensibiliza.

Mais uma observação. A seguir o que impõe o ordenamento jurídico, a participação desse órgão possivelmente será obrigatória apenas nas demandas voltadas ao desfazimento dos casamentos e uniões estáveis que contenham mulheres em estado gravídico. Todavia, a mesma intervenção não vem sendo exigida nos processos de constituição dessas entidades familiares, tampouco no momento da elaboração de pacto antenupcial, mesmo sendo ele o instrumento adequado para a deliberação de um punhado de obrigações respeitantes ao patrimônio do casal[1]. Basta ver que em escritura de restabelecimento da sociedade conjugal, o art. 49 não faz a mesma exigência.

Por qual motivo a intervenção deveria ocorrer apenas no momento da dissolução e não no da constituição desses arranjos familiares? Será que haveria mesmo necessidade dessa ingerência do Estado nas famílias? Será que o fim de um casamento é sempre prejudicial ao incapaz ou ao nascituro? Será que o restabelecimento do casamento também não poderia lhe ser desfavorável?

E o que dizer das demais demandas de índole patrimonial, em que existam interesses possíveis de repercutir sobre a esfera do nascituro? Haverá necessidade de intervenção do Ministério Público também? A resposta parece ser positiva, mas, devido ao fato de gerar mais um ato (ou mais alguns) atos processuais, possivelmente elastecendo o curso de um procedimento que deve primar pela simplicidade e celeridade, parece não ter sido feliz a inovação legislativa.

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Outra questão digna de reflexão detida surgiu por ocasião de um debate virtual travado entre um dos autores deste texto e a advogada Roberta Quaranta, membra do IBDFAM/CE, envolvendo a prova do estado gravídico. Isto porque, de acordo com o art. 34 da Resolução n. 35/2007 do CNJ “as partes devem declarar ao tabelião, no ato da lavratura da escritura, que não têm filhos comuns ou, havendo, que são absolutamente capazes, indicando seus nomes e as datas de nascimento”. Porém, ao menos em aparência, não existe necessidade de que seja apresentado algum documento comprovando a gestação, o que leva à conclusão de que cabe às próprias partes declararem tal fato.

É certo que determinados estágios da gravidez podem ser constatados a olho nu e a presunção decorrente do art. 1.597, I e II do Código Civil talvez seja suficiente para gerar a convicção de que o nascituro seria comum. Acontece que a prova cabal a esse respeito somente poderia ser feita por intermédio do custoso exame da perícia de paternidade pré-natal e, a bem da verdade, pode nem ser do interesse do casal fazer tal afirmação ou prova, pois o próprio nascituro pode não ter sido originado daquele relacionamento, o que além de lhe retirar a característica de “filho comum”, geraria situações delicadíssimas, nem um pouco recomendáveis no atual estágio da civilização.

Pode ser, ainda, que por motivos diversos tal fato não precise vir à tona, como receio de demissão do emprego, reprovação dos pais, da sociedade ou a própria intimidade do casal, enfim, fatores variados que possivelmente estimularão a fraude no dia a dia, notadamente quando constatado pelo par que a única saída viável será recorrer ao Poder Judiciário para tanto.

Portanto, acredita-se que a intervenção do Estado tenha extrapolado um pouco o mínimo exigido pela ordem constitucional vigente (CR/88, art. 226, §§7º e 8º) e que, também por este motivo, a inovação não mereça aplausos.

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Há, ainda, uma aparente contradição. A leitura do art. 733 do CPC indica a ideia do legislador em proteger os interesses futuros do nascituro, judicializando procedimento que alcançaria a mesma efetividade caso feito, de forma muito mais rápida e com a mesma eficiência, por meio de escritura pública, lembrando sempre que todas as disposições de real interesse do filho ainda não nascido podem ser requeridas em juízo ou alvo de acordo a ser judicialmente homologado, a qualquer tempo, a exemplo do que acontece com os alimentos. Estes, aliás, poderiam ser guarnecidos pela ação de alimentos gravídicos, como bem lembrado pela advogada Roberta Vasquez, também do IBDFAM/CE, por ocasião de outro debate virtual mantido com um dos autores deste texto.

Porém, apesar de o legislador ter demonstrado um cuidado processual extra na proteção dos interesses desse ser em gestação, protegendo-o, ao que parece, dos próprios genitores, mesma cautela não teve ao tratar da questão da partilha post mortem, que, à similaridade do divórcio/separação consensual, igualmente pode ser feito via cartorária, sempre que inexistirem interesses de incapazes.

Tratando-se de procedimento análogo, e com efeitos muito mais difíceis de serem revertidos, caso não observada a norma que determina a reserva de bens para eventual nascituro (art. 650 do NCPC), lógico seria que também para a partilha amigável, lavrada em instrumento público  (art. 657 do NCPC e art. 2015 do Código Civil), se observasse a restrição quanto à presença de meeira gestante. Mas, a Lei não foi alterada neste ponto e nenhuma restrição foi feita, seguindo plena a possibilidade de partilha amigável de bens por escritura mesmo quando há interesse de nascituro.

Claramente, em uma situação de partilha post mortem de bens a possibilidade de conflito de interesses, até mesmo entre a gestante meeira e o nascituro, é latente. O que o nascituro herdar, a meeira, caso única herdeira, não receberá. Nesses casos, inclusive, parece-nos clara a necessidade de nomeação de curador ao nascituro, como determina o art. 671, II, do NCPC (“o juiz nomeará curador especial ao incapaz, se concorrer na partilha com o seu representante, desde que exista conflito de interesses”).

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Assim, temos que a nova lei processual entendeu pela necessidade de resguardar previamente ao nascimento interesses futuros do nascituro que possam ser desprezados pelo genitor quando da celebração da dissolução de sociedade amorosa, mas não entendeu pela mesma proteção quando os interesses do nascituro forem decorrentes de herança a qual, se nascer vivo, terá direito.

Tal distinção só torna ainda mais intrigante essa escolha feita pelo legislador processual, e sem os devidos cuidados em deixar clara a equiparação que se estava indiretamente a fazer entre o ser em gestação e os menores/incapazes.

Por fim, outra interessante questão. Na medida em que apenas casais que contivessem ao menos uma pessoa do sexo feminino poderia gerar o “estado gravídico”, a normatização não estaria criando situação desigualadora entre famílias formadas apenas por homens? Afinal, o texto da norma é bastante claro ao se referir exclusivamente à situação de “gravidez”. Será que pessoas que se encontram em processo de adoção de crianças e adolescentes também deveriam sofrer a incidência da norma?

Basicamente, as reflexões críticas eram essas, mas diversas outras surgirão, por certo.

Supomos que as questões serão devidamente esclarecidas e adaptadas ao decorrer do tempo e da aplicação da nova legislação. De momento, temos que conviver com a possível incoerência sistêmica de se exigir a judicialização procedimental e a aparente contradição entre a forma de tratamento dos institutos que deveriam receber disciplina análoga.

Que se iniciem os debates!

 

[1] Inclusive, o STJ já se pronunciou sobre o tema por ocasião do julgamento do REsp n. 178.245/SC, onde textualmente decidiu ser “desnecessária a intervenção de representante do Ministério Público como curador de nascituro, no ato de celebração de pacto antenupcial em que os nubentes estabelecem o regime de bens de seu futuro casamento.”

 

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A alienação parental ou o divórcio forçado dos filhos em relação aos pais

A alienação parental ou o divórcio forçado dos filhos em relação aos pais

No passado dia 25 de abril, assinalou-se o Dia Internacional de Consciencialização para a Alienação Parental realidade que, em Portugal, não tem regulamentação jurídica especifica.

A alienação parental foi definida por Richard Gardner como «o transtorno pelo qual um progenitor transforma a consciência dos seus filhos, mediante várias estratégias, com o objetivo de impedir, ocultar e destruir os vínculos existentes com o outro progenitor, que surge principalmente no contexto da disputa da guarda e custódia das crianças, através de uma campanha de difamação contra um dos pais sem justificação, resultando da combinação de um sistemático doutrinamento (lavagem ao cérebro) por parte de um dos progenitores, e das próprias contradições da criança, destinadas a denegrir o progenitor objeto dessa campanha.»

Independentemente das críticas associadas a esta definição, a verdade é que, em termos práticos, nas situações de alienação parental há duas vítimas diretas: a criança e o progenitor alienado, fomentando o progenitor alienante o afastamento progressivo da criança em relação àquele. Mais, existem casos em que ambos os progenitores são alienantes falando-se, nestas situações, em alienação parental cruzada.

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Tendo em consideração a gravidade das consequências resultantes da alienação parental, mais importante que punir os comportamentos do progenitor alienante é prevenir a instalação da situação e evitar o seu agravamento.

Prevenir a alienação parental é, por exemplo, consciencializar os pais dos efeitos nefastos e dos danos irreparáveis que a mesma provoca nos filhos.

Também o regime de residências alternadas que estabelece um convívio igualitário do filho com cada um dos progenitores, permite o exercício de uma parentalidade responsável, sendo uma forma eficaz de prevenção da alienação parental.

Prevenir implica estar atento, pois existem comportamentos-tipo, quer do progenitor alienante, quer da criança alienada, que são verdadeiros sinais de alerta.

São exemplos de comportamentos-tipo do progenitor alienante, por referência ao progenitor alienado, condutas como:

- verbalização de comentários depreciativos;

- criticas à competência profissional e à situação financeira;

- desvalorização da qualidade do convívio proporcionado à criança;

- criticas aos programas lúdicos com a criança;

- limitação do contacto da criança com o outro progenitor e com a sua família;

- organização de atividades coincidentes com os tempos de visita, para evitar que estas se concretizem;

- incumprimento do regime de visitas fixado;

- criação, na criança, de falsas memórias;

- falsas acusações de abusos sexuais e/ou maus tratos físicos ou psicológicos;

- rapto parental.

Já quanto à criança alienada, esta adota comportamentos-tipo como:

- participação voluntária na campanha de difamação do progenitor alienado;

- ausência de culpabilidade por denegrir a imagem do progenitor alienado;

- relato de factos, que não foram vivenciados, como correspondendo à realidade;

- animosidade em relação à família alargada do progenitor alienado, bem como aos amigos deste;

- sentimentos de ódio em relação ao progenitor alienado;

- defesa, incondicional e premeditada, do progenitor alienante;

- recusa sistemática em estar com o progenitor alienado sem apresentar justificação para o efeito;

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Um progenitor que vivencie situações como as acima identificadas, deve recorrer ao tribunal para pedir a alteração da regulação das responsabilidades parentais, por forma a que o filho deixe de estar na esfera invasiva do progenitor alienante para passar a residir, em segurança e com preservação da sua saúde mental, seja em regime de residência alternada, seja em regime de residência exclusiva consigo (caso a residência alternada não seja suficiente).

Em casos mais graves, deve o progenitor alienado pedir a inibição do exercício das responsabilidades parentais do progenitor alienante.

Porque a alienação parental é difícil de provar, para que o progenitor alienado possa defender o filho e, se possa também defender a si, deve requerer ao tribunal o deferimento de prova pericial, consubstanciada no acompanhamento à parentalidade, que permitirá demonstrar a sua verdadeira relação com a criança, a dinâmica da mesma, a sua forma de educar e estabelecer regras, o comportamento da criança, a existência de agressividade por parte desta, o porquê da mesma, etc.

O acompanhamento à parentalidade, que não carece da autorização do progenitor alienante consiste, como o próprio nome indica, num acompanhamento feito por um especialista que, ao longo de meses, acompanha o convívio da criança com o progenitor alienado, indo a casa deste quando a criança lá se encontra, presenciando o convívio entre ambos, acompanhando-os em atividades lúdicas, etc.

Este perito deporá em tribunal, nessa qualidade e de forma isenta.

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Em conclusão, os pais são os guardiões dos filhos, seja do ponto de vista moral, seja do ponto de vista legal, sendo seu dever velar, nomeadamente, pela segurança, saúde física e mental dos filhos, não violando o seu direito ao convívio familiar, razão porque um progenitor alienante não tem competências parentais.

Em situações de alienação parental, deve o progenitor alienado e, devem os tribunais, responder eficazmente, na medida em que todas as crianças têm direito a ter uma mãe e um pai com quem possam estar, de quem possam gostar e com quem possam partilhar a sua vida.

 

 

Família, Crise ou Esperança

Família, Crise ou Esperança

  1. Quando se fala de família, a primeira coisa a ter em conta é o como ela se define. A família, no seu modelo tradicional e jurídico, é constituída pela união de um homem e de uma mulher que, no amor recíproco, garantem a estabilidade necessária à geração dos filhos e a educação integral, até à autonomia de cada um deles. O par humano, o casal, com os seus filhos, constitui o fundamento de toda e qualquer família, família essa que, depois, se vai abrindo às gerações futuras.O mesmo Papa, na Exortação Apostólica, Christifideles Laici diz que a família é um espaço social onde a vida nasce, cresce e se desenvolve até à plenitude da felicidade de todos os seus membros. Então, o grande objectivo da família é a felicidade de todos.
  2. Há no entanto, duas definições de família que vale a pena conhecer. O Papa S. João Paulo II, na Exortação Apostólica, Familiaris Consortio, diz que a família é uma comunhão de pessoas ao serviço da vida para o desenvolvimento da humanidade. Esta definição tem três dinamismos: o da comunhão entre o homem e a mulher e os seus filhos, o do serviço à vida que se transmite e se educa, e o próprio desenvolvimento da humanidade que, com a família, cresce continuamente.
  3. No mundo contemporâneo apareceram muitos modelos de família, alguns deles, porém, conduzindo à destruição da própria estrutura familiar. A família patriarcal mantém a tradição inalterável. A família nuclear assegurou os elementos fundamentais da relação homem e mulher com a complementaridade dos seus filhos. Os outros modelos agora em voga comprometem a família, como referência fundamental no projecto de vida. É o caso da família uniparental, às vezes imprescindível, como acontece em situações de viuvez ou de mães solteiras. Sucede o mesmo com a família pluriparental, e famílias muitas vezes reconstruídas, mas incapazes de suportar as normais tensões do encontro de desconhecidos. Já não se fala de famílias entre pessoas do mesmo género, ou de pessoas sem família. Perante este universo negativo torna-se urgente reflectir sobre a família e tentar encontrar a referência modelo que respeita os valores fundamentais e que abre a porta à felicidade. São poucas as famílias referência na sociedade contemporânea.
  4. A família vive num défice de relações, uma crise centrada na negação das suas características fundamentais: a liberdade, a fecundidade e a felicidade. Há muitas famílias em que alguns dos seus membros perderam completamente a sua dignidade, pela perda da liberdade a que têm direito. Daqui, por exemplo, a violência doméstica. A fecundidade é hoje limitadíssima, fica-se muitas vezes num filho único ou no “casalinho”. É sabido que Portugal tem o índice de natalidade mais baixo de toda a Europa. No que se refere à felicidade, a falta de amor é frequente, com o divórcio, a separação, o contrair de outras relações. É esta rotura de unidade que compromete definitivamente a família. O processo educativo dos filhos também deixa muitas vezes a desejar. Os pais têm muito trabalho profissional, as casas estão vazias, os mais velhos foram colocados em residências meramente assistenciais. É esta crise de família, com todos estes contornos, que preocupa o Papa Francisco e o levou a convocar dois sínodos sobre a família. O documento conclusivo dos sínodos, a Exortação Apostólica, Amoris Laetitia ajuda a repensar a família em todos os seus aspectos. É tempo de renovarem-se as estruturas familiares, a ponto de estas se tornarem fonte de alegria no amor, razão de felicidade no sorriso das crianças, coragem e serenidade no tempo do sofrimento e referência em todas as situações da vida.
  5. Notam-se actualmente esforços positivos para levar a família ao lugar que sempre ocupou na vida das pessoas. Não pode esquecer-se a importância de ter uma mãe e um pai a quem se recorre sempre nas horas boas e nas mais difíceis. Reafirma-se a ternura de ver a continuação da vida no olhar de uma criança. É de sublinhar o carinho dos avós com missão específica de apoiar os pais na educação dos filhos. Voltar a dar à família esta missão é indiscutivelmente razão de esperança.É com alegria que se repara que há hoje uma melhor preparação para a constituição das novas famílias. Sobretudo as igrejas, católica e outras igrejas cristãs, fazem um esforço muito grande no acompanhamento dos jovens a partir dos primeiros namoros. Quando os jovens começam a viver um amor comprometido multiplicam-se cursos, sessões de estudo e tempos de oração, para que de uma maravilhosa relação afectiva possa nascer uma família cristã. A preparação para o casamento já se não preocupa exclusivamente com as características da festa. O grande acontecimento, o sacramento do Matrimónio, celebra-se na igreja com enorme exigência. Depois, estão a mudar os critérios da fecundidade. Há muitos casais novos com três e mais filhos o que é revelador da sua responsabilidade social. No tempo das normais crises, psicólogos e sacerdotes, ajudam a vencer as normais dificuldades do amor. Finalmente o processo educativo desenvolve-se de uma maneira responsável em muitos casos até à autonomia completa dos jovens que constroem a sua família. Podemos dizer que é um tempo de esperança. Assim sendo, longe de dizer mal das famílias, cada cidadão tem que contribuir à sua maneira para dar à família o lugar que lhe compete na construção de uma sociedade justa e fraterna.

Maio de 2017

Padre Vitor Feytor Pinto

Pároco da Igreja do Campo Grande

Dia Internacional da Família

Dia Internacional da Família

 

O Dia Internacional da Família proclamado pela Assembleia-Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), celebra-se anualmente a 15 de maio. A comemoração desta data visa sensibilizar e promover a reflexão sobre questões relacionadas com a família, nomeadamente sobre as questões sociais, económicas e demográficas que as afetam.  Este ano o Dia Internacional da Família é dedicado ao tema: "Famílias, educação e bem-estar” – pretende-se destacar a importância do papel da Família e da Educação para a promoção do bem-estar dos seus membros, designadamente das nossas Crianças.

 

Neste Dia da Família é fundamental sublinhar que a grande aposta de futuro de qualquer sociedade que se quer responsável e participativa tem que ser na Família, onde mais do que pela palavra, mas sim pelo exemplo e vivência do dia-a-dia, se vivem os grandes valores da solidariedade, da partilha, do diálogo, da confiança, da compreensão, da responsabilidade, da honestidade e sentido do outro.

 

Na sociedade de hoje a nossa grande prioridade, toda a força do nosso entusiasmo e da nossa generosidade e toda a nossa disponibilidade tem que ser em relação à Família. A grande crise que hoje, se vive, é exatamente em termos dos valores na Família. É absolutamente urgente e deveria constituir a mais alta prioridade em relação à Criança é a definição e a efetivação de uma política global relativa à Criança.

 

Em relação a cada Família e a cada Comunidade é fundamental que se realize todo um trabalho de prevenção e de humanização do espaço em que vivemos.

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Para que a Família desempenhe uma função autenticamente preventiva em relação a problemas graves de âmbito social, precisa de organizar-se num ambiente estável, de grande disponibilidade entre si, de vivência dos grandes valores e de um clima de entreajuda. À agressividade do exterior terá que corresponder - em casa - a palavra amiga, o diálogo, o calor humano e a compreensão perante cada situação concreta. Mais do que todos os discursos moralistas é fundamental, no momento exato, um diálogo em clima de grande abertura. Mas o diálogo não pode acontecer, apenas no momento de crise. Tem que estar sempre presente na dinâmica de cada Família, envolver a criança, desde muito pequena - falar e deixar falar. Conversar sobre qualquer assunto e estar sempre atento às pequenas e grandes descobertas, às grandes e pequenas alegrias e desgostos do seu dia-a-dia.

 

E que cada um de nós não tenha dúvidas quando a pergunta é feita: Mãe, Pai, deste ao teu Filho, todos os dias o apoio, a compreensão e o carinho que ele precisava de ti? Fizeste da felicidade do teu filho a grande prioridade da tua vida, à frente do teu sucesso profissional ou de todos os teus projetos pessoais?

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É preciso sermos honestos connosco próprios e perguntarmo-nos: Que tempo dispensamos aos nossos filhos? Que assuntos debatemos com eles? Que tempo convivemos? Aproveitamos bem o tempo das refeições em comum, dos fins de semana, das férias? Porque não interessa tanto o tempo em que estamos juntos, mas a qualidade desse tempo. Não estar apenas com …, mas estar verdadeiramente em disponibilidade interior, num clima afetuoso de confiança.

 

Temos que necessariamente refletir sobre a sociedade em que vivemos, a Família em que as nossas Crianças e os nossos Jovens crescem, a Escola que lhes oferecemos e os valores que lhes transmitimos.

 

É cada vez mais urgente empenharmo-nos, todos pessoalmente e num trabalho coordenado com as diferentes instituições de cada comunidade – em criar condições sociais, ambientais e de lazer, que ajudem as nossas Crianças e Jovens a crescerem saudavelmente.

 

Mas estarão todos empenhados nisso?

Estamos a viver num tempo do ser ou do ter?

E que valores são transmitidos às nossas Crianças e aos nossos Jovens?

 

Damos como exemplo de vida a dignidade, a honestidade e uma fraternidade autenticamente vivida?

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Tanto a família como as restantes instituições que influenciam a educação das crianças e dos jovens podem atuar de modo disfuncional na medida em que deixando de ser a fonte de transmissão de valores não proporcionem às nossas Crianças instrumentos para viver em sociedade.

 

Qual é então o papel fundamental da família?

 

Encarando a família como elemento fundamental na formação do jovem e na sua progressiva caminhada para uma verdadeira autonomia, é primordial que esta assuma inteiramente as suas responsabilidades e não delegue nenhuma das suas funções em ninguém ou noutras instituições.

 

Mas é preciso sublinhar que também nós no IAC estamos profundamente empenhados nesse aspeto. A criança, mesmo antes de nascer, tem direito a ser amada, tem direito a ser desejada, tem direito à paz que lhe vem do amor. Como escreveu Maria Rosa Colaço, que tanto de belo e puro ofereceu às nossas Crianças, dizia ela:

 

Que os direitos da criança sejam mais que nas paredes e nos cartazes e nos poemas e nos relatórios, inscritos no coração dos Homens e cumpridos por todos os responsáveis.

 

Numa política de infância exige-se uma política integrada de proteção à Criança, ao Jovem e à Família. Porque uma política democrática de infância deve ser obra de toda a comunidade. É no apoio à família, não através de meras declarações de intenções, mas sim na sua autêntica dimensão, que se previnem situações de vulnerabilidade. A sociedade precisa de ser mais tolerante e tem de encontrar novas respostas para a Família e para a Criança. Respostas que reforcem a rede de contactos sociais que apoiem as Famílias. Na verdade, todos somos moral e socialmente responsáveis pelas nossas Crianças. Numa sociedade civil participativa, empenhada, viva e com alma, todos temos as nossas responsabilidades – família, escola, meios de informação e as diferentes instituições e organizações da comunidade, desde a segurança social, saúde, autarquias e as várias associações recreativas e culturais, para que todos juntos, possamos construir a civilização do afeto de que fala Agustina Bessa Luís.

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Com saber técnico e amor continuaremos a implementar a utopia de servir a Criança. E como dizia Matilde Rosa Araújo, no seu belíssimo poema sobre os Direitos da Criança:

… Este nascer e crescer e viver assim 

Chama-se dignidade. 

E em dignidade vamos 

Querer que a criança 

Nasça

Cresça

Viva …

A criança deverá receber

Amor,

O amor sereno de mãe e pai.

Ela vai poder

Rir,

Brincar,

Crescer,

Aprender a ser feliz…

 

Maio de 2017

Manuela Ramalho Eanes

Presidente Honorária

do Instituto de Apoio à Criança

 

 

"Mas as crianças, Senhor, porque lhes Dás tanta dor, porque padecem assim?"

" Mas as crianças, Senhor, porque lhes Dás tanta dor, porque padecem assim? "

Recordei este lindíssimo poema de Augusto Gil quando pensei em escrever algumas palavras sobre um tema que me é muito querido: O COMPORTAMENTO ESCOLAR DAS CRIANÇAS FILHAS DE PAIS SEPARADOS.

Neste caso, a palavra escolar reporta-se ao ambiente da escola e não propriamente do aproveitamento escolar pois, irei falar de todas as idades incluindo das que ainda não frequentam a escola.

Falar de comportamento humano é sempre um perigo pois, como sabemos todos, varia de acordo com ambiente, com a maneira de ser de cada um, ….mas, vou só referir o comportamento das crianças dos quatro meses aos dez anos e cujos pais se separaram. Será que são felizes, mesmo assim? Será que refletem a separação? Ou pura e simplesmente a separação não afetou a sua vida?

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Pertenço a uma geração cujos princípios de vida se guiavam por conseguirmos ter uma Família para toda a vida. O conceito de Família era quase sagrado. Respeito pela Família, aprendia-se na escola (Salazar levou esse conceito ao limite quando " decretou" a trilogia " Deus, Pátria e Família" como guia da nossa vida coletiva). E essa maneira de pensar levava a que se " aguentasse " tudo em nome da Família. O contrato do casamento era fortalecido e sacralizado pelo complementar casamento religioso. Hoje, em contrapartida, esse contrato é posto em causa. As pessoas "juntam-se" e não querem contratos assinados (o que é um paradoxo pois, relativamente ao trabalho, todos desejam ardentemente um contrato efetivo…trabalho mais importante que a Família? Assim parece...) mas o verdadeiro pensamento era "estamos juntos pelos filhos ...". Hoje em dia isso é considerado pré histórico, apesar de a legislação contemplar que "tudo a bem da criança". E será que é isso que está a acontecer?

Há algum tempo aconteceu o seguinte diálogo à porta do Bambi, entre uma senhora que ia fazer trinta anos e o pai:

“Filha, o que queres que te ofereça nos teus anos?”

“Olha papá, o que eu queria tu não me podes dar.”

“Claro, se for uma casa ou carro…”

“Não, não...o que eu queria mesmo é que estivesses a viver com a minha mãe.”

Os pais da senhora separam-se quando ela tinha três anos de idade! Há vinte e sete anos!

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O que vejo no dia do colégio? Como se comportam as crianças cujos pais se separaram?

Aparentemente não se nota nada de diferente no seu comportamento, apesar de os pais, quando se separam terem sempre uma conversa connosco a chamar a atenção para o facto de se estarem a separar e por esse motivo pedirem um pouco mais de atenção com a criança pois, pode ter reações diferentes do que tem sido até esse momento. Isto é, os pais, por um lado afirmam que se separam por vários motivos e muitas vezes invocam que os filhos irão ficar melhor pois acabam-se as discussões. Mas, por outro, sabem que algo irá acontecer, que a vida das crianças se vai alterar. E ninguém é capaz de afirmar se será para melhor ou pior. O que sei é que as crianças quando choram, só chamam pelo pai ou pela mãe, por mais ninguém. E muito menos por coisas (isto porque há muitos pais que se desculpam por não terem mais tempo para os filhos porque têm de trabalhar muitas horas para darem uma vida melhor à família… mas, nenhuma criança chora porque quer ter um carro ou uma casa melhor… chora, porque quer ter a mãe e o pai mais tempo junto de si…). Então e como reagem as crianças à separação dos pais?

Quando são muito pequeninas não se dão conta em termos racionais do que se está a passar. Mas em termos afetivos já assim não acontece. Quando a separação acontece e um dos pais (normalmente o pai) começa a aparecer menos vezes, a criança, quando já fala, lá vai referenciando a figura paterna naqueles que aparecem. Ou em outros pais (quantas vezes levantam os bracinhos e dizem " pá, pá..." aos pais dos amigos…). Faz doer a alma…mas é a realidade… à medida que vão sendo mais velhinhos as reações, naturalmente são diferentes. Se o assunto é bem conduzido pelos pais, ou seja, se os pais reconhecem que é imperioso, que neste doloroso processo de separação dos filhos, o mais importante é que eles sofram o mínimo possível (o nada é falso) no ambiente do colégio isso reflete-se na sua conduta. No entanto, uma atitude é transversal a todas as crianças nesta situação: tornam-se mais introvertidas (parece que têm, eles, vergonha do que se está a passar em casa…) mais desatentas e até mais irritadiças. O comportamento com os colegas também se altera. Mais exigentes, dão a ideia que têm o mundo contra eles... no fundo, não percebem porque é que têm amigos cujos pais (mãe e pai) os vêm buscar à escola e eles só têm um deles que os vem buscar, levar para casa onde vão conviver com essa nova realidade que é, à mesa só contarem o que se passou na escola a um dos pais. Falta o outro. Essa é a palavra que pode definir a nova situação: FALTA!! E o que não está presente todos os dias, cada vez ficará mais ausente até que um dia, à pergunta "como correu a escola hoje?" a resposta começa a ser sempre a mesma " Bem". Aí a Falta já não tem remédio.

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Claro que o colégio deve ser informado do que se está a passar em casa, de modo a poder contribuir para amenizar essa nova situação. Enquanto educadores temos obrigação de apoiar as crianças (e os pais) a ultrapassar com os menores danos possíveis esta tormenta que se abateu sobre os seus corações e que eles nunca entenderão. Aos pais, só um apelo: quando pensaram gerar um filho, foi de certeza um ato de Amor. Não o transformem num ato de ódio. O sentimento entre os pais transmite-se à criança. Se amam os filhos, então não lhes falem de ódio ou com ódio seja de quem for. Digam-lhe palavras bonitas. Eles gostam e agradecem. E não se esqueçam que, para cada pai em particular, na sua relação com os filhos, a outra parte (mãe ou pai) é a melhor do mundo. Só assim podem e devem contribuir para que os vossos filhos sejam Felizes (dentro do possível).

Maio de 2017

Dorbalino Martins

Diretor do Externato O Bambi

 

A Família

A Família

O mês de Maio é um mês cheio de significado para a Associação Portuguesa de Famílias Numerosas e para todas as famílias! Logo no início, o dia da mãe; hoje, dia 15, celebramos o dia internacional da Família e no dia 31 celebraremos o Dia dos Irmãos.

 

Por isso, não há melhor altura para pensar naquilo em que o Direito verdadeiramente pode apoiar a família, no que pode interceder por ela.

 

Infelizmente, são muito poucos os incentivos à natalidade em Portugal. Pelo contrário, as famílias são penalizadas à medida que nascem os seus filhos. E quantos mais são os filhos, mais penalizada é a família.

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A actual situação demográfica do país é assustadora: desde 1982 que não há renovação de gerações em Portugal. Recentemente, no final de Abril, o Instituto Nacional de Estatística divulgou que “em 2016, Portugal manteve um saldo natural negativo situado em -23 409” (nascimentos menos óbitos). A este propósito é também interessante ter em conta que o último Inquérito à Fecundidade, realizado pelo Instituto Nacional de Estatística, em 2013, em plena crise, indicou que as famílias portuguesas:

- tinham em média 1,03 filhos;

- consideravam que em toda a sua vida iriam ter em média 1,78 filhos;

- desejavam ter 2,31 filhos; e

- consideravam ainda que o ideal seria ter, em média, 2,38 filhos por família.

 

Estes números pedem que se faça algo! E o Direito pode ser um importante aliado da família. Mas as leis, como as políticas de apoio à família, têm que ser abrangentes, consistentes e duradouras.

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Numa recente alteração ao Código do Trabalho (Setembro de 2015), foram adoptadas medidas que podem proporcionar melhores condições às famílias que desejam ter filhos ou mais filhos. Entre outras medidas destacamos:

- o facto de a licença, entre os 120 e os 150 dias, poder ser gozada em simultâneo pela mãe e pelo pai;

- o aumento da licença de paternidade após o nascimento do filho, para 15 dias úteis;

- a opção que o pai ou a mãe - trabalhadores com filho com idade até 3 anos -, podem exercer de prestar trabalho em regime de teletrabalho, quando tal seja compatível com a actividade desempenhada, sem que o empregador se possa opor.

 

Mas esta última medida, por exemplo, muito interessante para a família, é de difícil implementação. Apesar de uma aparente obrigatoriedade, a letra da lei indica que foi deixado totalmente nas mãos da entidade empregadora (é o que sugere a palavra “compatível”) a aceitação de um pedido de prestação de trabalho em regime de teletrabalho. Poderiam ter sido enunciadas, a título exemplificativo, actividades compatíveis com a prestação de trabalho em regime de teletrabalho.

 

Ou seja, não basta intervir no plano meramente programático, através da consagração de princípios gerais. É preciso ser mais abrangente e estabelecer com rigor e precisão os termos em que as famílias poder gozar dos direitos reconhecidos, sem margem para interpretações divergentes ou pressões das entidades envolvidas (Estado, empregadores, etc.) E é imprescindível conceder às empresas os meios necessários para que estas e outras medidas sejam efectivamente utilizáveis e utilizadas.

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Creio que um dos grandes problemas para as famílias hoje em dia é a necessidade de conciliação entre trabalho e família. As soluções em termos de flexibilidade ou redução de horários, nomeadamente, trabalho a tempo parcial, apesar de reguladas, são muito escassas. É preciso apostar na família e conceder-lhe os instrumentos necessários para que possa crescer como deseja.

 

É esta a mensagem que a Associação Portuguesa de Famílias Numerosas quer transmitir: a promoção da natalidade tem que ser um factor determinante na feitura das leis e tem que ser concretizada com a clareza e a prioridade que a actual situação impõe.

Maio de 2017

Rita Mendes Correia

Presidente da Associação Portuguesa de Famílias Numerosas

O fim do mito do filho “mochilinha”: primeiras reflexões sobre a Lei 13.058/2014 no direito brasileiro e sua aplicação como meio de prevenção à alienação parental

O fim do mito do filho “mochilinha”: primeiras reflexões sobre a Lei 13.058/2014 no direito brasileiro e sua aplicação como meio de prevenção à alienação parental

 

Conrado Paulino da Rosa[1]

 

Sumário: 1. Introdução; 2. Da guarda compartilhada no direito brasileiro e as alterações apresentadas pela Lei 13.058/2014; 3. Da guarda compartilhada como ferramenta eficaz de prevenção à prática da alienação parental; 4. Considerações finais; 5. Bibliografia.

 

 

  1. Introdução

Toda a vez em que, ao longo de nossa vida, realizamos a entrega de algo que é valioso para alguém, a utilização da expressão “guarde bem isso” é inevitável. Assim, podemos verificar que, desde a rotina diuturna até as mais complexas situações jurídicas, o que se encontra inserido no termo “guarda” é a necessidade de cuidado, atenção em relação a algo que necessita de especial atenção.

No âmbito do direito de família o sentido da terminologia e, acima de tudo, a sua finalidade, expressa a complexa rede de proteção de necessária aos cuidados das crianças e adolescentes. Os filhos, em razão de sua fase de desenvolvimento, necessitam de segurança e estabilidade para que, na vida adulta, possam repetir bons modelos parentais nos cuidados com sua prole.

Em 22 de dezembro de 2014, por meio da Lei 13.058, o Código Civil Brasileiro foi alterado nos artigos 1.583 e 1.583 para trazer novas diretrizes para a aplicação da guarda compartilhada. Nessa toada, o presente trabalho tem o escopo de apresentar as inovações da nova legislação e, principalmente, debater de que forma a sua aplicação pode ser um importante instrumento de prevenção a prática da alienação parental.

 

  1. Da guarda compartilhada no direito brasileiro e as alterações apresentadas pela Lei 13.058/2014

O Código Civil Brasileiro (Lei n. 10.406, de 10 de janeiro de 2002) entrou em vigor em 11 de janeiro de 2003 e, em sua redação original, trazia apenas a modalidade de guarda como a atribuída a apenas um dos pais. Conforme a redação originária do CCB, no artigo 1.584, sem que houvesse entre as partes acordo, quando da dissolução da união, quanto à guarda dos filhos, será ela seria atribuída a “quem revelar melhores condições para exercê-la”.

Todavia, em 2008, a Lei 11.698 alterou a redação dos dispositivos 1.583 e 1.584 do CCB para, de forma expressa, apresentar a possibilidade da guarda compartilhada na legislação brasileira[2].

A partir de então o ordenamento jurídico passou a trabalhar com duas possibilidades de guarda após a dissolução de um relacionamento: de forma unilateral ou compartilhada. A primeira, de acordo com o artigo 1.583 § 1º CCB, é atribuída a um só dos genitores ou a alguém que o substitua, possuindo o guardião não apenas a custódia física do filho, mas também, o poder exclusivo de decisão quanto às questões da vida da prole. Por outro lado, guarda compartilhada trata da responsabilização conjunta e o exercício de direitos e deveres do pai e da mãe que não vivam sob o mesmo teto, concernentes ao poder familiar dos filhos comuns.

Assim, a guarda unilateral deveria ser atribuída ao genitor que revelasse melhores condições para exercê-la e, objetivamente, na antiga redação do § 2º do 1.583 do Código Civil, a partir da Lei 11.698/2008, mais aptidão para propiciar aos filhos os seguintes fatores: (I) afeto nas relações com o genitor e com o grupo familiar; (II) saúde e segurança e, por último, (III) educação.

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De outra banda, a Lei 11.698, ao estabelecer a possibilidade da guarda compartilhada em nosso ordenamento jurídico trouxe a seguinte redação ao artigo 1.584 § 2º do Código Civil: quando “não houver acordo entre a mãe e o pai quanto à guarda do filho, será aplicada, sempre que possível, a guarda compartilhada”.

Todavia, o “sempre que possível” acabou sendo equivocadamente interpretado que o compartilhamento somente seria possível com acordo entre os genitores.[3] Ora, filhos de pais que mantém o diálogo e se entendem bem nem precisam de regras e princípios sobre guarda compartilhada, pois, naturalmente, compartilham o cotidiano dos filhos. A lei jurídica é exatamente para quem não consegue estabelecer um diálogo, ou seja, para aqueles que não se entendem sobre a guarda dos próprios filhos[4].

E, com isso, dúvida, destarte, inexistia quanto à possibilidade de compartilhamento da guarda ainda que se trate de uma demanda litigiosa (divórcio litigioso, dissolução de união estável litigiosa, guarda litigiosa de filhos etc). Isso porque, conforme Cristiano Chaves de Farias, em análise mais abrangente, infere que o palco mais iluminado para o exercício conjunto da guarda é, exatamente, o litígio, quando (e o cotidiano nas varas de famílias revela tal conclusão como inexorável) o genitor que detém a guarda utiliza o filho como um verdadeiro instrumento de chantagem, dificultando, de diferentes modos, o contato entre pai-não guardião e o filho[5].

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Justamente para evitar esse quadro, em 22 de dezembro de 2014, foi sancionada a Lei 13.058/2014[6]. Entre outras alterações, a nova legislação alterou a redação do artigo 1.584 § 2º do Código Civil Brasileiro, passando a estabelecer que: “mesmo quando não houver acordo entre a mãe e o pai quanto à guarda do filho, encontrando-se ambos os genitores aptos a exercer o poder familiar, será instituída a guarda compartilhada”.

A partir de agora o compartilhamento da guarda passa, de uma vez por todas, a ser regra geral nos litígios familiares. Trata-se de ótima medida para que a aplicação da guarda compartilhada deixe de ser uma utopia e, agora sim, seja uma efetiva realidade nos Tribunais brasileiros.

Por óbvio que bom senso e cooperação seriam sentimentos necessários em todas as etapas de criação dos filhos e, caso eles não estejam presentes, o Judiciário – uma vez chamado para interferir na ótica privada – deve resguardar esses anseios em prol daqueles que são titulares de proteção integral.

Outro ponto positivo da normativa é o esclarecimento do verdadeiro sentido do compartilhamento da guarda. Isso porque, desde a Lei 11.698 em 2008, o instituto foi reiteradamente confundido com a guarda alternada, que sequer tem possibilidade de ser fixada em nosso ordenamento jurídico. De forma equivocada, falava-se em divisão estanque do tempo em cada uma das casas, como se o filho passasse a ter sua mochila como o único lugar seguro na sua vida.

Imperioso ressaltar, nessa esteira, de que guarda e convivência são institutos distintos. Embora comumente confundidos, o primeiro diz respeito ao modo de gestão dos interesses da prole – que pode ser de forma conjunta ou unilateral – e o segundo, anteriormente tratado como direito de visitas, versa sobre o período de convivência que cada genitor ficará com os filhos, sendo necessária a sua fixação em qualquer modalidade de guarda.

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Com a edição da Lei 13.058/2014, em 22 de dezembro de 2014, em nada se alteram as possibilidades de determinação de guarda: ou ela será unilateral – ficando um dos pais com o poder de decisão a respeito das diretrizes da vida do filho – ou compartilhada quando, de forma conjunta, ambos os genitores tomarão as decisões quanto a escolaridade, saúde, lazer e demais deliberações que cabem aos pais e que são inerentes à vida de uma criança.[7]

Compartilhar, como o nome já sugere, significa partilhar com o outro, dividindo as responsabilidades pelo sustento, educação e convívio com os filhos de forma direta e conjunta[8].

Agora, a fixação de qual das residências a prole irá residir, ou seja, com qual dos genitores ficará a custódia física, é consequência direta do estabelecimento do compartilhamento da guarda, podendo acontecer, inclusive, segundo a nova redação do Código Civil, que os pais residam em Cidades diferentes. Nesse caso, a “cidade considerada base de moradia dos filhos será aquela que melhor atender aos interesses dos filhos” (1.583 § 3° CC).

São evidentes as vantagens oriundas da guarda conjunta, já que prioriza o melhor interesse dos filhos, o poder familiar e a diferenciação das funções dos guardiões, não ficando um dos pais como mero coadjuvante na criação do filho, ao contribuir apenas com os alimentos e tendo como “recompensa” o direito à visitação[9].

Além disso, de acordo com o artigo 1.583 § 5º CCB, o tempo de convivência dos filhos deverá ser “dividido de forma equilibrada entre a mãe e o pai”. Dessa forma, evita-se que um dos genitores seja mero “visitante”, restrito a programas de fast food, cinemas e guloseimas, para uma lógica de corresponsabilidade e contato diuturno. Tal previsão atenta ao princípio constitucional da convivência familiar, previsto no artigo 227 da Carta Magna brasileira.

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Para estabelecer as atribuições do pai e da mãe e os períodos de convivência sob guarda compartilhada, o juiz, de ofício ou a requerimento do Ministério Público, poderá se basear em orientação técnico-profissional ou de equipe interdisciplinar (1.584 § 3º CC). A atuação conjunta do Direito com o Serviço Social e a Psicologia, via perícia ou mediação de conflitos, faz com que ganhem todos os envolvidos e, principalmente, as crianças e adolescentes, uma vez que se reduzem, significativamente, as chances de esses filhos tornarem-se instrumentos de disputa em uma tentativa frustrada de compensar os traumas sentimentais com disputas judiciais.

A guarda compartilhada procura fazer com que os pais, apesar da sua separação pessoal e da sua moradia em lares diferentes, continuem sendo responsáveis pela formação, criação, educação e manutenção de seus filhos, seguindo responsáveis pela integral formação da prole, ainda que separados, obrigando-se a realizarem, da melhor maneira possível, suas funções parentais. O exercício dual da custódia considera a possibilidade de os pais seguirem exercendo da mesma maneira o poder familiar, tal como ocorria enquanto coabitavam, correpartindo a responsabilidade que têm no exercício das suas funções parentais e na tomada das decisões relativas aos filhos[10]

Conforme o jurista mineiro Dimas Messias de Carvalho[11], seu estabelecimento: a) Mantém e estreita os vínculos com ambos os pais; b) Evita a síndrome da alienação parental; c) Auxilia na criação e educação do filho; d) Mantém os vínculos com a família; e) Mantém as referências paterna e materna.

Nesse sentido, comungamos do pensamento de que a gestão conjunta dos interesses da prole, além de oferecer estabilidade e segurança aos filhos uma vez que calcada na corresponsabilidade pode, ao fim e ao cabo, ser um ótimo meio de acabar o exercício abusivo e egoísta da guarda por parte de um dos genitores.

 

  1. Da guarda compartilhada como ferramenta eficaz de prevenção à prática da alienação parental

Desde a brincadeira na primeira infância, invariavelmente, o ser humano, quando contrariado, costuma realizar práticas egoístas. Os meninos, quando perdem o jogo de futebol, voltam para a casa com a bola. As meninas, no mesmo sentido, não emprestam mais as bonecas para suas amigas quando, de alguma forma, seus anseios deixarem de ser atendidos.

A prática da alienação parental não deixa de ser, na idade adulta, a representação do mesmo comportamento. Isso porque, no desenvolvimento de nossa vida afetiva, costumamos inserir nossas expectativas, sonhos e projeções tal qual dos contos de fadas. Agora, quando eles não “viveram felizes para sempre...” aquele que se considera vitimado, muitas vezes, transforma o ser amado em seu maior algoz e irá privá-lo – assim como um dia já fez com seus pares na infância – daquilo que mais lhe é precioso: os filhos.

Dessa forma, entendemos a alienação parental como uma espécie de patologização do amor. O desamor não necessariamente precisa ser transformado em doença, mas sim, a sua má gestão tem um grande potencial para sua disseminação.

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A temática da alienação parental tem previsão legislativa desde 2010 por meio da Lei 12.318. Segundo acepção da normativa em comento considera-se ato de alienação parental a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este:

A legislação, no parágrafo único do artigo 2° da Lei 12.318/2010, apresenta ainda as formas exemplificativas de alienação parental, “além dos atos assim declarados pelo juiz ou constatados por perícia, praticados diretamente ou com auxílio de terceiros”: (I) realizar campanha de desqualificação da conduta do genitor no exercício da paternidade ou maternidade; (II) dificultar o exercício da autoridade parental; (III) dificultar contato de criança ou adolescente com genitor; (IV) dificultar o exercício do direito regulamentado de convivência familiar; (V) omitir deliberadamente a genitor informações pessoais relevantes sobre a criança ou adolescente, inclusive escolares, médicas e alterações de endereço; (VI) apresentar falsa denúncia contra genitor, contra familiares deste ou contra avós, para obstar ou dificultar a convivência deles com a criança ou adolescente; (VII) mudar o domicílio para local distante, sem justificativa, visando a dificultar a convivência da criança ou adolescente com o outro genitor, com familiares deste ou com avós.

Ainda, no artigo 3°, a normativa assevera que a prática de ato de alienação parental fere direito fundamental da criança ou do adolescente de convivência familiar saudável, “prejudica a realização de afeto nas relações com genitor e com o grupo familiar, constitui abuso moral contra a criança ou o adolescente e descumprimento dos deveres inerentes à autoridade parental ou decorrentes de tutela ou guarda”.

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Na verdade, o que se vê costumeiramente nos processos em que se estabelece a prática da alienação parental é de que “os filhos são cruelmente penalizados pela imaturidade dos pais quando estes não sabem separar a morte conjugal da vida parental, atrelando o modo de viver dos filhos ao tipo de relação que eles, pais, conseguirão estabelecer entre si, pós-ruptura” .

O genitor alienador, entre outros fatores, age com extrema facilidade e sutileza párea obstaculizar o direito convivencial do progenitor não guardião, encontrando rotas fáceis de acesso para atrair o filho para outras programações mais sedutoras do que a “tediosa” visita de um genitor que vem sendo, por igual, paulatina e religiosamente depreciado, e, na sua esteira, também os avós da criança, provenientes da linha parental do genitor não guardião[12].

Assim, entendemos que a edição da Lei 13.058/2014 chegou em boa hora ao estabelecer o compartilhamento da guarda enquanto regra geral. Isso porque a guarda jurídica compartilhada define os dois genitores, do ponto de vista legal, como iguais detentores da autoridade parental para tomar todas as decisões que afetem os filhos. [13] Sua proposta é manter os laços de afetividade, buscando abrandar os feitos que o fim da sociedade conjugal pode acarretar aos filhos, ao mesmo tempo em que tenta manter de forma igualitária a função parental, consagrando o direito da criança e dos pais[14].

A utilização da guarda compartilhada como forma de superação das limitações da guarda unilateral representa, além de tantos outros benefícios, um meio de evitar a síndrome da alienação parental[15]. Isso porque, em seu comportamento ardiloso e incessante, o alienador busca ser o único cuidador da criança, fazendo com que o contato com o outro genitor seja repudiado pelo rebento sem motivo concreto.[16]

 

  1. Considerações finais

O que antes era regra, em boa hora, passa a ter caráter excepcional, vez que se encontrando ambos os genitores aptos a exercer o poder familiar, será aplicada a guarda compartilhada, salvo se um dos genitores declarar ao magistrado que não deseja exercê-la (artigo 1.584 § 2º CCB).

Com o final do mito dos filhos “mochilinha”, do novo papel de ambos os genitores, de visitantes a conviventes, e, acima de tudo, de que as Varas de Família expressem aquilo que uma criança, mesmo em sua ingenuidade, sabe melhor do que qualquer adulto: dois representam mais do que um.

 

  1. Referências bibliográficas

CARVALHO, Dimas Messias de. Adoção e guarda. Belo Horizonte: Del Rey, 2010,.

FARIAS, Cristiano Chaves de. Escritos de direito e processo das famílias: novidades polêmicas. Salvador: Jus Podium, 2013.

FREITAS, Douglas Phillips. Guarda compartilhada e as regras da perícia social, psicológica e interdisciplinar: comentários à lei 11.698 de 13 de junho de 2008. Florianópolis: Conceito Editorial, 2008.

GRISARD FILHO, Waldyr. Guarda Compartilhada. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014.

MADALENO, Ana Carolina Carpes; MADALENO, Rolf. Síndrome da alienação parental: importância da detectação aspectos legais e processuais. Rio de Janeiro: Forense, 2013.

MADALENO, Rolf. Novos horizontes no direito de família. Rio de Janeiro: Forense, 2010.

PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Divórcio: teoria e prática. 4.ed. São Paulo: Saraiva, 2013.

ROSA, Conrado Paulino da. “Nova Lei da guarda compartilhada”, Editora Saraiva, São Paulo, 2015.

SILVA, Daniel Alt Silva da. A vigência da Lei n. 12.318/2010: uma providência a garantir o direito fundamental à convivência familiar. In: ROSA, Conrado Paulino da; THOMÉ, Liane Maria Busnello. O papel de cada um nos conflitos familiares e sucessórios. Porto Alegre: IBDFAM-RS, 2014.

SOLDÁ, Angela Maria; OLTRAMARI, Vitor Hugo. Mediação familiar: tentativa de efetivação da guarda compartilhada e do princípio do melhor interesse da criança. Revista brasileira de direito das famílias e sucessões, Porto Alegre,Magister, v. 29, ago./set.2012.

THOMÉ, Liane Maria Busnello. Guarda compartilhada decretada pelo juízo sem o consenso dos pais. Revista do Instituto do Direito Brasileiro, Lisboa, n. 14.

 

[1] Advogado especializado em família e sucessões. Mediador de conflitos. Presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM / Seção RS. Doutorando em Serviço Social – PUCRS.  Mestre em Direito  pela UNISC, com a defesa realizada perante a Università Degli Studi di Napoli  Federico II, na Itália. Professor do Curso de Direito da Fundação Escola Superior do Ministério Público, em Porto Alegre e coordenador da Pós Graduação em Direito de Família e Sucessões na mesma instituição. Autor de obras sobre direito de família e mediação de conflitos. www.conradopaulinoadv.com.br. / contato@conradopaulinoadv.com.br

[2]Art. 1.583.  A guarda será unilateral ou compartilhada.

I – afeto nas relações com o genitor e com o grupo familiar;

II – saúde e segurança;

III – educação.

Art. 1.584.  A guarda, unilateral ou compartilhada, poderá ser:

I – requerida, por consenso, pelo pai e pela mãe, ou por qualquer deles, em ação autônoma de separação, de divórcio, de dissolução de união estável ou em medida cautelar;

II – decretada pelo juiz, em atenção a necessidades específicas do filho, ou em razão da distribuição de tempo necessário ao convívio deste com o pai e com a mãe.

[3] “1. A chamada guarda compartilhada não consiste em transformar o filho em objeto, que fica a disposição de cada genitor por um determinado período, mas uma forma harmônica ajustada pelos genitores, que permita ao filho desfrutar tanto da companhia paterna como da materna, num regime de visitação amplo e flexível, mas sem que o filho perca seus referenciais de moradia. 2. Para que a guarda compartilhada seja possível e proveitosa para o filho, é imprescindível que exista entre os pais uma relação marcada pela harmonia e pelo respeito, onde não existam disputas nem conflitos; mas, quando o litígio é uma constante, a guarda compartilhada é descabida”. (Apelação Cível Nº 70059147280, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves, Julgado em 16/04/2014)

“Guarda compartilhada pressupõe, de um modo geral, consenso entre os pais. É rara, se se pretende êxito assegurado, a modalidade da guarda compartilhada litigiosa, que será sempre uma guarda imposta e exercitada por duas pessoas”. (Tribunal de Justiça de Minas Gerais - Apelação Cível nº 1.0024.09.704551-2/003 7045512-60.2009.8.13.0024 (1) – Relator Des. Wander Marotta - Data de Julgamento: 06/12/2011 - Data da publicação da súmula: 13/01/2012).

[4] PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Divórcio: teoria e prática. 4.ed. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 97.

[5] FARIAS, Cristiano Chaves de. Cabimento e pertinência da fixação de guarda compartilhada nas ações litigiosas. In: FARIAS, Cristiano Chaves de. Escritos de direito e processo das famílias: novidades polêmicas. Salvador: Jus Podium, 2013, p.152.

[6] A legislação alterou os artigos. 1.583, 1.584, 1.585 e 1.634 da Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil Brasileiro), para estabelecer o significado da expressão “guarda compartilhada” e dispor sobre sua aplicação.

[7] Para um aprofundamento da temática sugere-se a leitura de ROSA, Conrado Paulino da. Nova Lei da guarda compartilhada, Editora Saraiva, São Paulo, 2015, 150 páginas.

[8] THOMÉ, Liane Maria Busnello. Guarda compartilhada decretada pelo juízo sem o consenso dos pais. Revista do Instituto do Direito Brasileiro, Lisboa, n. 14, p. 17638.

[9] SOLDÁ, Angela Maria; OLTRAMARI, Vitor Hugo. Mediação familiar: tentativa de efetivação da guarda compartilhada e do princípio do melhor interesse da criança. Revista brasileira de direito das famílias e sucessões, Porto Alegre,Magister, v. 29, ago./set.2012, p.76.

[10] MADALENO, Rolf. Novos horizontes no direito de família. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 212.

[11] CARVALHO, Dimas Messias de. Adoção e guarda. Belo Horizonte: Del Rey, 2010, p. 71.

[12] MADALENO, Ana Carolina Carpes; MADALENO, Rolf. Síndrome da alienação parental: importância da detectação aspectos legais e processuais. Rio de Janeiro: Forense, 2013, p.90.

[13] GRISARD FILHO, Waldyr. Guarda Compartilhada. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014, p. 90-91.

[14] SOLDÁ, Angela Maria; OLTRAMARI, Vitor Hugo. Mediação familiar: tentativa de efetivação da guarda compartilhada e do princípio do melhor interesse da criança. Revista brasileira de direito das famílias e sucessões, Porto Alegre, Magister, v. 29, ago./set.2012, p.78.

[15] FREITAS, Douglas Phillips. Guarda compartilhada e as regras da perícia social, psicológica e interdisciplinar: comentários à lei 11.698 de 13 de junho de 2008. Florianópolis: Conceito Editorial, 2008. p.42.

[16] SILVA, Daniel Alt Silva da. A vigência da Lei n. 12.318/2010: uma providência a garantir o direito fundamental à convivência familiar. In: ROSA, Conrado Paulino da; THOMÉ, Liane Maria Busnello. O papel de cada um nos conflitos familiares e sucessórios. Porto Alegre: IBDFAM-RS, 2014, p. 376.

Pensão de alimentos a ex-cônjuge

Pensão de alimentos a ex-cônjuge:

A Lei n.º 61/2008, de 31 de outubro, veio alterar o regime jurídico do divórcio alterando, também, o regime da obrigação de alimentos entre ex-cônjuges.

A regra geral, em matéria de alimentos entre ex-cônjuges, depois do divórcio ou da separação judicial de pessoas e bens, é a que se encontra enunciada no n.º 1 do artigo 2016.º do Código Civil:

«1 – Cada cônjuge deve prover à sua subsistência, depois do divórcio

Desta regra geral, resulta que a obrigação de alimentos tem um caráter excecional e temporário, na medida em que a mesma tem como finalidade auxiliar o ex-cônjuge carecido de alimentos na satisfação das suas necessidades básicas, dando-lhe um mínimo de condições que lhe permita, nos primeiros tempos após o divórcio, reorganizar a sua vida, sendo esta obrigação devida pelo período de tempo necessário para o alimentando se adaptar à sua nova vida apoiando-se, assim, a transição para a sua independência económica.

Deste modo, o critério para atribuição de alimentos é o da necessidade do ex-cônjuge deles carecido.

Assim sendo, a obrigação de alimentos entre ex-cônjuges não perdurará para sempre, na medida em que o beneficiário dos alimentos tem obrigação de providenciar ao seu sustento, esforçando-se para tal.

O dever de prestação de alimentos, após o divórcio ou após a separação judicial de pessoas e bens assume, pois, um caráter subsidiário e assenta no dever assistencial que perdura para além do casamento, dever este limitado nos termos supra referidos.

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No que respeita à determinação do montante de alimentos, importa ter em conta quanto previsto no artigo 2016.º-A do Código Civil, o qual enuncia várias circunstâncias a que se deve atender para efeitos de fixação da obrigação de alimentos, como sejam o tempo de duração do casamento, a colaboração que o ex-cônjuge carecido de alimentos prestou à economia do casal, o seu estado de saúde, a sua idade, as suas qualificações profissionais e possibilidades de emprego, a sua capacidade económica em vista de rendimentos que possa ter, a reorganização da sua vida familiar, etc.

Refira-se, ainda que, existindo uma obrigação de alimentos a filhos do cônjuge onerado com a obrigação de alimentos, esta prevalece sobre a obrigação de prestação de alimentos a favor do ex-cônjuge.

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Questão diferente é a de, após o divórcio, o cônjuge que mais contribuiu para os encargos da vida familiar, ter direito a exigir do outro uma compensação resultante do facto de ter renunciado, de forma excessiva, à satisfação dos seus próprios interesses em benefício da vida em comum, designadamente, deixando para trás a sua carreira profissional e, daí lhe advindo prejuízos patrimoniais relevantes.

Tal prestação compensatória pode ser pedida ao outro ex-cônjuge no momento da partilha dos bens do casal, salvo se entre ambos vigorar o regime de separação de bens, conforme resulta do artigo 1676.º do Código Civil.

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As alterações do regime jurídico em matéria de alimentos entre ex-cônjuges resultaram da opção legislativa de permitir a livre dissolução do casamento, liberdade esta que tinha também que se refletir no plano patrimonial do divórcio, levando à consagração do atual regime relativo à obrigação de alimentos entre ex-cônjuges a qual, conforme supra explicitado, foi fortemente reduzida a limites mínimos, pautando-se pelo critério da necessidade estrita do cônjuge carecido de alimentos.